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'Nunca morei com minha mãe': mulheres falam como é ser criadas pelas avós

Daniela Müller, 39, morou com a avo desde que nasceu - Acervo  pessoal
Daniela Müller, 39, morou com a avo desde que nasceu Imagem: Acervo pessoal

De Universa, São Paulo

26/07/2022 04h00

Os avós sempre costumam ser figuras importantes na criação dos netos. São eles os responsáveis pelos mimos, por deixar dormir fora de hora, por incentivar as artes... E são também, muitas vezes, aqueles que assumem o lugar dos pais na ausência dos genitores. Hoje, dia 26 de julho, é celebrado o Dia dos Avós. E aproveitamos a data para falar com duas mulheres com quem isso aconteceu. Com mães ausentes, Beatriz, 24, e Daniela, 39 têm as avós como figura materna.

Para Beatriz, o novo convívio começou quando ela tinha cinco anos. Sua genitora decidiu que não tinha condições de criá-la e ao irmão, deixando-os com a avó paterna. Já Daniela sempre morou com a avó e teve apenas uma tentativa de morar com sua mãe e a outra família, aos seis anos. Que não deu certo. Elas contam ao Universa a importância que essas avós/mães tiveram em sua vida.

'Não podia chamar de mãe, só de vó'

Beatriz Serrano, 24, passou a morar e ser criada pela avó aos cinco anos  - Acevo pessoal  - Acevo pessoal
Beatriz Serrano, 24, passou a morar e ser criada pela avó aos cinco anos
Imagem: Acevo pessoal

"Meus pais se separaram quando eu tinha cinco anos. Minha mãe 'de barriga', na época, decidiu que não tinha como cuidar de mim e do meu irmão. Por isso minha avó, mãe do meu pai, se dispôs a cuidar da gente. Ela tinha quatro filhos homens, mas mesmo assim, entrou na frente de tudo e assumiu a responsabilidade.

Passamos a morar com ela, na mesma casa em que estava nosso pai, e por um tempo até tivemos contato com a nossa mãe. Nos encontrávamos com ela aos finais de semana esporadicamente, mas ela vivia em ambientes sem uma boa estrutura familiar. Cada final de semana estava em uma casa diferente, locais esquisitos. Meu pai começou a achar estranho, mas tinha esse esforço.

A última vez que eu a vi foi quando eu tinha 13 anos, na casa da minha avó. Depois, só na vida adulta. Minha avó nunca nos deixou sentir falta desse amor. Ela foi tão presente, nos amou tanto, deu carinho e suporte. Se perguntar para mim e para meu irmão sobre quem é a mãe, só nos referimos a nossa avó.

Mesmo com as portas da sua casa sempre abertas, nossa mãe biológica não ia nos visitar nem lá. Ela deve ter tido os motivos dela, mas nunca busquei saber. É uma caixa que está no fundo do poço, eu não mexo. Nunca passou pela minha cabeça procurar por ela.

Quando eu era mais nova, chorava no dia das mães, mas depois comecei a entender que a minha mãe era a minha avó. Nós éramos muito amigas, então ela faleceu há um ano, vítima da covid-19, foi um grande sofrimento. Até hoje é o maior que sinto. A falta dela é muito grande na minha vida.

Minha avó sempre sonhou em ter uma menina, e me teve. Eu sei que não vim da barriga, mas ela falava para mim e para o meu irmão que saber que ela seria a responsável por cuidar da gente foi um sonho realizado. Éramos apenas eu e ela de mulher na casa. Ela me vestia de boneca. Tínhamos uma conexão extraordinária. Quando ela me perguntava se eu gostaria de saber da minha mãe, eu dizia que minha mãe era ela.

Mas mesmo assim, sempre a chamei de vó. Ela contava que, quando eu era pequena, perguntei se podia chamá-la de mãe, mas ela não deixou. Me explicou que era a minha avó, que eu tinha uma mãe. Minha avó foi muito sábia e, mesmo com os problemas, nunca anulou a mãe que tive", Beatriz Serrano, 24 anos, gerente, São Paulo


'Não me adaptei em morar com a minha mãe'

A mãe biológica de Daniela Müller a levou para morar com ela aos 6 anos, mas ela não se adaptou  - Acervo pessoal  - Acervo pessoal
A mãe biológica de Daniela Müller a levou para morar com ela aos 6 anos, mas ela não se adaptou
Imagem: Acervo pessoal

"Meu pai desapareceu quando minha mãe engravidou. Eu nasci na década de 1980 e minha avó quis me assumir, me registrar como filha, mas minha mãe me registrou. Apesar do nome na certidão, eu nunca morei com ela. Por sofrer com a bipolaridade, ela teve diversos problemas de internação. Quando eu tinha um ano, minha mãe saiu de casa. Além disso, conheceu meu padrasto e se casou quando eu era bem pequena, mas eu continuei morando com a minha avó.

Quando se é criança, você acha estranho ter festas do Dia das Mães e sua avó comparecer. Mas eu já a chamava de mãe. A chamei assim até uns cinco anos, mas minha mãe biológica ficava brava, então parei. Ela sempre me apoiou e esteve ao meu lado. Não tem muita explicação. Indiferente se é a mãe ou avó, quando a pessoa te ama é o que importa.

Quando eu estava com seis anos, e minha mãe era casada e com duas filhas do novo casamento, ela quis me levar para morar com ela. Mas não me adaptei. Eu não queria ficar longe da minha avó, chorava muito. Fiquei apenas alguns dias e voltei. Para mim, foi horrível.

Eu estava adaptada com a minha avó, ela cozinhava o que eu gostava, tinha a escola perto, meus amigos, as brincadeiras... Depois disso, fiquei com medo até de sair para passear com ela por medo de ela me levar pra casa dela.

Hoje em dia, como a minha mãe está cuidando da minha avó, que tem 83 anos, eu tenho uma relação mais próxima com ela. Mas antes, não tinha. Via apenas de vez em quando e quando nunca ia visitar. Minhas irmãs mesmo eu só via nas férias. Não participávamos da vida uma da outra.

Me julgavam achando que eu seria mimada por ser criada pela minha avó, mas vejo a presença dela em minha como um impacto muito positivo na minha vida. Eu saí de casa aos 20 anos para morar sozinha, fui a primeira da família a concluir um curso superior. Nunca quis ser julgada por isso, me esforcei mais para obter conquistas profissionais e na educação", Daniela Müller, 39 anos, jornalista, Novo Hamburgo (RS)