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'Sem gás e celular, o desconhecido virá', escreveu jornalista morta em Kiev

Vira Hyrych mostrou como ficou a vida dos pais idosos, isolados por conta dos ataques russos - Reprodução/Facebook
Vira Hyrych mostrou como ficou a vida dos pais idosos, isolados por conta dos ataques russos Imagem: Reprodução/Facebook

Gabriel Dias

Colaboração para o UOL

02/05/2022 11h18

A jornalista Vira Hyrych, 55, estava indo para a cama no último dia 28 quando foi morta por míssil russo, que atingiu o prédio onde ela morava em Kiev. Produtora da Radio Liberty, onde trabalhava desde 2018, ela tinha o hábito de contar nas redes sociais os bastidores da guerra na Ucrânia, que já matou outros 21 jornalistas, e como a vida de seus pais estava sendo drasticamente afetada.

"Aos oitenta anos, meus pais resistiram a este teste!", escreveu a jornalista.

A família dela mora em um no vilarejo, próximo de Kiev, que ficou isolado por conta dos conflitos. Ela deixou os pais e um filho já adulto.

Segundo Hyrych, um velho fogão a lenha do seu pai era o que permita que eles ainda cozinhassem. No Facebook, mostrou a casa de sua mãe completamente isolada, sem comunicação, luz, água e gás.

"Hoje, um velho fogão camponês salva a vida dos meus pais. Enquanto as Forças Armadas perseguem os restos dos tanques russos, não há como chegar ao vilarejo. Pela segunda semana, meus pais estão sem eletricidade em uma casa. Cada dia é mais difícil. Quando o gás do fogão desaparecer, a lareira ainda encontrará trabalho. Quando o carro ficar sem gasolina, o telefone será descarregado e o desconhecido virá", relatou.

"Não será possível restaurar as redes rapidamente, mas o mais importante é que haja conexão e oportunidade de entrega de alimentos."

A jornalista permaneceu em Kiev em meio à guerra, justamente para ficar próxima de seus pais. É possível encontrar em suas redes sociais relatos, vídeos e fotos da vida dos ucranianos durante a guerra.

Logo no início do conflito, ela mostrou os primeiros sons dos ataques russos. "Explosões são ouvidas em um subúrbio próximo. Não entre em pânico", escreveu.

Vítima de ataque russo

O ataque ao apartamento de Vira foi divulgado pelo seu colega jornalista Oleksandr Demchenko, da Radio Liberty, uma organização financiada pelo governo dos EUA que transmite notícias em áreas onde a imprensa livre pode ser restrita ou ainda não estabelecida.

Ele divulgou uma imagem do prédio onde é possível ver os primeiros andares totalmente destruídos e o carro que seria de Vira com uma das janelas totalmente quebrada.

"Não existe mais fé. Um míssil russo preciso atingiu a casa dela. Vira ficou lá a noite toda, e foi encontrada apenas de manhã", lamentou Oleksandr.

A morte foi lamentada por colegas e políticos, que a conheciam dos anos em que passou atuando nos principais canais de TV ucranianos.

"Meu Deus! Eu pessoalmente conhecia a Vira. Estivemos em contato todos esses dois meses [de guerra]. Ela me pedia para dar comentários, me pedia para participar das transmissões", disse Anton Gerashchenko, conselheiro do Ministro de Assuntos Internos da Ucrânia.

Até 27 de abril, o Comitê de Radiodifusão e Televisão, do governo ucraniano, contabilizou 243 ataques a jornalistas e meios de comunicação, sendo que 22 jornalistas morreram durante a cobertura da guerra ou em razão de bombardeios em momentos em que não estavam trabalhando.