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Após episódios de machismo, Frota agora apoia bandeira de gênero e aborto

O deputado Alexandre Frota - Cleia Viana/Câmara dos Deputados
O deputado Alexandre Frota Imagem: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Rute Pina

De Universa, em São Paulo

15/03/2022 04h00

Protagonista de episódios de machismo no passado, o deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP) já chamou a também deputada federal Sâmia Bonfim (PSOL-SP) de "hamburgão da Câmara" em uma publicação no Twitter, em 2019. "Lembram que chamei ela disso, mas não lembram que fui ao microfone pedir desculpas", diz o deputado a Universa, relembrando que apagou o post e procurou a colega na sequência. Agora ele garante, taxativo: "Amadureci".

"A gente fica mais velho e tem outro entendimento em relação a muitas questões, principalmente quando se está na política", diz. Frota é o parlamentar homem com o maior número de projetos favoráveis às mulheres na Câmara dos Deputados, segundo o ranking Elas no Congresso. É também o quinto deputado, entre todos os 513 da casa, que mais cria e apoia propostas para a população feminina. Em contrapartida, das 19 pessoas em sua equipe, apenas uma é mulher. "Ela representa muito bem as mulheres em nosso dia a dia."

Entre os projetos que já apresentou neste ano está o que obriga condomínios a disponibilizarem um botão de alarme para acionar a portaria em casos de violência doméstica. Outro quer proibir a realização de publicidade sexista ou estimuladora de qualquer tipo de violência sexual. Frota também apresentou um projeto para que mulheres responsáveis pela unidade familiar ou vítimas de violência doméstica e de baixa renda tenham prioridade nos programas de habitação de interesse social, pauta que já está em discussão no Senado.

Na entrevista abaixo, ele diz não ter receio de críticas sobre surfar na onda do feminismo, afirma estar antenado na pauta e faz a defesa do direito ao aborto, mas evita cravar que é contra a descriminalização: "Na prática, sou a favor do bem-estar da mulher."

UNIVERSA - O senhor é o homem que mais apresentou projetos de lei em benefício das mulheres nos últimos quatro anos na Câmara dos Deputados. No passado, porém, seu nome já esteve envolvido em episódios de machismo. O que mudou?
Alexandre Frota -
Amadureci ao longo dos anos. A gente fica mais velho e tem outro entendimento sobre muitas questões, principalmente quando se está na política. Me relaciono muito bem com as mulheres na Câmara, principalmente e até com as mulheres da esquerda, que talvez no passado não se relacionariam comigo. Estive dois anos como titular da Comissão de Cultura, onde eu trabalhava com oito mulheres, todas elas de esquerda: Jandira Feghali e Alice Portugal [ambas do PCdoB], Benedita da Silva [PT], Lídice da Mata [PSB], entre outras. Para mim, foi um aprendizado.

Além disso, hoje tenho uma filha de três anos, um casamento sólido. Fui acompanhando todos esses processos em todos esses anos e vendo uma série de coisas que foram me desagradando também. Nos últimos anos, as questões femininas e temas importantes —como a violência contra a mulher, assédio, aborto, maternidade, carreira, a mulher na política— estão sendo discutidos amplamente na sociedade e têm ganhado espaço no cenário político. A luta pelo direito das mulheres progride no país e em todo mundo e vemos nitidamente alguns avanços conquistados nesses últimos anos. Porém, a mulher precisa ser mais representada na política.

Das proposições que apresentou relacionadas a mulheres, quais destaca?
Os projetos que apresentei são todos de extrema importância. Por exemplo, priorizar a mulher vítima de violência e de baixa renda para aquisição de casa própria. O que mais me dá prazer e coragem em trabalhar em cima disso é que são projetos que têm sido aprovados nas comissões dos direitos das mulheres. Ou seja, por pessoas interessadas que debatem diariamente esses temas. Quando um projeto nosso é aprovado na comissão específica do qual se diz respeito, tem um valor muito grande. É uma bandeira minha abrir espaço e capacitar mulheres para que elas ocupem os espaços de poder, independentemente de ideologia e de partido.

No seu gabinete, de 19 pessoas contratadas, há apenas uma mulher. Não vê contradição entre sua bandeira e o que faz na prática? Já pensou em contratar mais funcionárias?
Não necessariamente isso é uma contradição. É uma questão de ter montado uma equipe que tem hoje uma mulher --que, aliás, se faz muito presente no nosso gabinete e representa muito bem as mulheres no nosso dia a dia.Ouço muito a bancada feminina, não só na Câmara, mas também a do meu partido, o PSDB. Converso muito com as que militam na política, não necessariamente deputadas estaduais ou federais, mas que tem uma atuação forte, como a Edna Martins, por exemplo, coordenadora de Políticas para a Mulher do governo do estado de São Paulo e presidente do PSDB Mulher. Também participo de reuniões especificamente com mulheres. Eu e minha equipe procuramos estar bastante antenados. Recebemos muitas coisas também via redes sociais.

