Boca Rosa: 'Algoritmo faz acreditar que só temos valor quando viralizamos'

"Vivo procurando o próximo passo". Foi assim que Bianca Andrade, a goxxxxtosa para os íntimos, explicou sua motivação para criar a própria marca, a Boca Rosa. Só na pré-venda, em julho de 2024, foram mais de 64 mil produtos vendidos. Hoje, a grife já conta com 108 itens e segue ampliando o portfólio.

Mas o sucesso não veio sem tropeços. Logo no lançamento, a marca enfrentou o primeiro "cancelamento" online: consumidores reclamaram da qualidade da base stick. Diante de uma enxurrada de críticas, Bianca tomou uma decisão pouco comum no mercado: assumir o erro.

"Tudo é filmado, e qualquer problema ganha repercussão enorme. Por isso não existe outro caminho além de admitir, conversar com o público e corrigir", disse em entrevista exclusiva ao Universa.

Enquanto constrói sua carreira na internet, Bianca também lida com outra questão urgente: o vício no celular. Mais madura, criou mecanismos para se afastar das telas, mas segue preocupada com os efeitos da hiperconexão nas novas gerações.

A seguir, ela fala sobre os desafios de empreender, a relação com sua comunidade e como equilibra a vida online e offline.

'Celular tem que ser ferramenta, não prisão', diz Bianca Andrade
'Celular tem que ser ferramenta, não prisão', diz Bianca Andrade Imagem: Divulgação

Universa: Como o mercado da beleza evoluiu desde os seus primeiros vídeos?
Bianca Andrade:
Evoluiu muito, tanto em qualidade quanto em diversidade. Acho que isso aconteceu porque influenciadoras emprestaram seus rostos às marcas. Sempre digo que o público cobra mais de uma pessoa do que de um logo. Isso tornou a consumidora mais exigente. Também vejo um mercado mais humanizado. Nenhuma influenciadora ou empresária que conheço criou uma marca apenas por dinheiro, mas por propósito. A Boca Rosa, por exemplo, tem uma cartela de 50 cores de base stick -- a maior do mundo nesse formato. Foi muito desafiador dar esse passo, mas necessário para atender um país miscigenado como o Brasil.

Quando percebeu que ser "só" a Bianca influenciadora não bastava e que precisava abrir espaço para a empresária?
Sempre fui empresária. Quando mostro minha linha do tempo em palestras, percebo isso.

Minhas redes sempre foram usadas para alavancar negócios, desde os 16 anos. Comecei como maquiadora e usava a internet para captar clientes e gerar renda. Venho de origem simples e, para seguir meu sonho e comprar maquiagem, tinha que dar meus jeitos. Isso é empreendedorismo.

Como nasceu a vontade de ter sua própria marca?
No início, era só um sonho de ver meu nome nas embalagens. Mas, conforme fazia parcerias, percebi que podia ir além. Muitas vezes pensava: "Calma, eu sei fazer isso". Via também que o consumidor havia mudado: pesquisava, se inspirava nas redes. E quem comunica melhor do que uma influenciadora? Em algumas situações, eu sentia que poderia fazer até melhor que as marcas. Foi assim que começou o planejamento para lançar a Boca Rosa.

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Bianca Andrade apresentando a nova máscara de cílios, de volume, de sua marca
Bianca Andrade apresentando a nova máscara de cílios, de volume, de sua marca Imagem: Divulgação

Sentiu a Síndrome da Impostora ao criar a marca?
Sim. Sempre tive a preocupação de me cercar de bons profissionais. Comecei com colaborações, antes de ter marca própria. Aprendi muito nessas parcerias: eu levava o frescor da internet, eles, o conhecimento de mercado.

Nunca estive sozinha. Meu time é incrível e sempre busco os melhores profissionais para trazer meu olhar de maquiadora aos produtos. Tiro dias das férias para pesquisar fora do país e invisto em empresas como a WGSN para ter insights. Tudo parte de mim.

Como foi receber as críticas à base stick? Deu desespero ver feedbacks negativos?
Não me desesperei. Já tinha passado por algo parecido em 2019, com um pó de uma marca parceira. Na época, as empresas não se posicionavam, então causei estranhamento quando falei sobre o assunto nas redes. A curto prazo, parecia ruim. Mas a longo, ganhei confiança do público. Toda marca tem falhas. No nosso caso, tudo é filmado, e qualquer problema viraliza. Por isso, não existe outro caminho além de assumir e corrigir. Se não fizer isso, a marca morre.

Quando há encantamento no atendimento, até problemas se tornam oportunidades. Se acontecer de novo — espero que não — estarei pronta para ouvir minha comunidade. Vim da favela da Maré, cresci com apoio da minha comunidade, não de pessoas influentes. Se não tenho o respeito delas, não tenho nada.

Você também fez uma série sobre saúde mental. Como lida com isso estando há anos na internet?
É algo muito sério, mas tento falar de forma leve para não gerar gatilhos. Saúde mental e redes sociais caminham juntas, seja pelo vício, seja pela enxurrada de comentários. Hoje, só me afetam quando têm razão. Minha mãe sempre diz: "Não tenho medo da marca ser cancelada, tenho medo de terem razão". E é verdade: quando o público tem razão, a gente precisa resolver. Fora isso, aprendi a usar críticas a meu favor.

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Bianca e seu filho Cris, de 4 anos
Bianca e seu filho Cris, de 4 anos Imagem: Reprodução/Instagram

O que mais te preocupa na relação com o celular?
O vício. O algoritmo faz a gente acreditar que a gente só vale quando viraliza. Isso é grave, especialmente para adolescentes. Dou sempre um conselho: não pegue o celular logo ao acordar. Abra a janela, escove os dentes, agradeça. O celular tem que ser ferramenta, não prisão.

Sou influenciadora, mas também mãe e comunicadora social. Prefiro perder dinheiro do que perder impacto positivo. Então imponho regras: deixo o celular longe, crio horários. Não é fácil, mas é necessário.

Como lida com o Cris, que tem pai e mãe famosos?
Digo que "celular é coisa de adulto" e ele entende. Mas meu filho tem 4 anos, ainda não tem noção do que é internet. Não sabemos como será o futuro dessas crianças expostas desde cedo. Não dá para escondê-lo, porque os pais têm vida pública. Então faço uma curadoria: não posto tudo, não exponho intimidades. Se ele pede para gravar e se diverte, posto. Mas é sempre sob medida.

Você chegou até a viralizar com sua planilha de controle de stories do Cris...
Sim. As pessoas acharam exagero, mas é necessário.

Criança engaja, mas não quero usar isso. Depois do nascimento dele, continuei sendo a Bianca profissional, não transformei meu conteúdo apenas em maternidade ou publi de criança. E respeito quem toma a decisão de fazer essa mudança. Cada um escolhe seu caminho. Mas eu só aceito se for algo especial para ele.

Suas amigas pedem conselhos sobre maternidade e exposição?
Muito. Sempre digo: o limite é da mãe. Prefiro errar para menos do que para mais. Tenho muitos conteúdos fofos do Cris que não posto para não expor demais. Conforme ele cresce, o diálogo é fundamental. Converso com ele como adulto desde pequeno. Se um dia disser que não gosta das consequências da exposição, vou respeitar. Criança merece esse cuidado. No fim, acho que ele vai me surpreender. É falante, tem tudo para ser artista e pode até virar o próximo Fred e Boca Rosa.

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