Jornalista conta luta de filhas gêmeas na UTI: 'Cada dia é um milagre'

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A repórter do TNT Sports Monique Danello descobriu um mundo paralelo: o das mães de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) - e desde então vem compartilhando tudo sobre o assunto. Depois de passar 20 dias internada tentando manter a gestação, foram 67 dias lutando com suas filhas gêmeas na UTI Neonatal.
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Algo que aprendi lá é que a UTI neonatal, que assusta tanto a gente, no fim das contas é a segunda chance para os nossos filhos. Diferentemente da UTI adulta, por exemplo, a neonatal é um lugar de expectativa de vida, os bebês recebem ajuda para viver Monique Danello, jornalista e mãe das gêmeas Alice e Helena
Jornalista e assumidamente metódica, Monique tinha planejado cada detalhe de sua gravidez, alinhando sonhos de maternidade e sua carreira. Até que a chegada inesperada de Alice e Helena desafiou todos os planos, e a levou a uma jornada de aprendizado sobre a força do amor, da resiliência e do improvável.
Gestação, três meses de repouso e filhas prematuras

"Eu planejava um filho, mas com seis semanas descobri que eram dois. Fiquei desesperada, pensando no desafio de criar duas crianças, manter a rotina e lidar com uma gestação gemelar que é de risco. E eu ainda não fazia ideia do tamanho dos riscos."
Apesar das preocupações, a gravidez seguiu tranquila: Monique foi devidamente autorizada a manter a rotina de trabalho e exercícios.
"Fiz uma viagem com a seleção brasileira de futebol, a primeira data FIFA de eliminatório do ano de 2023, no Pará, e trabalhei normal. Quando voltei, tinha um exame de rotina e a médica viu que o meu colo do útero estava muito curto. Eu estava com 38 milímetros na ultra do mês anterior, com 16 semanas, e nessa, com 22 semanas, eu estava só com 8 milímetros e tendo contração sem sabe", conta Monique. O risco de perder as duas era muito grande, com o colo prestes a ceder.
Saí da ultrassonografia direto para a internação, sem entender nada. Foi um choque ouvir que eu poderia ter que ficar três meses deitada. Era como se eu tivesse perdido o chão. Monique Danello, jornalista e mãe das gêmeas Alice e Helena
Os primeiros dias foram especialmente difíceis: banhos e necessidades no leito, sem poder se mover. Após o procedimento para colocar um pessário (dispositivo removível que pode ser usado para dar suporte ao útero), Monique voltou para casa, mas ainda em repouso absoluto.
Mesmo com todos os cuidados, a bolsa de Alice rompeu com apenas 25 semanas. A jornalista foi novamente internada, desta vez para permanecer no hospital até o nascimento das filhas. Uma batalha diária, já que cada dia a mais no útero significava menos risco de sequelas para elas.
Mesmo assustada, ela seguiu à risca as recomendações - bebendo até sete litros de água por dia para repor o líquido amniótico. Mas, na madrugada do dia 5 de novembro, entrou em trabalho de parto, com 29 semanas e cinco dias de gestação (normalmente médicos aguardam a 40ª semana de gestação para o parto).
Alice e Helena nasceram prematuras, pesando pouco mais de 1,3 kg cada. A partir dali, a realidade da mãe passou a ser outra: mais dois meses de muita luta.
Visitas, noites mal dormidas, Natal e Ano Novo no hospital

Helena precisou ser entubada devido a complicações respiratórias, enquanto Alice enfrentava desafios gástricos. A realidade da UTI neonatal foi um baque para Monique, que ficou atônita.
No início, não conseguia descer para vê-las. Me fazia muito mal-estar ali dentro, ouvir os barulhos? Meu marido ia, eu me sentia culpada, mas não conseguia lidar com aquele ambiente. Monique Danello, jornalista e repórter do TNT Sports, mãe das gêmeas Alice e Helena
Assim que a jornalista conseguiu frequentar a UTI, a rotina passou a ser exaustiva, com extração manual de leite para alimentar as filhas pelas sondas. Por segurança, não é permitido usar bomba de extração elétrica na unidade, e Monique não conseguia usar a manual, então teve que aprender a se ordenhar manualmente.
