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Após vencer câncer, cabeleireira raspa o cabelo para apoiar amiga doente

Luzia, à direita, decidiu raspar o cabelo depois de cortar os fios de Joana - ARQUIVO PESSOAL
Luzia, à direita, decidiu raspar o cabelo depois de cortar os fios de Joana Imagem: ARQUIVO PESSOAL

Júlia Flores

De Universa

13/01/2021 04h00

"Só quem viveu a experiência de um câncer sabe descrever o que se passa na cabeça da gente", diz a cabelereira Luzia Estelita de Barros. A pernambucana de 56 anos decidiu cortar os próprios fios depois de raspar o cabelo de uma amiga, Joana Darc Alves, 60, que está tratando um nódulo maligno na mama. O vídeo que captura a cena viralizou na internet e agora a caixa de mensagem de Luzia, e do seu salão, não param de receber textos de agradecimento e apoio.

"O cabelo da gente volta. O mais importante é mantermos a fé"

Luzia passou pela doença há cerca de 6 anos. "Fiz masectomia total. Retirei a mama direita, passei por todo o processo. Acho minha história muito linda, na verdade. Tinha acabado de me separar após 28 anos de casamento e durante o tratamento encontrei um novo companheiro, e é uma pessoa que estou junta desde então. Fico muito contente por ter vencido essa luta com ele", compartilha em entrevista para Universa.

Já Joana descobriu o câncer no ano passado, em 2020. Após iniciar o tratamento de quimioterapia, começou a perder os fios. Foi quando decidiu, junto com a filha, no último dia do ano, ir até o salão da amiga para raspar a cabeça - o que ela não esperava, porém, era ser surpreendida pela colega. "Quando ela fechou os olhos, que eu tirei o cabelo dela, eu pedi para ela continuar naquela posição e aguardar um minuto. Eu senti o desejo de fazer algo por ela", detalha Luzia.

Quando a Joana abriu os olhos e me viu careca, ela não acreditou. Eu disse: 'Joana, o cabelo da gente, ele volta. O mais importante é mantermos a fé, é preservar a vida.

Tanto a filha de Luzia quanto a de Joana estavam presentes no salão e registraram a cena. Para Luzia, o ato foi de coração: "Chamam isso de empatia. Eu decidi de última hora, porque já tinha passado por aquele processo e sei como é doloroso. A gente vê no cabelo um apego, uma autoestima... você não tem noção o que significa para uma mulher se ver careca. Mas, durante a luta contra um câncer, você só pensa: 'Deus, eu vou me livrar desse cabelo, mas eu quero viver de novo'".

Depois que o vídeo foi publicado na internet, a vida das duas amigas se tornou ainda mais agitada. Várias mensagens de apoio, solicitações de entrevista e até kits de empresas de cosméticos as duas receberam. Luzia comemora o sucesso, mas tem um pé atrás com a hiperexposição de atitudes como essa. "Não gosto muito de divulgar as ações que faço. Trabalho com maior amor do mundo. Quem chega aqui e diz que não tem dinheiro, eu corto o cabelo do mesmo jeito. Faço o bem não em busca de um reconhecimento, mas por saber que eu posso ajudar alguém. Meu salão não é um espaço de trabalho, é um lugar aonde eu posso vivenciar o meu melhor como pessoa e profissional".

Câncer: apoio é fundamental

Quando Luzia enfrentou o câncer, porém, ver um lado positivo na vida se tornou algo difícil. Ela conta que, durante o tratamento, chegou a passar imóveis para o filho, fez o próprio testamento e achou que não sobreviveria à doença. "Esse é o sentimento que o câncer te dá: que você não vai vencer ele".

Depois da doença a gente passa a valorizar mais a vida e as pessoas. Passa a ter mais amor próprio, mas de uma forma muito altruísta. Quando a gente vê uma amiga que vai passar pelo mesmo processo, no tempo dela, da forma dela, com a experiência dela, a gente só quer dizer: 'Amiga, tenha fé, você vai vencer'.

Luzia lembra que, nessa mesma época, outras três amigas também enfrentaram a doença. Duas delas morreram. Apesar disso, ela é otimista sobre o futuro: "É possível vencer a doença, minha história e da Joana são comuns, mas a gente precisa de apoio, tem que ter muita vontade de viver. A Joana acreditou no meu sacrifício, ela acreditou no que eu fiz para ela. Ela disse: 'Luzia, você me deu a certeza de que vou me curar'. Eu disse 'eu creio, agora você tem que crer'. Ninguém pode salvar ninguém, mas a gente tem que salvar a gente mesmo", completa a cabeleireira.