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Elas são virgens e relatam dificuldade para iniciar vida sexual na pandemia

Sem sair de casa por causa do isolamento social, elas não encontram parceiros para transar - Getty Images
Sem sair de casa por causa do isolamento social, elas não encontram parceiros para transar Imagem: Getty Images

Júlia Flores

De Universa

14/06/2021 04h00

Não é novidade que a geração millennial é mais conservadora que as anteriores quando o assunto é sexo. Um estudo da Universidade de Londres mostrou que, em 2018, um em cada oito jovens ainda era virgem aos 26 anos.

Se antes o principal impeditivo para essa geração iniciar a vida sexual era o medo de criar intimidade com outra pessoa, em 2021, parece que a pandemia se tornou elemento chave.

"Os millennials já começam a transar mais tarde e, agora, por causa do isolamento social, a idade média para a primeira transa deve aumentar. Basicamente, eles perderam dois anos", comenta Ana Canosa, sexóloga e colunista de Universa. Para ela, os jovens dessa geração encaram o sexo de um jeito diferente e, para as mulheres, poder escolher quando e com quem quer transar pode soar como um sinal de empoderamento feminino.

"Hoje estamos mais livres para dizer não, de dizer: 'Não estou a fim de transar nesse momento, no momento que eu quiser vai rolar'. Na geração passada, a pressão do homem sobre o corpo feminino era maior, elas se sentiam obrigadas a fazer sexo para agradar o parceiro", opina Ana.

Universa conversou com três mulheres entre 24 e 25 anos que são virgens. O isolamento social e a quarentena afetaram diretamente o início de suas vidas sexuais, afirmaram as entrevistadas. "Em 2020, fiz planos de sair da minha zona de conforto e de me colocar em situações que talvez eu pudesse conhecer novas pessoas. De repente, chegou a pandemia", conta Maria Clara*. Confira o relato completo delas a seguir.

"A pandemia atrapalhou meus planos"

"Sexo não é tabu pra mim, eu me masturbo e tenho até um vibrador", conta Rafaella*, 25 anos, jornalista - Getty Images - Getty Images
"Sexo não é tabu pra mim, eu me masturbo e tenho até um vibrador", conta Rafaella*, 25 anos, jornalista
Imagem: Getty Images

"Eu nunca namorei sério, o máximo que 'fiquei' com alguém foi por um mês. Não tenho facilidade em me apaixonar. Tenho amigas que cada semana tem um crush diferente, mas eu não sou assim. Durante muito tempo eu falei que namorar não era para mim, mas hoje em dia eu quero um mozão.

Tanto é que, em 2020, antes de a pandemia começar, estava me esforçando para sair e conhecer pessoas novas, apesar de detestar festa —na faculdade, por exemplo, eu não frequentava baladas nem eventos universitários.

O que eu precisava era sair dessa zona de conforto, mas a pandemia atrapalhou meus planos. Sou péssima de conversar por aplicativo, o que dificulta ainda mais a azaração nessa fase que vivemos.

Sexo não é tabu pra mim, eu me masturbo e tenho até um vibrador

Tem a galera que julga e tem outra que fala naturalmente sobre o assunto: 'É muito bom, você devia fazer'. Eu gosto de conversar sobre o tema, apesar de não ter experiência.

Não gosto de falar em público sobre a minha virgindade, porque as pessoas julgam. Algumas até olham para mim com um olhar de pena, como se fosse um fardo. Sei que têm homens que não vão querer ficar comigo porque eu sou virgem. Vão ter dificuldade, achar estranho.

Claro que na hora 'H' eu vou falar com o meu parceiro, até para ele não estranhar. A única coisa que espero é que a primeira vez seja confortável. Minha ginecologista já deu dicas e disse que o segredo para não doer é estar 'bem molhadinha'. Quero que seja uma experiência gostosa.

Não idealizo nada, não tenho sonhos, grandes expectativas. Quero que seja uma coisa normal. Às vezes, ficamos esperando que as coisas simplesmente 'rolem', que no trabalho apareça um colega novo, lindo, maravilhoso, e não é bem assim. Isso não vai acontecer. Por isso, quando a pandemia acabar, quero voltar com o plano de sair mais. Quanto mais demora, pior fica"

Rafaella*, 25 anos, jornalista

"É muita pressão externa"

Jovens reclamam da pressão para perder a virgindade - Getty Images - Getty Images
Jovens reclamam da pressão para perder a virgindade
Imagem: Getty Images

"A gente está acostumada a ouvir histórias de pessoas que perdem a virgindade cedo e todo mundo fala que isso vai acontecer naturalmente, mas eu cheguei à conclusão de que não vai ser assim para mim. Se eu não fizer alguma coisa, eu não vou transar.

Há algum tempo, eu não ligava para o campo amoroso. Quando eu tinha 21 anos eu pensava: 'Ah, tudo bem perder um pouco mais tarde'. Acontece, sabe? Mas agora que eu estou com 24, me dá ansiedade só de pensar no assunto. Nunca tive um relacionamento sério, só fiquei com pessoas por um dia. Foi uma das coisas que me levaram a buscar terapia.

