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'Não está se adaptando': Sarah Poncio pode voltar a ter a guarda de Josué?

Nathália Geraldo

De Universa

02/02/2022 04h00Atualizada em 02/02/2022 20h56

Um imbróglio na convivência da família Poncio com Josué, de 3 anos, e na possível adoção do menino se desenvolve desde fevereiro de 2020. Daquele momento até ano passado, o menino vivia com eles, no Rio de Janeiro, e aparecia em muitos cliques divulgados pela família nas redes sociais. Sarah Poncio, influenciadora, é quem teria a guarda provisória do pequeno e, no Instagram, se intitulava mãe do menino.

No começo de dezembro do ano passado, uma reviravolta. A mãe biológica, Myllena Costa, pediu a retomada da guarda. Josué voltou a morar com ela, no Ceará. No começo dessa semana, a história ganhou mais um capítulo: em Stories feitos na segunda-feira (31), Myllena disse que a criança não está se adaptando ao dia a dia com ela e que deixaria ele voltar aos cuidados de Sarah. "Pela felicidade dele".

Desta vez, quem entrou em cena foi o pastor Márcio Poncio, pai da influenciadora, afirmando que Myllena estaria "cometendo um crime" se entregasse o menino de volta. Ela também usou a plataforma para dizer que só foi a público para dizer que Josué sentia falta da influenciadora. "Seu Márcio, a verdade é que a corda sempre quebra para o lado mais fraco. Em momento algum estou sendo egoísta, interesseira e biscoiteira como estão falando"

Nas redes sociais, sobram mensagens, fotos e transmissões ao vivo, promovidas por Myllena e por Sarah a respeito do garoto, inclusive o expondo para os seguidores. Para especialistas ouvidos por Universa, a conduta das partes tem sido distante daquilo que realmente importa: o bem-estar da criança.

Entenda a seguir de que maneira o aspecto legal e o impacto psicológico em Josué desse caso denotam o que, para os entrevistados, se chama de "adoção à brasileira".

Adoção por Sarah Poncio e o modelo "à brasileira"

A linha do tempo do "caso Josué" deixa mais perguntas do que respostas; mas, as versões de cada parte da história estão compiladas a seguir:

A adoção

Em fevereiro de 2020, o ex-casal Sarah e Jonathan Couto divulgou com alegria a chegada do bebê, então com um ano e que se chamava Lorenzo. À imprensa, revelaram que ele era sobrinho da babá dos filhos deles. A mulher, por sua vez, teria comentado com os patrões que a criança "estava passando por necessidades". "Então, Sarah se ofereceu para adotá-lo", explicou a assessoria dos famosos à época, em nota.

Apesar de, em 2020, o então casal ter informado em nota para imprensa que a chegada do bebê acontecia depois de "um processo de adoção definitivo", o Tribunal de Justiça do Ceará, local de nascimento do menor, afirmou para Universa nesta terça (1º) que não há no sistema processo referente ao caso.

Retorno à mãe biológica

Em 9 de dezembro de 2021, Sarah anunciou que "tiraram o filho dela". "Quando eu encontrei o Josué, eu me tornei mãe mais uma vez. Ao longo de toda nossa experiência, compartilhei todo o amor que pude com esse bebê, que tanto merecia afeto e carinho", escreveu, em um trecho de legenda no Instagram.

Em uma live, no final do mês, Sarah revelou que a mãe biológica não queria "assinar os papéis" para que o filho ficasse com ela. Foi só quando as duas passaram a ter contato, diz, que ela entendeu que Josué não havia sido abandonado pela mãe biológica. "Ela foi vítima, como eu. Ela não fez nenhuma ruindade de abandonar e depois querer tomar a criança".

"Ele não está se adaptando"

No dia 30 de janeiro, também em uma live, a mãe do menino afirmou que deixaria ele voltar a morar com Sarah. "Se fosse para ele voltar de papel passado e tudo mais, eu deixaria. Só que não foi possível. Eu achei que ele se adaptaria aqui, mas ele não se adaptou. Deixaria, sim, ele voltar. Pela felicidade dele, porque não adianta eu estar feliz, ele não", declarou no Instagram. Ela classificou a situação como um "mal-entendido".

