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Respeito e atenção ao pronome: guia para namorar uma pessoa não binária

Cal (Dua Saleh, à esq.) e Jackson (Kedar Williams-Stirling), na série "Sex Education" - Reprodução
Cal (Dua Saleh, à esq.) e Jackson (Kedar Williams-Stirling), na série "Sex Education" Imagem: Reprodução

Júlia Flores

De Universa

24/12/2021 04h00

Na terceira temporada da série da Netflix "Sex Education", Cal (Dua Saleh), que se identifica como uma pessoa não binária, envolve-se romanticamente com Jackson (Kedar Williams-Stirling), jovem hétero e cisgênero. Quando vão para a cama, Jackson se confunde e chama Cal de "linda". Na hora, o clima acaba.

Se você não sabe o que é uma pessoa não binária, uma rápida explicação: são pessoas que não se identificam nem como homem nem como mulher, ou seja, expressam as suas identidades de gênero fora do sistema binário (masculino/feminino).

Famosos como Bárbara Paz, Demi Lovato, Sam Smith e Sara Ramirez (que, inclusive, interpreta uma personagem não binária nos novos episódios de "Sex And The City", "And Just Like That") já declararam publicamente que não se reconhecem dentro do espectro tradicional de gênero.

Por não se identificarem nem como homem nem como mulher, sujeitos não binários preferem utilizar uma linguagem neutra para se comunicar. Por isso, quando Jackson usou o termo "linda", no feminino, para elogiar Cal, não agradou. A cena é um bom exemplo de que, ao se relacionar com pessoas que não se encaixam nas definições tradicionais de gênero, descobrir como elas preferem ser chamadas e investir no diálogo é fundamental.

Em respeito a isso, Universa utilizará linguagem neutra nesta reportagem. Em vez de "ele" ou "ela", você lerá "elu". No lugar do "a" e do "o", que concordam com feminino e masculino, será usado "e". Preparades?

A seguir, um pequeno manual para ajudar na hora de paquerar ou namorar uma pessoa não binária. Spoiler: como em qualquer relação amorosa, respeito é a chave do sucesso.

Eu, tu, elus

Brune (à dir.) é não binárie; elu vive com Douglas (à esq.), que está passando pela transição de gênero - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Brune (à dir.) é não binárie; elu vive com Douglas (à esq.), que está passando pela transição de gênero
Imagem: Arquivo Pessoal

Brune Bonassi, 29 anos, se reconhece como uma pessoa não binária desde 2015. "Naquele ano, eu tinha começado a hormonização para mudar de gênero, mas, como não gostei da ideia de ter pelos, parei de tomar remédio. Então, conheci a definição de não binárie e percebi que me identificava com ela."

A descoberta significou, segundo Brune, um grande alívio. "Tirei um peso das costas. Antes, sofria de disforia de gênero, que é quando você tem crises de ansiedade por não se reconhecer no próprio corpo."

Hoje, Brune é casade com Douglas, uma pessoa não binária que está fazendo hormonioterapia feminilizadora. No passado, porém, viveu algumas experiências românticas malsucedidas. "Teve uma pessoa que insistia em me chamar de mulher, e aquilo me magoou muito. Mesmo que eu seja uma pessoa mais alinhada à feminilidade, eu sou não binárie, não sou mulher."

Por isso, o diálogo e a compreensão são tão importantes ao se relacionar com não bináries.

A primeira coisa que você deve fazer para um não binárie é perguntar com quais pronomes elu se identifica. Isso já pode funcionar como uma cantada.

Brune Bonassi

Sexo com não bináries

Caluã Eloi se identifica como uma pessoa não binária - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Caluã Eloi se identifica como uma pessoa não binária
Imagem: Arquivo pessoal

Caluã Eloi, 29 anos, produtore cultural, passou pela transição de gênero e hoje se identifca como pessoa trans não binária. "Eu tive o privilégio de poder pedir para a minha mãe escolher meu novo nome de registro. Caluã significa filho da lua", diz, emocionado.

Elu usa todos os pronomes, é mais alinhade à masculinidade e assexual —romanticamente, porém, se sente atraído por mulheres.

Tal como aconteceu com Brune, Caluã também já sofreu com a incompreensão de parceiros românticos. "Durante algum tempo, namorei uma pessoa que insistia em dizer que era lésbica. Toda vez que ela reafirmava a orientação sexual dela e se dizia atraída por mulher, o meu gênero era negado. Hoje, considero isso uma violência emocional", comenta.

Ao lembrar do relacionamento abusivo que viveu, reforça a importância de respeitar a escolha de gênero de outre. "Eu já sofri discriminação por causa de raça, pelo fato de eu ser assexual, pela minha não binariedade... Isso por muito tempo acabou com a minha autoestima e fez com que eu não conseguisse romper o ciclo de relações abusivas."

Para elu, é importante desmistificar o tema. "Pessoas não binárias não são fadas. Somos seres humanos e, para se relacionar com um ser humano, é necessário ter diálogo e respeito. Há coisas de que a gente gosta, outras não. Por exemplo, quando você conhece alguém na internet, a primeira coisa que você faz é perguntar do que ela gosta. Com a gente é igual."

Conversar é o primeiro passo para o relacionamento dar certo, perguntar do que elu gosta, onde prefere ser tocade, como quer ser chamade... É igual acontece em um namoro heteronormativo.

Caluã Eloi