Você se considera um ex-machista?
Não. Eu me considero um deputado que amadureceu, que trabalha com questões importantes, algumas focadas. Entre elas, a da mulher, o que tem ficado evidente desde o início do meu mandato. Não foi algo que fiz para agradar. Quem me conhece sabe que nunca fiquei em cima do muro em relação a isso ou a qualquer tipo de questão.

Não tem receio de ser visto como alguém que está surfando na onda dos direitos do feminismo?
Não posso me preocupar com esse tipo de crítica. Tenho que trabalhar, produzir, entregar e aprovar projetos. Não posso ficar parado pensando em críticas e o que vão falar, porque, para mim, pouco importa. Só lamento. Isso não tem importância. O pior é se não estivesse fazendo absolutamente nada pela mulher. E não são projetos que a gente faz da noite para o dia, são discutidos, ouvidos.

É a favor da descriminalização do aborto?
Sou um cara que sempre foi a favor de a mulher escolher o que é melhor para ela, independentemente de ideologias e de religião. A mulher tem o direito de escolha. Se ela, por alguma questão, sente no coração que deve abortar, essa é uma escolha muito pessoal. Não temos o direito de ficar julgando ou criticando uma escolha que é, muitas vezes, muito dolorosa. Penso que é uma decisão que temos, antes de mais nada, que respeitar.

Mas com relação a políticas públicas e ao Estado, o que tem que ser feito?
O Estado tem que se manter firme nas suas decisões e apoiar. Precisa apoiar sempre a mulher, em todas as questões. Não é que eu seja a favor de descriminalizar o aborto, mas sou a favor de o Estado, primeiro, apoiar a mulher, a saúde e o bem-estar dela. Não podemos ter interferência nessa escolha que, como te falei, é uma decisão muito pessoal e difícil.

Mas hoje a nossa legislação impede essa escolha da mulher.
Sim, hoje ela impede.

Então o senhor é a favor de que se mude essa legislação do aborto?
Sou a favor que mude. Sou a favor que a mulher possa escolher e que o Estado possa apoiar.

Então, na prática, o senhor seria a favor da descriminalização?
Sim. Na prática, sou a favor do bem-estar da mulher.

O senhor apresentou um projeto para a criação do Dia Nacional contra a Gordofobia. Em 2019, fez um comentário gordofóbico ao chamar a deputada Sâmia Bomfim de "hamburgão da Câmara". Se arrepende disso?
Lembram que chamei, mas não lembram que fui ao microfone, no plenário, pedir desculpas. Inclusive, algumas deputadas foram falar comigo sobre o gesto e, imediatamente, me desculpei na própria sessão, no mesmo dia. Não deixei passar. Não tenho compromisso com o erro. Inclusive, tenho uma boa relação com ela hoje, de conversar e trocar ideias.

O senhor disse que não tem problemas em falar de erros publicamente. Sobre o episódio de 2014 em que narrou um estupro contra uma mãe de santo na TV, queria saber...
Esse é um episódio que já foi extremamente superado, extremamente debatido e tudo o que eu tinha para falar sobre já falei. Não tenho mais nada para falar sobre ele.

Voltando a falar sobre seus projetos, o senhor enviou a proposta de só permitir votar quem tivesse vacinado. Qual seu objetivo com isso?
Que todas as pessoas estejam vacinadas. Se você precisa estar vacinado para viajar, ir para a faculdade e fazer uma série de coisas, como tirar o passaporte, então, você tem que estar vacinado para votar. Só quem não quer que esse projeto passe é justamente aquelas pessoas ideológicas em torno do Bolsonaro. Esse projeto não fere nenhum tipo de liberdade. Quem não toma vacina que fere nossa liberdade.

Estamos no último ano do governo de Jair Bolsonaro (PL), que o senhor apoiou no início e, depois, criticou, inclusive se tornando também um dos parlamentares que mais enviaram pedidos de impeachment.
Enviei 12 pedidos de impeachment [para a presidência da Câmara].

Qual sua avaliação do presidente?
Este é um governo que não pode dizer que lutou pelas vacinas ou para acabar com a pandemia, pelo contrário. Um governo que não vai poder falar que combateu a corrupção. O Bolsonaro, claramente, já não atua. Ele é um figurante, e hoje temos outros dois presidentes do país: o Arthur Lira [PP-AL, presidente da Câmara dos Deputados] e o Ciro Nogueira [ministro-chefe da Casa Civil], que são quem manda hoje no Bolsonaro. Algumas pessoas ainda idolatram esse sujeito que não faz absolutamente nada quando o litro da gasolina está a R$ 8, quando temos a cesta básica mais cara dos últimos dez anos.

Chegamos ao último ano do governo Bolsonaro com mais de 150 pedidos de impeachment, com o Arthur Lira sentado em cima de todos. Com descaso e a desigualdade aumentando no país, com milhões de desempregados, em insegurança alimentar. Um governo que não fala com as minorias, não fala com as mulheres, não fala com as classes LGBTQIA+, que quer destruir os povos indígenas, não acredita nos investimentos no meio ambiente, corta investimentos em ciência e tecnologia, não aposta no futuro e na educação do país. Espero que a gente acabe com isso no dia 2 de outubro.