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Quantos likes vale um orgasmo? Sexólogas tiram dúvidas nas redes sociais

Thalita Cesário é terapeuta sexual e usa as redes sociais para falar de bem-estar sexual  - divulgação
Thalita Cesário é terapeuta sexual e usa as redes sociais para falar de bem-estar sexual Imagem: divulgação

Manuela Aquino

Colaboração para Universa

21/02/2022 04h00

Elas fazem conteúdo sobre sexualidade nas redes sociais, principalmente no Instagram. E falam de anatomia da vulva e do clitóris, masturbação, penetração, tudo bem explicado com linguagem direta e que dá engajamento. Mesmo assim, essas profissionais ainda recebem dúvidas que podem parecer bem básicas, mas não são. Junto com elas estão muitas crenças, mitos, tipo de educação e o papel da mulher na sociedade. Então, elas ainda têm muito trabalho pela frente.

Conversamos com cinco sexólogas que possuem contas bem ativas, fazem enquetes e têm uma relação próxima com as seguidoras via DM. Baixa libido, orgasmo difícil de alcançar (ou nunca alcançado), dor na relação sexual e as variações diante desses temas aparecem como as principais reclamações para todas elas.

"Ajudo a combater o que chamo de 'empobrecimento erótico'"

Nathalie Raibolt, ginecologista e sexóloga, do Rio de Janeiro, RJ - arquivo pessoal - arquivo pessoal
Ginecologista e sexóloga, Nathalie Raibolt, fala de prazer feminino nas redes sociais
Imagem: arquivo pessoal

"A maior dúvida que recebo é como fazer para ter mais desejo sexual. O perfil da maioria das minhas seguidoras é de mulheres que já sentiram desejo, mas acabaram perdendo por não investir nele, deixaram de lado. Geralmente, estão em relacionamentos e já não têm mais aquela paixão, com a potência do encantamento.

Com o passar do tempo e o cotidiano, precisam gerenciar a vida e resolver problemas. Sem perceber, acabam não tendo mais desejo sexual. É como se deixassem essa parte da vida de lado, e aí se acostumam a viver sem sexo. Eu chamo isso de empobrecimento erótico. Na troca que faço e nos atendimentos, elas precisam reconhecer isso, o que pode ser difícil por conta de educação e de tabus que atingem todas as mulheres. Também indico se direcionar para situações excitantes, exercitar sozinha também a sedução e se masturbar.

Recebo muitas dúvidas ainda sobre como deixar o parceiro louco na cama. São mulheres que não estão preocupadas com seu prazer —muitas nem sentem prazer. Como se houvesse um protocolo, algo que todos os homens gostam e que elas precisam descobrir. Com esse tipo de preocupação, o sexo vira uma tarefa."

Nathalie Raibolt, ginecologista e sexóloga, do Rio de Janeiro

"Os temas orgasmo e a falta de libido são campeões de perguntas"

"Além de dor e falta de libido, as seguidoras, que na maioria têm entre 24 e 45 anos, perguntam muito sobre dificuldade de ter orgasmo. A maior parte das mulheres se cobra por não gozar na penetração, mas muitas nem sabem o que é. Pode ser que consigam com sexo oral, mas na penetração acabam não estimulando o clitóris.

Muitas ainda sentem vergonha de pedir, de se tocar naquela hora e terceirizam para o cara toda a responsabilidade. Não o conduzem, por exemplo. Não sou passadora de pano para macho, mas ainda rola essa crença do cara comedor que vai te dar prazer. A gente precisa se conhecer e sinalizar, ser protagonista.

Tudo isso tem a ver com crenças, com a forma de criação da mulher e se ela foi tolhida sexualmente. Recebo muitas mensagens de mulheres dizendo que não se masturbam por acharem sujo, outras não entendem a necessidade, pois estão em um relacionamento.

Para a gente sentir prazer, precisa ter uma mente erótica, estimular e ter um repertório sexual. Pode parecer difícil parar e pensar nisso todos os dias. Vivemos nesta fase de home office, todo o mundo junto o tempo todo, mas é só separar um tempo. Se a gente deixa para fazer ou pensar em sexo só à noite, ninguém vai ter energia. E a sexualidade não é só sexo, é a pulsão da vida."

Thalita Cesário, sexóloga, terapeuta e educadora sexual, de Brasília

"Nunca é normal sentir dor no sexo"

Thais Freire, fisioterapeuta pélvica e sexóloga, Porto Alegre, RS - arquivo pessoal - arquivo pessoal
Thais Freire é fisioterapeuta pélvica e sexóloga
Imagem: arquivo pessoal

"O que mais recebo são indagações sobre nunca ter tido orgasmo com penetração. Muitas mulheres têm em mente que isso precisa acontecer para que a sexualidade seja plena. Mas temos que entender sobre orgasmo e penetração. Se nosso prazer está no clitóris, por que não investir nisso? Aprender a estimulá-lo e as posições que podem ajudar nisso. Mas aí entra um conjunto de fatores, desde não se sentir bem com o corpo na cama, a indústria pornô feita majoritariamente por homens e a repressão sexual. A mulher, assim, não consegue desenvolver sua potência.

