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Amigas acusam motorista de app por intolerância: "Com roupa de santo, não"

Discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional pode resultar de um a três anos de reclusão - João Alvarez/UOL
Discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional pode resultar de um a três anos de reclusão Imagem: João Alvarez/UOL

Luiza Souto

De Universa

11/06/2021 11h50

Duas amigas acusam um motorista de intolerância religiosa após terem sido deixadas "no meio da rua", ontem, no Rio de Janeiro. Uma delas, a universitária Bruna Castro, 19, conversou com Universa e disse que já fez um boletim de ocorrência.

O caso foi parar nas redes. A manicure Gabriella Ferreira, de 19 anos, escreveu na sua conta que o motorista afirmou que ela e Bruna estavam com "roupa de santo", e que daquela maneira elas não ficariam em seu carro. "Falou que não podíamos nem encostar a nossa bolsa no carro dele, acelerou, deixando a gente na rua!", escreveu Gabriella num trecho.

A empresa 99 respondeu na rede social que "nenhuma forma de preconceito é tolerada", e informou que bloqueou o perfil do motorista e procurou Gabriella "para acolhimento".

"Na 99, o respeito mútuo é obrigatório, por isso, não importa a religião ou credo, todos devem ser bem tratados", escreveu a empresa. Após a publicação da reportagem, a empresa enviou nota a Universa sobre o ocorrido.

Bruna conta que toda quinta-feira ela e Gabriella vão ao barracão que frequentam em São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro. E ontem, assim que o motorista chegou, sua amiga pediu para colocar as bolsas de roupas que estavam segurando no porta-malas do carro, mas ele teria respondido que "a mala estava ruim". Ainda sugeriram colocá-las no chão do veículo, mas ele teria recusado.

"E depois [da negativa] falou que mandaria outro motorista nos buscar, porque 'no meu carro vestidas assim vocês não entram. Nem suas bolsas quero que encostem aqui'", relatou Bruna, reproduzindo a frase do homem. A universitária relata ainda que o motorista saiu andando com o carro enquanto falava, e acelerou ao acabar.

Bruna, que afirma nunca ter sofrido intolerância religiosa, conta que as duas amigas decidiram relatar o que ocorreu por mensagem, dentro do aplicativo. Mas como não receberam retorno na hora, publicaram a história nas redes.

"A 99 enviou uma mensagem [pelo Twitter] para a Gabriella informando o número da central. Ligamos nesta sexta de manhã, e desligaram quando relatamos o ocorrido. Nossa intenção não é prejudicar a empresa, e sim que alguém 'pare' esse motorista, para que ele não faça o mesmo com mais ninguém".

Intolerância religiosa é crime

Discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional pode resultar de um a três anos de reclusão e aplicação de multa, conforme determina a lei. Mesmo assim, entre janeiro de 2015 e o primeiro semestre de 2017, o Brasil registrou uma denúncia de intolerância religiosa a cada 15 horas, segundo o extinto Ministério dos Direitos Humanos.

Os números fizeram o Brasil ser denunciado, pela primeira vez, na Corte Interamericana de Direitos Humanos por omissão do Estado em relação a esse fato, em 2017.

A Universa, o advogado Hédio Silva Jr, um dos principais defensores da causa no país, disse que "o Brasil vive a era do ódio".

"E o discurso do ódio religioso, fomentado diariamente por programas religiosos transmitidos, impunemente, por longas horas nas TVs e rádios", disse à época da denúncia.

Atualmente, segundo pesquisa Datafolha de dezembro de 2019, os católicos são 50% da população brasileira. Os evangélicos, 31%, e os adeptos de religiões de matriz africana 2%.

99 diz que está disponível para colaborar com as investigações

Em nota, a 99 confirma afirma que está disponível para colaborar com as investigações da polícia. Leia o texto na íntegra.

A 99 recebeu, por meio das redes sociais, o relato grave da passageira Gabriella Ferreira, que teve a sua corrida negada por um motorista da plataforma. Assim que tomamos conhecimento, realizamos um bloqueio no perfil do condutor e mobilizamos uma equipe para oferecer todo o acolhimento e apoio necessários para ela. Estamos disponíveis para colaborar com as investigações da polícia.

Esclarecemos que o respeito mútuo é a base de tudo e é obrigatório para utilização do app. Na nossa comunidade, há espaço para as diferenças de raças, gênero, religião, orientação sexual, identidade de gênero, idade, classe social, local de moradia, entre outras.

Isso significa que todos os usuários, motorista ou passageiros, devem se tratar com educação, independentemente de sua religião ou credo. Por isso, a plataforma orienta condutores parceiros a não recusarem uma viagem por conta de alguém estar vestido de forma a expressar sua crença, por exemplo.

Durante a corrida, o condutor também deve combinar com o passageiro qual música vai tocar no trajeto. Isso vale para vídeos ou gravações de cultos e canções religiosas, seja no rádio ou no celular. Caso o usuário se sinta desconfortável com algum comportamento, pode ativar a gravação de áudio em qualquer momento da corrida. O áudio é guardado com o aplicativo e pode ser usado em investigações das autoridades, nos termos da legislação aplicável.

Motoristas e passageiros que tenham vivenciado esse tipo de experiência, devem reportar o caso para a empresa, por meio do app ou pela central de segurança pelo número 0800-888-8999, que funciona 24 horas por dia e 7 dias por semana. Após o recebimento da denúncia, a 99 tomará as medidas necessárias, com bloqueios, apoio às investigações e demais procedimentos previstos no nosso Guia da Comunidade e Termos de Uso.