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"Deixei a roça para ser modelo; profissão me levou ao Japão e à Austrália"

Natália Machado, de 23 anos - Divulgação/Way Model
Natália Machado, de 23 anos Imagem: Divulgação/Way Model

Natalia Machado em depoimento a Mariana Gonzalez

De Universa

21/12/2020 04h00Atualizada em 21/12/2020 11h20

"Quando eu era criança, adorava ter tudo natural e orgânico no quintal de casa. Quero uma alface? Vou lá e pego. Quero um limão? Vou lá e pego. Tudo estava ali, na terra. A gente plantava, via crescer, depois comia. Não precisava ir ao mercado e comprar uma coisa que a gente não sabia a origem. Essa foi minha maior dificuldade quando cheguei a São Paulo. É tudo muito caro e tem que ter dinheiro na mão até para comprar fruta, coisa que até então eu tinha de graça, direto do pé.

Eu nasci em Abadia dos Dourados [cidade de 7.000 habitantes a 512 km de Belo Horizonte]. Nasci e fui criada na fazenda, que era do meu avô e hoje é dos meus pais. Quando criança, acordava às 4h, meu pai ia tirar o leite das vacas e eu ia me arrumar para a escola. A van passava bem cedinho. À tarde, ajudava meus pais nas tarefas da fazenda: alimentar os animais, cuidar das hortaliças, fazer queijo, capinar a roça. A rotina no campo começa cedo e termina cedo também, lá por volta de 20h30 já estamos dormindo.

O que eu mais gostava de fazer era descer morro em cima de uma tábua, subir no pé de laranja, pegar fruta e chupar na sombra de árvore. Era bem moleca mesmo. E andar a cavalo. Eu ia ao pasto e montava sem sela nem nada.

Natália Machado - Divulgação/Way Model - Divulgação/Way Model
Natália na infância, na fazenda em Abadia dos Dourados (MG); montar a cavalo era sua atividade preferida
Imagem: Divulgação/Way Model

Desde muito pequena eu sonhava em ser modelo. A gente não tinha internet, mas eu via a Gisele e a Ana Hickmann passando na televisão o tempo todo. Elas eram as referências. E eu era uma menina muito magrinha, tinha um cabelão, as pessoas começaram a falar pros meus pais que eles tinham que me levar para testes, investir na minha carreira. Mas era uma coisa muito distante, principalmente por questões financeiras.

Eu entendia que, para ser modelo, precisava me vestir de um jeito mais caro, ir para uma cidade maior, meus pais não tinham condições para isso, mas nunca tirei a ideia da cabeça.

Quando terminei o Ensino Médio, estava bem indecisa. Nutrição, Odontologia ou Fisioterapia. Eram áreas que eu gostava, mas eram cursos muito caros e eu continuava com o sonho de ser modelo, então decidi ir para São Paulo. Se não desse certo, paciência, mas queria tirar essa ideia da cabeça.

Minha família ficou com medo, claro, mas eles nunca disseram "não vá". Foi a minha primeira vez andando de avião. Eu não sabia nem andar de ônibus, que dirá de avião. Morri de medo da decolagem até o pouso. Foi uma adaptação bem difícil, imagina, uma menina que sai lá da roça, criada na natureza, no silêncio, e vem para a loucura de São Paulo. Demorei pelo menos um ano para me adaptar de verdade. Eu queria ver tudo, provar de tudo.

Natalia Machado - Divulgação/Way Model - Divulgação/Way Model
Imagem: Divulgação/Way Model

Natália Machado, de 23 anos  - Divulgação/Way Model - Divulgação/Way Model
Imagem: Divulgação/Way Model

Logo que eu cheguei, fui aprovada por uma agência de modelo [a mesma em que trabalha até hoje]. Ainda bem, porque eu não tinha condições de viver em São Paulo e fui morar na casa de modelos. Vivia lá com outras 17 meninas. Me surpreendi muito com a grandeza e a rapidez das coisas. Ainda hoje me impressiono por fazer teste para marcas grandes.

Eu conheci o mar meio tarde, durante um trabalho no Rio de Janeiro, depois de um ano que eu estava em São Paulo. Cheguei à noite, mas não quis saber: deixei as malas no quarto e fui de tênis e calça jeans mesmo, só para ouvir o barulho das ondas. Foi muito marcante. Quando vi, estava desfilando na Austrália e no Japão. Fui para a Itália desfilar para a Dolce&Gabbana. É tudo muito distante da realidade em que eu cresci.

Apesar de ter saído da roça há cinco anos, tem hábitos que mantenho: alimentação saudável, dormir e acordar bem cedo. E volto para lá com a maior frequência que posso. Se passo mais de três meses longe, vai batendo aquela saudade. Sempre que estou no Brasil, tiro um tempo para ficar lá, matar a saudade dos meus pais, recarregar as energias, me reconectar com a minha essência."