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"Decidi ficar careca e estou me sentindo maravilhosa"

Carol Vilariça  - Acervo Pessoal
Carol Vilariça Imagem: Acervo Pessoal

Carol Vilariça em depoimento a Ana Bardella

De Universa

10/01/2021 04h00

Ainda me lembro da primeira vez que eu raspei a cabeça: eu tinha 16 anos, estava com o cabelo curtinho e decidi passar a máquina seis, em casa mesmo. Foi um ato de pura rebeldia, mas a sensação foi maravilhosa.

Eu tinha medo de ficar feia. Só que, quando me vi no espelho, me surpreendi com o quanto me achei bonita.

Apesar da sensação boa, depois disso, acabei deixando o cabelo crescer. Minha vida foi se transformando: casei e fui morar na Irlanda para fazer um curso de maquiagem. O problema é que não me sentia feliz longe do Brasil. Não gostava do clima, não me adaptei à vida de lá.

Já sofria de depressão e a doença foi piorando. Com isso, minha autoestima foi afetada. Passei a não gostar das minhas roupas, do meu estilo e também do meu cabelo. Liso ou cacheado: não importava o que eu fizesse, estava sempre insatisfeita com ele.

Então, aos 22 anos, adotei novamente o cabelo curtinho. Mas ele durou poucos dias. Um dia, em casa, peguei a máquina de barbear do meu marido e raspei no nível quatro. Pensei que pelo menos um dos meus problemas estaria resolvido. Eu estava certa: desde o primeiro momento, adorei o resultado e me senti muito satisfeita.

Carol acha a sensação de raspar a cabeça gostosa, mas se incomoda com as opiniões não solicitadas - Reprodução / Instagram - Reprodução / Instagram
Carol acha a sensação de raspar a cabeça gostosa, mas se incomoda com as opiniões não solicitadas
Imagem: Reprodução / Instagram

A primeira pessoa que me viu assim foi ele. Eu não avisei que rasparia, só fiz e apareci com o novo visual na sala. Apesar disso, ele sabia que poderia acontecer a qualquer momento, uma vez que eu comentava da minha experiência na adolescência e do meu desejo de repetir o ato. Então, ao me ver com a cabeça raspada pela primeira vez, ele riu, como quem diz: "Não é que você fez mesmo?" e ficou feliz por eu ter tido a iniciativa de mudar, já que antes não estava na minha melhor fase.

Depois disso eu já quis deixar crescer mais vezes, mas acabo desistindo depois de três ou quatro dedos. A verdade é que raspar a cabeça se tornou um hobby para mim. Toda vez que eu estou me sentindo entediada, vou lá e faço.

Me sinto refrescada, como se tivesse tomado um banho e ficado mais limpa. Agora, já passo a máquina zero e perdi a conta de quantas vezes raspei. Não penso duas vezes nas consequências porque acho que elas não existem. É só cabelo — e cabelo cresce.

Escuto muitas opiniões não solicitadas. As pessoas acham que tenho cara de ser descolada, quando na verdade sou uma pessoa careta. Ninguém chutaria, por exemplo, que vou na igreja, sou toda certinha. Já passei por várias fases na vida e atualmente sou dona de casa.

O fato de raspar a cabeça não interfere em nada no meu estilo de vida. Mesmo assim, por transmitir a imagem de ser liberal, as pessoas acham que têm liberdade de comentar sobre a minha aparência. Muitas delas me perguntam por que eu cortei e se realmente gosto dele assim.

O modo como lido com esses comentários varia muito de acordo com meu dia. Às vezes respondo de bom humor, outras vezes fico quieta. Ao mesmo tempo, sinto que algumas mulheres têm curiosidade de fazer o mesmo, mas não têm coragem.

Carol se considera careta, mas acredita que transmite uma imagem descolada - Reprodução / Instagram - Reprodução / Instagram
Carol se considera careta, mas acredita que transmite uma imagem descolada
Imagem: Reprodução / Instagram

Elas me perguntam se eu uso shampoo — claro que uso, já pensou lavar a cabeça com sabonete? — ou se tenho algum cuidado específico. Mas querem mesmo saber é como os outros lidam comigo, se me aceitam ou se me acham estranha. Na verdade, deveria ser o contrário. Elas deveriam se preocupar se eu estou feliz assim.

E a resposta é sim: o cabelo é só uma moldura. Não sou maluca, não estou passando por nenhum problema. Só adoro a adrenalina de raspa a cabeça e me sinto muito mais bonita careca.