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"Precisava continuar viva", diz mãe que perdeu filha há 10 anos em Realengo

Adriana perdeu a filha Luiza, de 14 anos, no crime que ficou conhecido como massacre de Realengo - Acervo pessoal
Adriana perdeu a filha Luiza, de 14 anos, no crime que ficou conhecido como massacre de Realengo Imagem: Acervo pessoal

Ana Bardella

De Universa

07/04/2021 14h37

Há exatamente uma década, Adriana Silveira, de 50 anos, passava pelo momento mais conturbado de sua vida. Na manhã do dia 7 de abril de 2011, ela estava em casa com a filha, Luiza Paula, de 14 anos, e iria acompanhá-la até a Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro de Realengo, no Rio de Janeiro. No caminho, notou que a roupa estava com uma mancha e decidiu voltar para casa, para se trocar. Pediu que a filha fosse na frente. Minutos depois, percebeu nas ruas do bairro uma movimentação estranha, pessoas agitadas e correndo. Perguntou a um conhecido o que estava acontecendo e foi então que soube: um homem armado havia invadido o colégio.

Luiza Paula estava na 8ª série quando o crime aconteceu - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Luiza Paula estava na 8ª série quando o crime aconteceu
Imagem: Acervo pessoal

"Pelo amor de Deus, minha filha está lá dentro", foi o que respondeu. Mas, até aquele momento, não entendia a gravidade da situação. "Não consegui entrar na escola, então começou minha batalha para encontrar a Luiza. Pensei que ela poderia ter ido para a casa da minha mãe, que é próxima da escola, mas isso não aconteceu. As informações dos vizinhos eram desencontradas, então não tinha noção do que tinha acontecido. Pensava que alguma criança poderia ter sido ferida, mas só. Até que ouvi os gritos", relembra.

Os gritos de desespero ao qual Adriana se refere vieram de uma casa vizinha: quando Maria José Dumont recebeu a notícia de que a filha Laryssa Martins havia sido assassinada.

Se eu fecho os olhos, ainda posso ouvir esses gritos. Foi a partir dali que me bateu um desespero. Mais de duas horas depois, no hospital, soube que o mesmo tinha acontecido com a minha filha"

Luto e acolhimento

O crime, que chocou o Brasil e teve repercussão mundial, foi cometido por Wellington Menezes de Oliveira, de 23 anos. Ele era ex-aluno da escola, invadiu salas de aula cheias de alunos, matou 12 jovens e deixou mais 22 feridos. Antes de ser pego pela polícia, cometeu suicídio. Há indicações de que o assassino enfrentou situações de bullying na infância.

Desde então, a vida de Adriana mudou completamente. "Antes, eu era uma dona de casa feliz. Casada, com dois filhos, trabalhava com autônoma. Era realizada. Mas, desde que tudo aconteceu, nada foi igual", avalia.

Seu luto foi sentido coletivamente. Ao mesmo tempo em que as famílias viviam um momento de mudanças íntimas e profundas, eram procuradas pela imprensa e por e grupos de apoio. "Tudo correu muito rápido, nem consigo me lembrar direito. Os jornalistas ficavam dia e noite nas nossas costas, até que em determinado momento isso amenizou, mas a verdade é que nunca deixamos de ser procurados", diz.

No fundo, sinto gratidão a todos que choraram, enviaram mensagens de carinho, foram solidárias e sofreram conosco. Eu sou resposta de muitas orações, orações de muitas religiões, de pessoas que eu nem tive a oportunidade de conhecer. Se estou de pé hoje, é graças a esse carinho coletivo"

Combate ao bullying nas escolas

O tempo fez com que os laços com as outras famílias, de vítimas e sobreviventes, se estreitassem. "Percebemos que entendíamos as dores uns dos outros. Falar do luto era importante, mas também precisávamos falar de esperança. Desejávamos ver algo mudar em nome dos que se foram", explica. Foi dessa vontade que nasceu a Associação dos Anjos de Realengo, da qual Adriana é presidente.

"Eu precisava de alguma coisa para continuar viva, caso contrário não daria conta daquela dor. Então, passei a lutar por melhoria nas escolas: faço palestras e rodas de conversas contra o bullying, um trabalho de prevenção com nossos jovens e adolescentes. A morte dessas crianças não pode ter sido em vão", afirma.

Uma das conquistas da organização, da qual Adriana se orgulha, é a lei 13.277/2016, que institui 7 de abril como o Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola e estimula debates sobre o tema nas instituições de ensino.

Na sua opinião, é um passo importante, mas ainda existem muitos outros a serem dados. "É preciso que o corpo docente tenha estrutura para fazer um bom trabalho e que os alunos se sintam acolhidos. Precisa haver um psicólogo dentro das escolas para que as crianças sejam orientadas. Se uma tragédia como essa volta a acontecer, como aconteceu em Suzano, significa que as autoridades não aprenderam nada com o passado", opina.

Apesar da dor, Adriana é esperançosa com relação ao futuro e alega ter aprendido muito na última década. "Aprendi que o amor é muito maior do que o ódio e que nós somos capazes de fazer grandes mudanças", conclui.