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Gêmeas trans que fizeram cirurgia inédita de mudança de sexo recebem alta

As gêmeas Sofia Albuquerck (à esquerda) e Mayra Phoebe, 19 anos - Arquivo pessoal
As gêmeas Sofia Albuquerck (à esquerda) e Mayra Phoebe, 19 anos Imagem: Arquivo pessoal

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

28/02/2021 16h07

As gêmeas Mayra Phoebe e Sofia Albuquerck, de 19 anos, que fizeram a cirurgia de redesignação sexual em Blumenau (SC) há mais de duas semanas, receberam alta. Elas chegaram hoje na casa da família em Tapira, em Minas Gerais. As gêmeas trans são consideradas as primeiras no mundo a passarem juntas pelo procedimento.

De acordo com a equipe médica liderada pelos cirurgiões José Martins e Cláudio Eduardo de Souza, as pacientes chegaram um dia antes da cirurgia e precisaram permanecer em Blumenau por 14 dias em observação depois da cirurgia. Nenhuma delas apresentou qualquer reação adversa ao procedimento.

Ambas nasceram com o sexo biológico masculino e realizaram o sonho de redesignação sexual com ajuda da família que apoiou a decisão das gêmeas desde a adolescência, quando iniciaram o tratamento hormonal.

As gêmeas serão acompanhadas a partir de agora por meio de consultas por telemedicina, em intervalos de até 40 dias. Mayla cursa medicina na Argentina e Sofia estuda engenharia civil em São Paulo.

Segundo o médico José Martins, o processo agora será de dilatação da neo-vagina criada nas gêmeas.

"Toda neo-vagina criada precisa, para o resto da vida, ser dilatada. Isso consiste na introdução de um bastão de látex por 20 minutos. No início são duas vezes ao dia, mas depois passa para apenas uma vez diária, seguido por um dia sim e um dia não, até chegar ao momento que será somente uma vez por semana para o resto da vida. Essa técnica serve para manter a profundidade e largura", explicou ao Universa.

Martins adiantou que o resultado estético final será entre 18 e 24 meses. Até lá, as gêmeas poderão ter relações sexuais já a partir do terceiro mês após a cirurgia. Não há necessidade de uso de medicação contínua em razão da cirurgia.

"O resultado da estética é imediato, mas ainda tem pontos e apresenta inchaços, que variam ao longo dos dias. Agora o ponto final do visual estético ocorre em até 24 meses para cicatriz ficar imperceptível e os tecidos se remodelarem. Antes disso, as pacientes já gostam do resultado logo na primeira semana só pelo fato de não terem mais o órgão sexual masculino", comentou.

Gêmeas ainda em adaptação

Ao Universa, a gêmea Mayla Phoebe contou que estão caminhando mais para ajudar na recuperação, porém sem esforço pesado em razão de alguns pontos que ainda não caíram da região.

"A gente tem que andar mais, só que sem fazer muito esforço, além da ainda passarmos por dilatação por duas vezes ao dia. Ainda está inchada e devemos cuidar bem e manter sempre limpo", contou.

A jovem lembra que se surpreendeu em relação à adaptação da função urinária. As dores aparecem somente durante a dilatação em razão da cicatrização. Além do cirurgião, ambas também continuarão sendo acompanhadas por psicólogos.

"Foi bem tranquila a adaptação urinária. Assim que retirei a sonda, no sétimo dia, fiz xixi normal e não ardeu, como se eu nunca tivesse tido a sonda antes. Mas ainda estamos aprendendo porque é tudo novo. Eu sinto dores apenas quando faço a dilatação porque é tudo novo e está cicatrizando. Nem chega a ser dor forte, é mais um desconforto mesmo. Pretendemos fazer psicólogos, não apenas pelo pós-cirúrgicos, mas por tudo o que acontece em nosso cotidiano", ratifica.

A cirurgia inédita

O procedimento em Mayla e Sofia é considerado inédito no mundo por ter ocorrido com duas gêmeas trans femininas idênticas e quase ao mesmo tempo, garante a equipe médica, que fez a redesignação sexual no Hospital Santo Antônio, em Blumenau.

As irmãs nasceram com o sexo biológico masculino, e desde os 15 anos iniciaram o tratamento hormonal com anticoncepcional para a transição.

As gêmeas também são as mais jovens brasileiras a mudarem de sexo no país com base na resolução de 2020 do Conselho Federal de Medicina que diminuiu de 21 para 18 anos a idade mínima para a cirurgia.

Os procedimentos das gêmeas tiveram duração de cerca de cinco horas, em cada uma.

A cirurgia nas gêmeas é considerada de caráter estético e funcional em razão de o resultado final se aproximar visualmente com uma vagina e por permanecerem com suas funções sexuais e urinárias. De acordo com a equipe médica, a literatura mostra que apenas 5% das mulheres trans optam por esse procedimento.

"Usamos a técnica de inversão peniana com enxerto de bolsa escrotal. Pegamos a pele do pênis e suturamos a da bolsa escrotal e as colocamos dentro de uma cavidade criada na região do períneo", explicou o médico José Martins, após a cirurgia.