Visitas, noites mal dormidas, Natal e Ano Novo no hospital, e a dor de sempre voltar para casa sem elas.
Monique conta que a informação foi a sua maior aliada e aconselha outras mães, que são apresentadas a esse mundo paralelo, a se agarrarem a este recurso. "Pesquisei muito, conversei com o máximo de profissionais, tirava dúvidas com todo mundo que passava por mim, e depois que consegui entender melhor aquele universo, meus dias foram muito mais leves", detalha.
Olhar para outras mães e bebês ajudava também. Além de perceber que não estava sozinha, Monique acompanhou muitas vitórias e se inspirou.
Claro que tem bebês que têm situações mais complicadas, mas o que a gente viu, na grande maioria do tempo, foram crianças que receberam essa segunda chance e que conseguiram viver. Cada dia era uma vitória, e isso me ajudava a ter força. Monique Danello, jornalista e repórter do TNT Sports, mãe das gêmeas Alice e Helena
Após 67 dias, Alice e Helena venceram a prematuridade extrema e finalmente foram para casa, juntas e saudáveis. Elas já completaram um ano. "A madrugada do nascimento delas foi o dia mais feliz da minha vida e também o mais desafiador. Ver minhas filhas sendo levadas dos meus braços para UTI, um mundo desconhecido para nossa família, e chegar em casa sem elas não é como a gente espera. Mas a vida também pode ser muito generosa. Elas me ensinaram sobre coragem, fé, resiliência, amor e nós vencemos. Vencemos a prematuridade e os desafios que os bebês que nascem antes da hora precisam enfrentar," conclui.
Lições de Resiliência

Hoje, ambas superaram as diversidades da prematuridade, mas seguem monitoradas por especialistas. Já estão quase andando, atingiram marcos de desenvolvimento que as colocam em igualdade com bebês nascidos a termo, brincam juntas, e se descobrem como irmãs.
"Elas são muito diferentes: Alice é concentrada, enquanto Helena é mais ágil. Uma aprende algo e a outra logo imita", celebra Monique, que ainda enfrentou julgamentos ao decidir retornar ao trabalho pouco depois de as filhas saírem da UTI.
"Meu trabalho é meu descanso. Foi importante para me sentir viva e ter energia para elas. Aprendi que não existe certo ou errado na maternidade, só o que funciona para cada mãe", comenta sobre as críticas que recebeu.
A verdade é que a Monique já tinha se sentido culpada o suficiente e aprendido a lição. "Será que eu fiz tudo certo durante a gravidez? Por que eu fui ter essas contrações antes da hora? Será que eu podia mesmo fazer atividade física? Será que eu devia ter viajado? E a gente teve várias pequenas intercorrências com as duas, que eu me sentia mais culpada ainda, porque via uma estando bem e a outra não estando. Ficava pensando, 'e se essa não conseguir chegar lá?'".
A jornalista reflete constantemente sobre sua jornada e dá dicas para quem passa por algo semelhante em suas redes sociais.
A prematuridade me ensinou que não temos controle sobre a vida. Aprendi a valorizar as pequenas vitórias e a força dos meus filhos. Cada dia é um milagre, e sou grata por essa jornada, por mais difícil que tenha sido. Monique Danello, jornalista e repórter do TNT Sports, mãe das gêmeas Alice e Helena
Mitos e verdades sobre prematuridade
Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 340 mil bebês prematuros nascem no Brasil anualmente, o que representa cerca de 12% do total de nascimentos e a principal causa de mortalidade infantil, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS).
A neonatologista Daniela Peyneau, do Complexo Hospitalar de Niterói (CHN), da Dasa, explica que existem três classificações de prematuridade: o bebê que nasce entre 34 e 36 semanas, chamado "pré-termo tardio"; aquele que nasce entre 30 e 34 semanas, classificado como "pré-termo moderado"; e o recém-nascido com menos de 30 semanas, considerado "pré-termo extremo".
