Seu filho faz birra sem parar? Pode ser transtorno opositor desafiador

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Seu filho costuma fazer muita birra? Quando ouve um "não", reage de forma desmedida? Nas brincadeiras com amiguinhos, você sempre ouve reclamações? "Tia, o fulano não quer me emprestar o brinquedo!" ou "Ele não para de chorar!" A convivência com outras crianças, com a família e os professores é marcada por conflitos? Pode ser TOD (Transtorno Opositor Desafiador).
Estudos científicos indicam que entre 1% e 12% das crianças dos cinco aos dez anos tenham TOD. Foi o caso de Maria Fernanda Rossi, hoje com 17 anos. Sua mãe, Andreia, percebia os comportamentos característicos desde que a menina tinha quatro anos. Quando os professores também começaram a notar, as suspeitas tomaram corpo. "A escola nos chamou e falou: 'Ela se comporta de forma diferente das outras crianças. Vocês precisam investigar'. Foi o que fizemos."
Era desgastante lidar com ela, porque ela chorava demais, sentia demais, reagia demais. Tudo era demais. Andreia Rossi, psicopedagoga especializada em Transtorno Opositivo Desafiador
O diagnóstico definitivo veio aos oito anos, e, a partir daí, teve início uma jornada de compreensão e adaptação para que a menina pudesse desenvolver habilidades de regulação hormonal e comportamental. Mas isso não aconteceu de um dia para o outro. Dependeu de muito acolhimento, paciência e das ferramentas certas.

Com um diagnóstico de atraso global do desenvolvimento, foram necessários quase dez anos para que, em uma nova avaliação neuropsicológica, no ano passado, a jovem não tivesse mais nenhuma pontuação para TOD e fosse diagnosticada com uma leve deficiência intelectual e TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade). Aliás, vale lembrar que cerca de 45% das crianças diagnosticadas com TDAH também apresentam TOD, que ainda pode ser associado ao Transtorno do Espectro do Autismo (TEA).
Nem toda birra é TOD
É importante saber que não é porque seu filho faz birra e desafia autoridades que ele necessariamente tenha o transtorno. O TOD é uma condição de ordem emocional e psíquica, que impacta diretamente a regulação da frustração, tornando as crianças extremamente reativas, intolerantes e com dificuldades em lidar com figuras de autoridade e regras.
Muitas vezes, esses desafios ultrapassam o desenvolvimento esperado para a idade, gerando prejuízos sociais, familiares e acadêmicos. A dificuldade de regulação emocional faz com que a criança tenha dificuldades de permanecer em sala de aula ou seguir comandos dos professores, por exemplo.
Somente um especialista pode fazer o diagnóstico definitivo, depois de analisar minuciosamente o comportamento infantil. São levados em conta aspectos como a frequência dos episódios desafiadores, a persistência e os prejuízos que eles trazem.
"Me tornei profissional da neurodiversidade por conta da minha filha"
Na época em que Maria Fernanda foi diagnosticada, Andreia percebia que sua rotina não era como a de outras mães, mesmo as das crianças consideradas mais difíceis.
"Era uma dinâmica diferente em relação às minhas amigas que tinham filhos. Elas deixavam as crianças com a mãe ou o dia inteiro na escola e continuavam trabalhando. A vida seguia. A minha, não. Eu tinha que ir pra lá e pra cá. Era fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, fono e psicólogo", explica.
Sua agenda passou, então, a conflitar com a da filha, e ela resolveu interromper a carreira de comunicadora para se dedicar aos cuidados com a pequena. Sempre curiosa, começou a ler, investigar, buscar mais informações. "Lembro que as terapeutas da Maria Fernanda falavam: 'Nossa, mas você leva jeito pra isso, por que não estuda?'", conta.
"Fiz isso. Estudei psicopedagogia, neurociências aplicadas à educação e fui apresentada à orientação parental. Resolvi abrir um perfil no Instagram, o 'TOD Te Conto Tudo', para compartilhar minha experiência como mãe de uma menina neurodivergente. Em poucos meses, já tinha milhares de seguidores."
O sucesso da página mostrou que muitas famílias precisavam de orientação. "As perguntas chegavam aos montes: 'O que eu faço com tal comportamento?', 'Como lidar com meu filho?'", relata. Agora, Andreia trabalha ajudando pais e mães a compreenderem e lidarem com a neurodivergência.
A importância da intervenção precoce
Embora o TOD não possa ser diagnosticado em bebês, comportamentos intensamente demandantes podem ser sinais. "Crianças com o transtorno requerem mais atenção, mais intervenção do adulto. Elas precisam de um co-regulador, um cuidador que as ajude a atravessar esses momentos de intensa frustração", explica a mãe e especialista.
E é importante ficar atento porque a intervenção precoce é um fator determinante para a redução dos impactos ao longo da vida. Quem recebe suporte desde cedo, mesmo antes de um diagnóstico fechado (enquanto os pais e especialistas investigam), tende a desenvolver mecanismos de regulação emocional, reduzir os comportamentos opositores e sofrer menos com as consequências do transtorno.
Mas, muitas crianças e adultos passam anos sem saber que são neurodivergentes. O pai de Maria Fernanda, marido de Andreia, é um exemplo. "Por conta da nossa filha, ele também foi investigar suas dificuldades e recebeu o diagnóstico de TDAH tardio, já com 47 anos. Hoje ele entende melhor suas dificuldades com impulsividade, procrastinação e autoestima."
O diagnóstico correto, segundo ela, é transformador para quem é neurodivergente. "Mesmo sendo sofrido, existe um alívio em saber que aquilo que você sente tem um motivo e pode ser tratado. Ainda existe muito preconceito e falta de informação, mas histórias como a nossa mostram que é possível transformar vidas com conhecimento e empatia."
Hoje, Maria Fernanda não só entende o que tem, como apoia o trabalho da mãe e deseja cursar psicologia, para ajudar outras pessoas.
Nós tratamos tudo isso aqui em casa sem capacitismo, sem determinismo. A Maria Fernanda tem total potencial de desenvolvimento, mas a gente também sabe das limitações oriundas da neurodivergência dela, e ela olha pra isso com muita naturalidade, porque nós também naturalizamos o diagnóstico do pai. Andreia Rossi, mãe de Maria Fernanda, psicopedagoga e orientadora parental, especializada em Transtorno Opositivo Desafiador
Se você suspeita que seu filho possa ter TOD, procure um profissional especializado para uma avaliação e intervenção precoce.
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