"Pegar para criar" é cultural no Brasil

Por lei, as adoções no Brasil são feitas por meio de um sistema único em que são cadastrados adotantes e potenciais adotados. O Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento é o que regulamenta a "fila de adoção". Também é possível, pela lei da Entrega Legal, que a criança seja entregue ao núcleo familiar ou à pessoa que quer adotar na maternidade; basta que a mãe biológica da criança manifeste à Vara da Infância que não quer ficar com a criança.

Acontece que, por questões culturais, há situações em que as crianças são diretamente entregues para uma nova família sem intermédio da Justiça. São os casos em que parentes, conhecidos ou amigos "pegam para criar".

"Quando não são seguidos os ditames legais desde o começo acontece o que chamamos de adoção irregular ou adoção à brasileira", explica o advogado Rodrigo Prates, especialista em Direitos da Família e Sucessões. "São situações extremamente delicadas, em que o interesse da criança deve ser preservado, para que não tenha problemas, tanto para as mães quanto para o menor, que pode ficar com o estigma de 'quase adotado' ou 'abandonado pela mãe'".

Quando a criança não é adotada legalmente, a parte interessada precisa, de qualquer forma, entrar na Justiça para pedir a guarda definitiva. A partir deste momento, com a criança em um novo lar, a decisão fica na mão do juiz. Ele pode conceder a guarda ao pretenso adotante, ao núcleo familiar biológico ou redirecionar a criança a uma instituição/lar adotivo para ser cadastrada para um novo processo de adoção.

E se a criança é deixada na porta de alguém?

Ainda assim, explica o advogado, é preciso que quem quer adotar seja habilitado pelo sistema de Justiça. Quem não segue alguns requisitos previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, para adotar não entra na fila.

Há curso obrigatório na Vara da Infância e da Juventude, acompanhamento psicossocial daquele que pretende adotar e análise de documentação. Só então a pessoa se torna habilitada. Quando uma criança é direcionada para a nova família, mais fases, que incluem até um período conhecido como estágio de convivência.

"O sistema também serve para garantir igualdade, já que temos muito mais gente que quer crianças pequenas e brancas, determinando perfis que geram dificuldades na adoção de bebês e crianças pardos e pretos".

Existe justamente para se evitar beneficiamento de quem não está na fila. Porque, se não está na fila, a pessoa está burlando o cadastro nacional de adoção, Rodrigo Prates, especialista em Direitos da Família e Sucessões

Bem-estar de Josué é levado em conta?

A turbulência recai ainda mais sobre Josué. Para terapeuta de família e casal Cristina Villaça, que é mestre em Saúde Pública pela Fiocruz e já acompanhou processos de adoção, o impacto maior de toda a situação recai sobre o bem-estar de Josué.

"Há duas pessoas disputando. E a criança está sendo tratada como objeto, como se seus afetos não tivessem importância. O Juizado de Menores precisa intervir neste caso, porque é possível que se tenha um grande dano na vida dele", avalia a profissional, especialista em mediação de conflitos.

"Essa exposição dele é ruim, porque, com três anos, já é uma criança que entende o que acontece. Não tem capacidade de elaborar, mas há um impacto grave emocional e psicológico nele" Cristina Villaça, terapeuta de família e casal

Cristina explica que a "adoção à brasileira", modelo que já acompanhou em algumas experiências dentro do judiciário, é ainda mais sensível para as partes envolvidas do que quando se dá em caráter oficial.

"Por vezes, tem pessoa que acha que a criança é um objeto, reversível. E há os que pegam para criar com um propósito bom, mas os que também fazem com que a criança seja discriminada em casa ou faça os serviços que outros filhos não fazem. Não se pode esquecer que, quando famílias abastadas pegam uma criança porque ela é pobre há também uma questão de poder".

A mãe biológica também está sendo atacada nas redes sociais por ter "abandonado o filho". Rodrigo explica que o julgamento a que ela tem sido submetida por aqueles que querem definir o destino do menino é desproporcional.

"É temerário quando a população não conhece os procedimentos e as angústias de quem adota, quem quer ser adotado e quem disponibiliza o filho para adoção e quer julgar os casos com seus próprios valores", assinala. Ele pontua que caso o conteúdo das redes ofenda Myllena ou Sarah, os autores podem ser até processados por elas por eventual dano moral.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do publicado, o curso obrigatório é aplicado antes de o postulante à adoção se tornar habilitado para tal.