Vergonha do corpo no sexo: como desencanar dessa ideia machista?

A primeira vez que Bárbara** ficou a sós com o seu primeiro namorado, ela sentiu medo. Os toques começaram a ficar mais íntimos e veio o bloqueio: "eu não tive coragem de tirar a camiseta por vergonha da minha barriga".

A estudante de medicina de 20 anos relata que essa situação aconteceu mais de uma vez por conta do desconforto que sentia com o próprio corpo: "nunca consegui ficar totalmente sem roupa perto dele", conta. Essa dificuldade em se sentir bem com o próprio corpo começou cedo para a Bárbara, ainda na adolescência, e continua sendo uma questão de autoestima e, muitas vezes, insatisfação.

De onde vem esse sentimento comum entre as mulheres? Uma razão pode ser o fato de que a imagem que as mulheres visualizam sobre quem elas deveriam ser corresponder a um ideal inexistente.

As inseguranças que a pornografia traz para as mulheres também estão relacionadas à performance que esse conteúdo dissemina. Os padrões inalcançáveis de gemidos e posições são algumas das exigências atribuídas às mulheres que se somam a uma estética que também não condiz com a realidade.

O peso do padrão de beleza incansável

Apesar de um ideal de beleza ainda propagado de mulheres muito magras, brancas, altas e de traços finos, existe a maioria da população feminina brasileira que não se encaixa ali.

A abertura para o diálogo e o acesso à informação são pontos importantes quando falamos da autoestima da mulher e a sua relação com o corpo, mas vale lembrar que a cultura impacta diretamente na maneira como o corpo será observado, refletindo em nossas relações. Apesar de as mulheres já serem donas dos próprios corpos de um modo radicalmente diferente de cem anos atrás, ainda existem resquícios que trazem sofrimento e limitação.

Quando incluímos as mulheres negras na conversa, o questionamento do padrão intangível é ainda maior. O reconhecimento do ponto de partida é fundamental para uma troca sustentável, saudável e respeitosa para todas.

O sexo e a preparação para ele já virou motivo para muitas mulheres olharem para as suas vulvas, porém, essa maneira de lidar com o corpo revela o quanto as mulheres se prendem ao agrado do outro. O desafio está, portanto, em uma sexualidade que seja para si mesmas.

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A aceitação do próprio corpo não acontece como mágica e as experiências muitas vezes são doloridas. Na sociedade, existe uma vulva padrão e essa não é a vulva de anatomias afrodescendentes, por exemplo.

Como ressignificar a sexualidade e a relação com o corpo

Um passo importante para perder a vergonha do corpo é se conectar consigo mesma e entender a dimensão cíclica da própria sexualidade, percebendo as alterações, potências e preferências do corpo e da mente ao longo de todo o ciclo menstrual. O autoconhecimento e o autocuidado são chaves para o processo, mas pede das mulheres um entendimento mais amplo e profundo do contexto coletivo.

Diante de tantos obstáculos e impeditivos, como se sentir melhor consigo mesma? A sexualidade vista por um olhar mais positivo coloca o autoconhecimento em um patamar poderoso, mas ainda tem mais a ser feito.

Há, também, a importância de construir coletivamente um olhar diferente aos corpos e à sexualidade da mulher. Sem isso, a responsabilidade torna-se individual para cada uma, o que pode ser até mesmo nocivo. Estar à vontade com uma sexualidade é também se situar no tempo espaço. Isso faz a gente se entender.

Fontes: Ana Suy Sesarino Kuss, psicanalista e professora do curso de Psicologia da PUC/PR; e Caroline Amanda, terapeuta menstrual e consultora em educação e saúde sexual

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*Com matéria publicada em 04/04/2021

**A entrevistada pediu para que o seu nome fosse alterado

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