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Samara Felippo: 'Amigas perderam papéis ao negar sexo'. Houve assédio?

Júlia Flores

De Universa

06/12/2021 13h53

A atriz Samara Felippo, de 43 anos, fez um desabafo sobre casos de assédio sexual que viveu e presenciou nos bastidores da televisão. "Hoje eu olho para trás e vejo os abusos que passei. Machismo... Coisas que a gente nunca enxergou na época. Vejo amigas que perderam papéis porque não transarem com o diretor", disse ela, durante gravação do podcast "Mais Que 8 Minutos", comandado por Rafinha Bastos.

Samara já participou de novelas tanto na Globo quanto na Record. Na conversa, ela não revelou em que produções os assédios ocorreram. "Teve um lugar [emissora] em que eu tentei conseguir o papel da protagonista e me negaram dizendo que eu não tinha cara de virgem. E virgem tem cara?", questionou a artista.

Isabella Del Monde, advogada especialista em direitos das mulheres e colunista de Universa, explica que a legislação brasileira define como assédio sexual a situação em que se constrange a outra pessoa para obter algum tipo de "vantagem ou favorecimento sexual". Os casos são marcados, também, por uma relação de hierarquia, ou seja, o assediador está um cargo acima da vítima, justamente porque assim pode coagi-la.

Na opinião da especialista, nos casos descritos por Samara foi cometido esse crime, que ocorre com frequência contra mulheres de diversas outras áreas. Um estudo publicado em 2020 e feito pelo LinkedIn, em parceria com a consultoria Think Eva, mostrou que 47% das mulheres já sofreram assédio sexual no trabalho. E, entre as queixas mais frequentes, o primeiro lugar foi justamente para casos de "solicitação de favores sexuais" em troca de manutenção do emprego ou promoção: 92% das mulheres vítimas de assédio disseram ter passado por essa situação específica.

Assédio sexual não precisa ter contato físico

A atriz conta que, apesar de não ter perdido nenhum papel por conta das ameaças, foi vítima de outros tipos de abuso. "É um buraco que a gente vai se enfiando. É uma mão na coxa em um jantar, depois um 'Vem cá, vamos conversar só eu e você'", relatou. Os casos podem envolver situações em que há contato físico, como tentativa de beijo, mas podem também ser comentários ou ameaças veladas, como nos casos relatadas por Samara.
"O exemplo clássico é a exigência de um chefe à empregada de que se relacionem sexualmente, sob pena de demissão, caso a vítima se recuse", explicou a promotora de Justiça Mariana Seifert Bazzo, do MPPR (Ministério Público do Paraná), coautora do livro "Crimes Contra Mulheres", em entrevista a Universa.

Denunciar agressor para a empresa empresa também é importante

A advogada Del Monde recomenda que, em episódios de assédio, a primeira atitude que a vítima deve tomar é procurar ajuda jurídica para receber orientações legais a respeito do assunto. "Denúncia ao canal de recursos humanos da empresa também é bem importante porque isso pode resultar na responsabilização do assediador, levando até a sua demissão", explica a advogada.

Por se tratar de um crime prescrito no Código Penal, as vítimas de assédio podem, inclusive, fazer boletim de ocorrência para que o episódio seja investigado. Se o crime for comprovado, a detenção para o abusador varia entre um a dois anos.

"Abusador dá a entender que domina, mas é manipulação", diz psicóloga

Para a psicóloga e psicanalista Lais Sellmer, o fato de Samara só ter feito as denúncias de assédio anos mais tarde pode ser explicado pelo "medo" de ser desacreditada.

"Sabemos que a gente vive em um cenário delicado economicamente e muitas mulheres precisam alimentar seus filhos; por isso, às vezes, elas não conseguem enxergar saída a uma situação", comenta a psicóloga, que faz uma orientação para casos como esse: "O abusador vai dar a entender que te domina, mas não é verdade. Ele só está te manipulando."

No nosso país, infelizmente, muitas mulheres ainda são desacreditadas quando fazem uma denúncia dessas - Lais Sellmer, psicóloga e psicanalista

Receber — e fornecer — apoio de amigas e de pessoas próximas também é importante para que a vítima saia de uma situação de abuso. "A cultura do assédio e da culpabilização da mulher está muito inserida no nosso inconsciente coletivo. A dinâmica permeia nossas relações, por isso as mulheres precisam se fortalecer umas às outras".

Fora isso, a profissional também orienta que a vítima de assédio busque ajuda psicológica após o trauma. "Ela precisa entender que a culpa não é dela", finaliza.

Como conseguir ajuda

Mulheres que estejam sofrendo violência de gênero ou conheçam uma vítima que passa por isso podem procurar ajuda por meio do Ligue 180, Central de Atendimento à Mulher, criado pelo governo federal, que dá orientação de especialistas e encaminhamento para serviços de proteção e auxílio psicológico. Funciona em todo o país e no exterior, 24 horas por dia. A ligação é gratuita. Também é possível acionar esse serviço pelo Whatsapp. Neste caso, o telefone é (61) 99656-5008.

Especialistas orientam que, se a violência for sofrida por um funcionário da empresa ou dentro do trabalho, é importante também denunciar o caso para o canla de recursos humanos.

Se a intenção for fazer uma denúncia de assédio sexual na delegacia, é possível registrar um boletim de ocorrência, pois se trata de um crime existente no Código Penal.