Todos necessitam de cuidados especiais com a saúde, mas ainda há muitos mitos e verdades sobre o tema. Veja só:
1. O bebê prematuro se desenvolve em tempos diferentes?
Verdade. O desenvolvimento de bebês prematuros ocorre em um ritmo diferente, pois eles passam menos tempo no útero. Segundo Daniela Peyneau, para acompanhar o desenvolvimento de um prematuro é utilizado o conceito de idade corrigida que considera o período que faltou para o bebê completar as 40 semanas de gestação.
"Um bebê que nasceu com 32 semanas terá uma idade corrigida de 1 dia de vida após 8 semanas do seu nascimento. Sendo assim, espera-se que ele atinja os marcos motores, sociais e de linguagem, dentro desse período corrigido. Mas vale lembrar que todo ritmo de evolução é individualizado, por isso, com os estímulos corretos, o prematuro atingirá todo seu potencial."
2. Quem foi bebê prematuro precisa de cuidados especiais com a saúde a vida inteira?
Mito. Nem todos os bebês prematuros necessitarão de acompanhamento diferenciado ao longo da vida. Isso dependerá do grau de prematuridade, das complicações ao nascer ou da presença de doenças congênitas, como problemas cardíacos.
"É importante que, na infância, esse paciente seja monitorado de perto por uma equipe multidisciplinar, mas a maioria dos prematuros chega à vida adulta de maneira saudável", afirma Daniela.
3. Bebês prematuros precisam de vacinas diferentes?
Mito. Os bebês prematuros devem receber as mesmas vacinas que os outros bebês, de acordo com o calendário proposto pelo Ministério da Saúde, como explica o infectologista Alberto Chebabo, do laboratório Sérgio Franco, da Dasa.
"Para os prematuros, a vacinação pode ser realizada de forma adaptada às condições clínicas. Por exemplo, algumas vacinas podem ser aplicadas em intervalos mais curtos, dependendo da avaliação médica ou se o bebê que tem menos de 2kg deve ganhar peso antes de receber as primeiras doses de imunização. Esse cuidado ajuda a garantir que os pequenos tenham a proteção necessária o mais cedo possível, minimizando os riscos de complicação", detalha o especialista.
4. A imunidade dos bebês prematuros é sempre mais frágil?
Verdade. Em geral, a imunidade de bebês prematuros é mais frágil do que a de bebês nascidos a termo. "Quanto menor a idade gestacional do bebê, menos o seu sistema imunológico terá se desenvolvido, já que a transmissão de anticorpos IgG da mãe através da placentária é maior no último trimestre de gestação", explica Alberto.
5. Mulheres que foram prematuras podem ter filhos prematuros também?
Verdade. Desenvolvimento do sistema reprodutor, mais chances de complicações obstétricas e fatores genéticos podem influenciar um parto prematuro. Além da prematuridade materna, outros fatores que podem contribuir são a idade materna, o número de gestações anteriores, hábitos de vida e histórico de saúde.
6. Um intervalo curto de uma gestação para a outra pode aumentar o risco de prematuridade?
Verdade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda um intervalo mínimo de 18 meses entre as gestações. No entanto, o ideal é que esse período seja de, pelo menos, 24 meses (dois anos). Segundo a neonatologista Daniela Peyneau, esse período é essencial para o corpo da mulher se recuperar completamente, as reservas nutricionais serem repostas e o útero voltar ao seu estado normal.
7. É possível diminuir o risco de prematuridade?
Verdade. Um pré-natal regular é fundamental para minimizar o risco de um parto prematuro. Por exemplo, um estudo do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia) apontou que as mães que tiveram um baixo número de consultas pré-natais - menos de quatro durante a gestação - elevaram em 2,2 vezes a chance e a recorrência de parto prematuro.
"Ampliar o acesso das gestantes as consultas e os exames, bem como o monitoramento médico constante, são passos necessários para evitar complicações. Se ainda assim o bebê nascer prematuro, não significa, necessariamente, que vá haver algum problema de saúde grave com a criança. O avanço da medicina neonatal aumentou as taxas de sobrevida, juntamente com as chances de desenvolvimento pleno da criança", comenta Daniela.
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