Topo

Jornalista detalha em livro perrengues e alegrias de casar com estrangeiro

A jornalista Liliana Tinoco Backert lançou o livro "Amores Internacionais: casei com um estrangeiro, e agora?" - Divulgação/Ana Maria Steg
A jornalista Liliana Tinoco Backert lançou o livro "Amores Internacionais: casei com um estrangeiro, e agora?" Imagem: Divulgação/Ana Maria Steg

Luiza Souto

De Universa

02/02/2021 04h00

Nascida em Brás de Pina, zona norte do Rio de Janeiro, a jornalista Liliana Tinoco Bäckert trabalhava numa assessoria de imprensa quando conheceu o marido, um alemão que atuava em multinacional no Brasil. Dois anos após o relacionamento engatar ela se mudou com ele para a Suíça, em 2005. Não imaginava tamanho choque cultural. "O mundo é menos mau para os homens", decreta ela antes de listar as dificuldades.

Entre os problemas enfrentados —e que fazem o frio suíço se tornar a alegria de uma carioca—, xenofobia, machismo, poucas vagas no mercado de trabalho, fondue como prato de Natal. "Mas não deixo de levar minha farofa", ela ri, numa tentativa de amenizar o cenário.

Sem achar muita referência bibliográfica, relatos detalhados de brasileiras que deixaram sua cultura para se unir a um estrangeiro e que pudessem ajudá-la a passar pelas adversidades, ela, que é mãe de dois filhos, deu início em 2015 ao livro "Amores Internacionais: casei com um estrangeiro, e agora?", lançado em dezembro de 2020.

A jornalista Liliana Tinoco Bäckert lançou o livro "Amores Internacionais: casei com um estrangeiro, e agora?" - Divulgação/Clara Bäckert - Divulgação/Clara Bäckert
A jornalista Liliana Tinoco Bäckert conta em livro experiência de brasileiras casadas com estrangeiros
Imagem: Divulgação/Clara Bäckert

Nas 448 páginas, Liliana traz entrevistas com cerca de 60 mulheres que têm relacionamento com homens de 19 países diferente como Sérvia, França e México contando como encararam situações de racismo, abusos psicológicos e até tráfico de seres humanos.

Racismo, dificuldade de emprego, xenofobia

Entre os relatos, mulheres com diploma de mestrado e diversas especializações falam da falta de oportunidades. A própria Liliana, que intercala suas experiências com as das entrevistadas, atuava como gerente de comunicação, mas acabou aceitando trabalhar como assistente executiva do vice-presidente de uma multinacional.

"Nós, mulheres, já pertencemos a uma categoria minoritária, e aí você vira migrante e mais uma vez está em desvantagem. E você vem do terceiro mundo, então parece que perdemos o nosso status, porque nossas universidades não são reconhecidas, a União Europeia dá preferência para dar emprego para quem é dali. Fora que o pessoal vai sempre olhar a brasileira como prostituta, atrasada."

Se consegue uma posição importante, vem aí outras barreiras a serem quebradas. Uma das entrevistadas, identificada como Letícia, formou-se na USP e dá aula de diversidade numa universidade da Suíça. Numa triste ironia, ouviu ali um pedido para colocar uma roupa mostrando menos a pele durante o verão.

"Ela me contou que sua cor incomoda. E lembrou de um caso em que outra pessoa virou para o marido dela e comentou: 'Nossa, ela é preta mesmo'."

Conselhos para evitar abusos no exterior

Liliana diz que até aprender alemão e concluir o mestrado, dependeu financeiramente do marido por cerca de dois anos. E repetiu para ela mesma por um bom tempo que queria "ir embora amanhã". Mas o apoio da família a permitiu seguir.

"A mulher tem que ficar de olho se há incentivo para aprender o idioma, a estudar. Acho que isso é um dos maiores indicadores de que este homem quer que você seja independente ou não. Outra dica é procurar se informar sobre as leis do país, porque ela é bem clara: o dinheiro é do casal. Por fim, não dê seu passaporte na mão de ninguém", aconselha.

Foi na Suíça que Liliana se deparou com crimes pesados como tráfico de pessoas, com mulheres que deixaram suas casas sonhando com um casamento de conto de fadas, mas tiveram seus documentos tomados pelos parceiros e obrigadas a se prostituir. Outras, por causa dos filhos, viviam praticamente encarceradas.

"Vale a pena seguir seu amor", diz ela

Mas entre relatos angustiantes, muitas histórias inspiradoras, de mulheres que mal tinham o que comer e ganharam o mundo, se tornaram grandes profissionais, realizaram o desejo da maternidade. Ela mesma fala que apesar das discordâncias culturais, saudade e solidão —as pessoas não te chamam para tomar um café na casa delas, não consegue eleger muitos lados negativos de sua escolha.

"Deve ser porque vale a pena seguir seu amor", pondera. É sobre saber seguir em frente, ensina, ao exemplificar sua experiência de fim de ano. "No Natal, eles fazem fondue. Ua vez falei para meus sogros: 'eu vou passar o Natal aí, mas vou levar minha comida', e fiz picanha, farofa, salada e maionese. Não foi um desrespeito. É um pedacinho da minha cultura, que não abro mão."

"Aprendi que há ritos importantes para nossa cultura, não para a deles. E quando você entende isso, compreende que não é contra você, e meio que ignora. É saber manejar, e se orgulhar de quem você é. Se fala muito alto, pode baixar um pouco o tom, mas ser você mesma. Não tem cultura melhor que ninguém. Somos únicos. Acho sacanagem o cara casar com uma brasileira e querer que ela seja uma nativa ou o contrário. Não pode."