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Mulheres denunciam ator de novelas e dono de restaurante por violência

Paulo Leite Filho é dono do restaurante Amazonia, no bairro Bixiga - Reprodução/Facebook
Paulo Leite Filho é dono do restaurante Amazonia, no bairro Bixiga Imagem: Reprodução/Facebook

De Universa

21/09/2020 04h00Atualizada em 29/01/2024 13h59

Era por volta das 16h do feriado de 7 de setembro quando a diarista Vera Lucia da Silva, 68 anos, foi ao supermercado comprar um biscoito para a mãe, perto de sua casa, no bairro do Bixiga, na região central de São Paulo. Mas, segundo Vera, o que era para ser uma tarefa cotidiana, terminou com ela, sua filha e a neta agredidas pelo ator e dono do restaurante Amazônia Paulo Leite Filho, de 71 anos. Paulo ficou conhecido em novelas, como "Meu Pé de Laranja Lima", exibida pela TV Bandeirantes, nos anos 1980. Por e-mail, ele nega todas as acusações. A Justiça absolveu Paulo por falta de provas, em setembro de 2022.

Aos prantos, Vera conta à reportagem de Universa que estava na fila do caixa, no supermercado, quando viu Paulo passando na frente de outros clientes. E comentou com outra pessoa, que também esperava sua vez, que ele havia furado a fila. O homem ouviu e, segundo ela, agrediu Vera verbalmente.

"Ele gritava muito e dizia que estava no direito dele, que era idoso, e que era para eu correr atrás dos meus direitos se quisesse. E falava muito palavrão", afirma Vera. "A única coisa que disse foi pra ele parar de gritar comigo."

Ao sair do supermercado, que fica na mesma calçada do restaurante de Paulo, Vera encontrou uma amiga e contou o ocorrido para ela sem perceber que o homem estava ali ao lado, na frente de seu estabelecimento. O empresário então teria voltado a agredi-la verbalmente.

"Ele gritava que eu era um nada. Queria abrir um buraco no chão para entrar", diz.

A idosa conta que foi para casa e ligou para a polícia. Quando sua filha, a vendedora Denise da Silva, 45 anos, ouviu o relato da mãe, foi até o restaurante de Paulo questioná-lo sobre as agressões. Estava acompanhada da filha, Leticia, 19. Vera também voltou ao local com as duas. Foi quando teriam começado as agressões físicas.

"Ele começou a xingar minha filha, e entrei em pânico. Quando vi, ele colocou o dedo na cara dela e a empurrou", diz Vera. "Fui pra cima dele e levei dois socos do lado esquerdo do braço. Para tentar me defender, minha filha o empurrou e levou vários socos na cabeça. Minha neta tentou nos defender e também foi agredida. Quando fui tentar afastá-la dele, levei um tapa com tanta força no rosto que caí no chão."

Mulheres denunciam ator de violência: "Hábito de agredir o ser humano" - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Vera Lucia (esq), Leticia e Denise fizeram protesto contra as agressões de Paulo Leite
Imagem: Arquivo pessoal

A diarista conta que, enquanto as agressões aconteciam, alguns homens que passavam pelo local viram a confusão e tentaram ajudar as mulheres. Foi quando Paulo teria corrido para dentro de seu restaurante.

A polícia foi ao local e levou as três mulheres para o 78º DP (Jardins). De acordo com o boletim de ocorrência ao qual Universa teve acesso, o caso foi registrado como lesão corporal.

Vera diz que não sente mais dor, mas que sua neta tem crises de pânico desde então.

"Ela tem crises de três a quatro vezes por dia. Nunca aconteceu isso. Se deixar, ela fica trancada. Levei minha filha a um hospital psiquiátrico, e ela está tomando antidepressivo", diz Denise, mãe da jovem.

Histórico de agressão

Outra filha de Vera, a auxiliar administrativa Daniela Silva, 37, descreveu tudo que ouviu da família em sua página na internet. Por causa desse post, que tem 154 comentários e 118 compartilhamentos, outras pessoas começaram a relatar que também teriam sido agredidas, verbal ou fisicamente, por Paulo.

Também numa publicação em rede social, a Rede Social Bela Vista, de moradores da região, publicou uma nota de repúdio "aos atos de violência verbal e física cometidos por Paulo". No texto, informa que há inúmeras queixas de agressões já apresentadas contra o ator, inclusive de outros comerciantes. A página Escadaria do Jazz, tradicional evento do bairro, repetiu a atitude.

