Metade das mulheres já teve sintoma de menopausa tratado como exagero

A menopausa é uma fase natural e inevitável na vida de milhões de mulheres no Brasil. No entanto, continua sendo uma etapa negligenciada, envolta em desinformação e tabus. Uma pesquisa* inédita conduzida pelo instituto Ipsos a pedido da Bayer traz um dado alarmante: 44% das mulheres brasileiras que sentem os sintomas da menopausa não recebem nenhum tipo de tratamento.

Uma das principais barreiras para o tratamento da menopausa é a invalidação do que a mulher sente:

Metade de todas as mulheres entrevistadas afirmam que seus sintomas já foram tratados como "exagero" ou "algo normal"

Esse número sobe para 65% entre as mulheres que estão na pré-menopausa (normalmente entre 45 e 55 anos), uma fase de intensa oscilação hormonal

As fontes dessa invalidação são principalmente familiares (41%) e profissionais de saúde (38%). Entre as mulheres de 50 a 60 anos, a invalidação por parte dos médicos chega a impressionantes 55%

De acordo com a ginecologista Ilza Monteiro, presidente da Comissão de Anticoncepção da Febrasgo, essa atitude por parte dos profissionais de saúde muitas vezes se deve a uma combinação de falta de preparo e preconceito, mostrando uma necessidade urgente de atualização na comunidade médica.

Essa naturalização do sofrimento feminino é um problema histórico. A mulher é ensinada a suportar suas dores, não a tratá-las, e isso pode ter consequências graves na saúde física e mental. Ilza Monteiro, ginecologista

Além da "naturalização do sofrimento", existe uma barreira de vergonha que silencia as mulheres. A própria médica compartilha sua experiência pessoal, quebrando o tabu: "Vamos lembrar da vergonha de falar que tava na menopausa, gente. Eu mesma não contei para ninguém... Então existia uma vergonha de falar isso."

Mesmo quando a mulher decide procurar ajuda, o caminho para entender o que está acontecendo com seu corpo é repleto de obstáculos. Os dados mostram que uma em cada três mulheres apenas suspeita que está na menopausa, sem ter um diagnóstico formal.

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Elas sentem os sintomas, mas vivem em um limbo de incerteza. Muitas especialistas descrevem a perimenopausa como uma "montanha-russa" hormonal, uma fase caótica e imprevisível em que os sintomas aparecem de forma desordenada e, muitas vezes, simultânea. Os sinais que mais levam as mulheres a buscar ajuda médica são variados e impactam diretamente o dia a dia:

Ondas de calor (71%)

Irregularidade menstrual (66%)

Suores noturnos (59%)

Alterações de humor (54%)

Dificuldade para dormir (50%)

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Diminuição da libido (44%)

A demora de cravar a perimenopausa adia o acesso ao tratamento mais eficaz disponível, uma solução que, apesar de seus benefícios comprovados, muitas vezes nem sequer é mencionada nas consultas.

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Imagem: Getty Images

Os dados ainda revelam desigualdades no acesso ao tratamento. Entre usuárias do SUS, a principal dificuldade está na demora para conseguir consulta com especialistas, enquanto mulheres com plano de saúde citam burocracia ou falta de cobertura.

A falta de informação sobre a menopausa e suas opções terapêuticas aparece como um obstáculo em comum entre os grupos, atingindo aproximadamente uma em cada cinco mulheres (19%).

A TRH (terapia de reposição hormonal) é reconhecida por entidades globais de saúde e ginecologia como o "tratamento padrão-ouro" para o manejo dos sintomas da menopausa. Sua eficácia é notável e pode mudar radicalmente a experiência dessa fase.

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Apesar de sua comprovada eficácia, existe uma enorme lacuna na comunicação entre médicos e pacientes sobre a TRH. Muitas mulheres nunca chegam a saber que essa é uma opção viável para elas.

53% das mulheres relataram que seu médico nunca apresentou as opções de reposição hormonal

14% afirmaram ter recebido a prescrição de apenas um tipo de tratamento, sem qualquer discussão prévia sobre as alternativas disponíveis

A conversa sobre TRH é frequentemente obscurecida por preocupações significativas, principalmente relacionadas ao ganho de peso (citado por 27% das mulheres), medo de desenvolver câncer (22%) e risco cardiovascular (18%). O medo do câncer de mama, em particular, é um dos maiores obstáculos.

"A ideia de que a TRH aumenta o risco de câncer de mama tem origem em estudos antigos ou mal interpretados, como o Women's Health Initiative (WHI), de 2002. Aquele estudo envolveu uma população mais velha (mulheres com cerca de 70 anos) e utilizou formulações hormonais (como estrogênios conjugados) que são diferentes das opções mais modernas e seguras disponíveis hoje. Para a maioria das mulheres, a TRH é considerada segura e altamente eficaz. O medo, muitas vezes infundado, impede que as pacientes recebam um tratamento que poderia melhorar significativamente sua qualidade de vida", explica a médica Ilza Monteiro.

A desinformação se estende a métodos específicos. O DIU hormonal, por exemplo, pode ser um componente crucial da TRH para a proteção do endométrio, mas essa opção foi apresentada a apenas 2% das pacientes. Além disso, embora o DIU hormonal seja disponibilizado gratuitamente pelos planos de saúde, apenas 30% das mulheres sabem desse direito.

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O maior obstáculo para o bem-estar na menopausa não é falta de opção da medicina, mas sim a falta de informação clara e atualizada.

A menopausa é um processo biológico, mas o sofrimento associado a ela não precisa ser uma sentença. As pesquisas demonstram que a dor de milhões de mulheres é amplificada pela falta de informação, por tabus sociais e por práticas médicas que precisam ser atualizadas.

É um direito da mulher saber sobre todas as opções de tratamento para os sintomas da menopausa. Ilza Monteiro, ginecologista

Desafiar a "normalidade" do sofrimento é o primeiro e mais importante passo para viver esta fase com mais saúde, dignidade e qualidade de vida.

*O questionário da pesquisa foi aplicado a 800 mulheres de 18 a 60 anos de todas as regiões e classes sociais.

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