Já pensei na possibilidade de ser assexual, mas hoje eu desconsidero a ideia. Costumo me masturbar. Tenho libido, me toco constantemente

Em 2019, decidi que sairia mais. Coloquei a meta de cada final de semana sair com um amigo diferente. Percebi que estava dando mais rolê, conhecendo gente nova. Logo que me formei, recebi uma proposta de trabalho remoto, lembro de ter falado com as minhas amigas: 'Não vou considerar muito esse trabalho porque quero ir para um lugar onde possa conhecer pessoas novas, apesar de eu ser tímida'. Queria sair da zona de conforto. É até irônico porque hoje estamos todos de home office, só conheço as pessoas do meu trabalho por chamada de vídeo.

Tinha feito planos de em 2020 me colocar em situações que talvez eu pudesse conhecer mais gente, mas o isolamento social me impediu. Sou muito ruim de aplicativo, de manter conversas on-line. Já tentei usar app, mas não funciona para mim, ainda mais porque eu moro em Rio Branco, no Acre.

É uma nuvem que ronda a cabeça. Tenho a sensação de que todo mundo sabe, todo mundo fala. Às vezes, questionam se eu sou lésbica, por exemplo, para tentar descobrir porque eu nunca namorei

Já cogitei, na brincadeira, contratar um garoto de programa, mas o ideal seria perder com um cara que também é virgem, porque é uma situação em que ambos estão iguais. Eu vivo constrangida, é difícil falar para o parceiro que eu sou virgem. Os homens sentem medo.

Foram dois anos desperdiçados na minha vida, que eu poderia estar transando. Se eu soubesse que a pandemia ia chegar, eu teria me virado para transar antes, para tirar esse peso de cima de mim

Estou determinada. Acredito que o mundo pós-pandemia vai ser louco. Vou esperar a pandemia acabar para fazer sexo. Claro, vou me vacinar primeiro, não sou irresponsável."

Maria Clara*, 24 anos, designer de sites

"Quando o isolamento acabar, quero tirar o atraso"

"Eu, pessoalmente, não me cobro para transar. Sou tranquila com isso e não me pressiono. Só às vezes penso que estou perdendo experiências e que poderia estar me divertindo", diz Camila*, 25 anos, administradora - Getty Images - Getty Images
"Eu, pessoalmente, não me cobro para transar. Sou tranquila com isso e não me pressiono. Só às vezes penso que estou perdendo experiências e que poderia estar me divertindo", diz Camila*, 25 anos, administradora
Imagem: Getty Images

"Sou tímida e é difícil eu me conectar com alguém, acho que por isso que nunca namorei. Não me sinto confortável em sair e transar com um desconhecido que peguei na balada, tem que rolar um envolvimento maior. Pessoalmente, não me cobro para transar. Sou tranquila com isso e não me pressiono. Só às vezes penso que estou perdendo experiências e que poderia estar me divertindo.

Eu sempre me esforcei para sair mais, para conhecer pessoas interessantes, etc. Acontece que, no final das contas, eu gosto e prefiro ficar em casa. Em 2020, tinha como meta encontrar novos crushes, mas o isolamento estragou tudo.

Sorte que sou desencanada. Eu não quero colocar tanta pressão no meu primeiro sexo. Procuro alguém que me faça sentir confortável, que faça as coisas fluírem. Não tenho nenhum plano, não idealizo o momento. É claro que sinto uma cobrança social, mas não no meu círculo de amizades. Tenho várias amigas que transaram mais tarde inclusive.

Não tenho problemas com o meu corpo, me masturbo e tenho dois vibradores - um bullet e um sugador de clitóris. A gente se vira como pode... Sei que é importante me conhecer, até para saber como me dar prazer no momento do sexo. Sou bem resolvida

Eu uso Tinder, mas ele está meio aposentado, porque não tenho coragem de sair com alguém novo agora, durante a pandemia. Mas depois do isolamento eu quero 'tirar o atraso' — não sei se é isso que vai acontecer de fato, mas é o que planejo."

Camila*, 25 anos, administradora

Ser virgem não é ser careta

A sexóloga Ana Canosa dá dicas para a primeira relação sexual: "Procure alguém que você confie, porque se chegar no momento e você quiser desistir, ela vai ter que entender. Tem que ser estabelecida uma relação de confiança. Fazer em um lugar com privacidade, que ninguém precise fazer correndo".

Na opinião dela, conhecer o próprio corpo e as áreas erógenas dele também é importante, como é o caso das entrevistadas. "É legal que elas vão chegar na hora 'H' com um dicionário próprio de satisfação sexual, já sabendo do que gostam ou não, o que é ter prazer, até para falar para a outra pessoa", comenta.

Nenhuma das entrevistas aceitou aparecer com seu nome por medo do julgamento alheio, essa cobrança social é criticada por Ana. "Antes tinha que ser virgem, agora não pode. Temos que ter cuidado para não agir de maneira preconceituosa com quem escolhe ter uma iniciação sexual tardia. Hoje as pessoas não se obrigam a fazer sexo como se obrigavam no passado. Hoje elas são mais livres para escolher o próprio caminho, inclusive para dizer não. Quantas pessoas transaram sem querer? Quantas foram levadas a transar por medo de perder o relacionamento? Ou para serem amadas? Os tempos mudaram."

*Os nomes foram trocados a pedido das entrevistadas