Angélica desabafa e expõe dilemas da 'geração sanduíche': o que significa?

Ler resumo da notícia
A apresentadora Angélica tem enfrentado os desafios de pertencer à chamada "geração sanduíche" —como é definida a faixa etária de adultos ainda jovens que já têm filhos, mas também cuidam dos pais, ou seja, estão "prensados" por duas responsabilidades. Ela definiu a mudança como "pesada", em um desabafo que foi ao ar no podcast Pé No Sofá Pod na semana passada.
Uma nova rotina
Mãe de Joaquim, de 20 anos, Benício, de 17, e Eva, de 12, Angélica agora também é responsável pelos pais, Angelina, de 81, e Francisco, de 86. "A gente cuida muito. Hoje tenho cinco filhos. Tenho os meus três e mais meus pais."
Eles já estão mais velhos, e meu pai mais doente, então eu falo com o médico o dia inteiro, vejo a comida, se vai viajar, o que vai fazer, se pode isso, se pode aquilo, se eles podem. Eu que decido tudo hoje para eles. Até o que eles vão fazer ou não.
Angélica
A apresentadora entende que é privilegiada por poder oferecer este cuidado aos pais, mas ele se prova desafiador também no aspecto emocional. "Agora sou mãe deles também. E é pesado. Não é tudo bem. Isso porque temos condições, porque tem gente pra quem é muito mais pesado."
É pesado emocionalmente. Porque, nessa fase que a gente está, a gente está cuidando do adolescente, da menina com os hormônios à flor da pele, e da finitude dos pais.
Angélica

Angélica não está sozinha
O número de familiares que se dedicam aos cuidados de pessoas com 60 anos ou mais saltou de 3,7 milhões em 2016 para 5,1 milhões em 2019. Os dados são da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2019, realizada pelo IBGE. Em 83% dos casos, estes adultos mais jovens precisam monitorar ou fazer companhia aos idosos dentro de casa.

"Sobra" para as mulheres, frequentemente, este papel. A PNAD de 2022 apontou que elas dedicam cerca de 9,6 horas por semana a mais do que os homens aos afazeres domésticos ou ao cuidado de pessoas. A própria apresentadora fez uma brincadeira —com fundo de verdade, estatisticamente— no podcast: "Não sei se homem dá conta disso não, gente! Você tem que equilibrar todos os pratinhos."
A mudança do papel feminino enquanto responsável pelo mundo da casa não acompanhou o novo papel da mulher definido com a sua participação no mercado de trabalho. Este ainda é um processo em construção, mas que tem impacto na esfera da afetividade, fazendo com que as mulheres ainda se sintam responsáveis pelas esferas afetivas atribuídas à família.
Maria da Conceição Lafayette, professora de sociologia da UFPE, a VivaBem em 2024.
'Geração sanduíche' deve ser cada vez maior
Dois fenômenos podem expandir a chamada "geração sanduíche". O primeiro é o envelhecimento da população, com o número de idosos aumentando graças às vidas mais longas proporcionadas pelos avanços da medicina. A redução do número de filhos por casal também implica em menos gente na família para se dividir no cuidado ao idoso. Mas há outro fator que pesa nesta balança: os jovens têm demorado mais para obter a sua independência financeira —e passado mais tempo dividindo tetos, contas e problemas com os pais.
Por isso, a geração sanduíche já tem cara: a maioria é de mulheres entre 40 a 49 anos. A conclusão é de um estudo realizado pelas pesquisadoras Jordana Cristina de Jesus e Simone Wajnman, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
Fatores socioeconômicos pressionam mais a "geração sanduíche". Quem tem menor poder aquisitivo conta com menos recursos para custear cuidadores profissionais, sanar necessidades de saúde e outros serviços para a família. "A mulher que se encontra nessa situação é, muitas vezes, a provedora do lar, desempenhando assim uma tripla jornada de trabalho ao mesmo tempo, cuidando de duas gerações e da saúde financeira da família", destacou ainda o psiquiatra Rafael Manrique, diretor técnico no Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira, de Campinas, a VivaBem em 2024.
'Ensanduichados' precisam cuidar do emocional
O compromisso com o cuidado do idoso e dos mais jovens gera autocobrança. Além disso, quem está na faixa dos 40 e 50 anos ainda tem demandas da própria carreira e de suas vidas afetivas. Esta situação pode levar à ansiedade e sentimentos de injustiça e raiva pela sobrecarga.
É importante que aquele que cuida também tenha lazer e descanso. Além disso, é preciso espaço e tempo para cuidar da própria saúde física e mental.
Pessoas nessa situação não costumam praticar exercícios físicos e dificilmente conseguem cuidar de sua alimentação de forma saudável, fatores esses que, quando ocorrem de forma crônica, podem levar a transtornos mentais: transtorno depressivo, pânico, burnout, entre outros.
Rafael Manrique, psiquiatra e diretor técnico no Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira, de Campinas
Os "ensanduichados" devem procurar outros membros da família para dividir as responsabilidades, quando possível. É importante também manter-se atento a sintomas como choro fácil, tristeza constante, falta de iniciativa para cuidar de si próprio, entre outros. Neste caso, é necessário procurar uma avaliação médica para checar se é um caso de depressão —que deve ser tratada com urgência.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.