Também recebo muitas dúvidas sobre libido baixa e como resolver essa questão. Nesse caso, é preciso identificar os fatores que atrapalham. Muitas das mulheres que vão ao meu consultório tomam antidepressivos, por exemplo, o que interfere na libido. Mas isso não é determinante, é preciso investir na sexualidade como se fosse uma poupança. A libido não vem do nada, tem que estimular.

E, em terceiro, são perguntas relacionadas à dor na relação sexual, já que essa é a minha especialidade. Tem que ficar claro que nunca é normal sentir dor, nunca. Precisa procurar especialista, ginecologista e fisioterapeuta pélvica. Muitas vezes, essa sensação está relacionada à falta de autoconhecimento. A penetração deveria acontecer quando a mulher sinalizasse que está pronta, isso diminuiria muito o desconforto feminino."

Thais Freire, fisioterapeuta pélvica e sexóloga, de Porto Alegre (RS)

"Mulheres ainda têm na cabeça o mito do orgasmo vaginal"

Maria Cecília, psicóloga e terapeuta sexual, de São Paulo - arquivo pessoal - arquivo pessoal
Maria Cecília é psicóloga e terapeuta sexual
Imagem: arquivo pessoal

"Recebo muitas mensagens de mulheres perguntando: 'Nunca tive orgasmo, como faço?'. Mulheres de 25, 30 anos que não sabem o que é orgasmo. Sentem excitação, às vezes gostam de se masturbar e gozam, mas não na penetração.

Mulheres ainda têm na cabeça o mito do orgasmo vaginal, mas não vai rolar se não tiver estimulação clitoriana. Então, tem que se entender, se masturbar, para saber também como esse estímulo vai na transa. Saber como mexer no clitóris e as posições que são mais legais para ela, pois cada clitóris é um.

Tem ainda a questão da angulação das posições. Por cima estimula mais, papai e mamãe, mas de quatro e em pé não rola muito. Aí, tem que estimular de outras maneiras.

Também tenho falado com muitas mulheres que não estão transando, com pouco desejo sexual, e percebi nas conversas que é algo da relação. Perderam a vontade com o companheiro, mas se masturbam ou traem. Ficam ali pois há afeto.

Nesse caso de não querer se separar, elas podem renegociar o sexo, as regras do combinado antes, pois ali já não existe mais o espírito de inovação. Fica tudo na mesmice, e o cotidiano vai massacrando. Tomar banho junto, beijo de língua, um toque diferente não rola mais. Procurar outras alternativas diferentes pode funcionar, são escolhas."

Maria Cecília, psicóloga e terapeuta sexual, de São Paulo

"Poucas mulheres conseguem olhar para a sexualidade como algo prazeroso e leve"

 Thaís França de Araújo, ginecologista e sexóloga, Uberlândia, MG - arquivo pesoal - arquivo pesoal
Thaís França de Araújo é ginecologista e sexóloga
Imagem: arquivo pesoal

"Recebo muitas questões das seguidoras com relação a dor na relação sexual, o que, na medicina, a gente chama de dispareunia. Ela pode ser superficial, no início da penetração, ou profunda, quando já está vigorosa. Descobrir as causas, se é uma patologia como a vulvodínia, por exemplo, é um grande desafio.

Tem que procurar ajuda logo quando sente a dor, não pode aguentar.

Mas as campeãs, as dúvidas que mais aprecem, são baixa libido e dificuldade de orgasmo. As causas da baixa libido podem ser muitas. Uso de anticoncepcionais, traumas emocionais, baixa autoestima, problemas no relacionamento e doenças orgânicas, como hipotireoidismo e anemia, além da menopausa. Mas também a falta de exercitar e estimular a sexualidade pode ser uma importante causa.

A sexualidade para nós, mulheres, é muito pouco permissiva. Não somos orientadas a pensar sobre sexo, a ter fantasias e a entender que saúde sexual é um direito nosso e que faz parte de uma vida saudável.

Poucas mulheres conseguem olhar para a sexualidade como algo prazeroso e leve. E sexo é assim: quanto mais a gente fala, mais a gente pensa e melhor é o desejo sexual. Quanto menos, menos. Se não faz falta, perde em importância."

Thaís França de Araújo, ginecologista e sexóloga, de Uberlândia (MG)