Mulheres denunciam ator de violência: "Hábito de agredir o ser humano" - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Moradores do bairro Bixiga protestam contra agressões de ator
Imagem: Reprodução/Facebook

Universa conversou com a ex-mulher do ator, a cozinheira Dulcineia do Nascimento, 68. Ela conta que conhece Paulo há 30 anos e não conhecia nenhum caso de agressão do ator até se unir a ele, em 2005. Os dois ficaram seis anos juntos.

"Ele gritava por tudo, e por qualquer coisa me xingava e ameaçava me agredir. Na época ele não estava trabalhando e dava essas loucuras na cabeça dele. Até que foi às vias de fato, no Carnaval de 2008. Ele me agrediu do nada, me chutava. E não falava nada. Fui na delegacia denunciá-lo, mas não aconteceu nada. Nos separamos, mas continuamos morando juntos, porque estávamos montando o restaurante. Não passou pela minha cabeça que ele pudesse me agredir de novo", diz Dulcineia.

Em 2010, lembra Dulcineia, os dois iniciaram uma discussão dentro do estabelecimento de onde Paulo é sócio, com o irmão e a mulher. Ela diz que perdeu o movimento da perna por causa dessa briga:

"Ele me jogou no canto da parede. Bati a perna na quina e 'estourei' o joelho. Fiz duas cirurgias e perdi 35% do movimento da perna".

Dulcineia conta que, após essa agressão, ainda voltaria a ser ameaçada por Paulo. Já morando em outro lugar, ela passou a vender marmitas por conta própria. O ex teria se indignado por supostamente estar perdendo os clientes para Dulcineia.

"Ele me viu na fila de um banco, me empurrou e me encostou na parede. Falava que eu queria acabar com a vida dele. E falou que ia me matar. Ele tem o hábito de agredir o ser humano."

O outro lado

A repercussão do caso nas redes sociais gerou um protesto de moradores em frente ao restaurante de Paulo, no último dia 13.

Por e-mail, Paulo diz que nunca foi casado com Dulcineia, mas deixou-a passar uns meses em sua casa. E que "a lesão de joelho e tudo mais são mentiras deslavadas."

Sobre a discussão no supermercado, ele explica que por ter 71 anos e sofrer de enfisema pulmonar, faz uso de seu direito à prioridade na fila. E diz que quando ouviu Vera Lucia lhe acusar de furar a fila, ele se justificou desta maneira. E continua:

"Ela então ficou bradando e eu me dirigi ao meu restaurante, que é bem próximo. Em seguida, ela veio a mim e, aos berros, disse que mandaria o marido vir tomar satisfação. Eu disse: 'pois mande sim. Espero me entender melhor com ele'. Pouco depois, chegou ele, senhor idoso também, que é guardador de carro dessa rua, conhecido meu. Contei os fatos acima e ele despediu-se, me parecendo satisfeito com a explicação". E finaliza.

"Cinco minutos depois, chega a senhora, acompanhada da filha e da neta, aos berros e gritando impropérios. Uma delas meteu a mão na minha cara, seguida pelas outras duas. Eram seis braços batendo-me na cabeça, contra meus dois, com os quais me defendi. Tenho testemunhas que fazem questão de depor."

Paulo foi absolvido pela Justiça, em setembro de 2022, por falta de provas. Veja a sentença abaixo:

"O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO denunciou PAULO LEITE FILHO, qualificado nos autos, como incurso, por duas vezes, nas penas do artigo 129, caput, c.c. o artigo 61, inciso II, alínea "j", e por uma vez nas penas do artigo 129, caput, c.c. o artigo 61, inciso II, alíneas "h" e "j", na forma do artigo 69, todos do Código Penal. O processo tramitou regularmente com o recebimento da denúncia, citação pessoal do acusado, resposta à acusação e designação de audiência de instrução e julgamento. Encerrada a colheita da prova, o Ministério Público requereu a absolvição do acusado ao argumento de insuficiência probatória, com subsequente manifestação da defesa. É o relatório. DECIDO. A Constituição Federal atribuiu ao Ministério Público a função de promover a ação penal pública com exclusividade <>. O princípio acusatório, portanto, é norma constitucional e governa todo o processo penal brasileiro. O juiz, no sistema acusatório, não tem compromisso com a acusação ou com a gestão da prova e assume posição de inércia, para garantia da imparcialidade, que é regra fundante do processo penal.
Consequentemente, se o Ministério Público entende inviável o pedido condenatório por falta de provas, não pode o julgador substitui-lo na promoção da ação penal, sob pena de ofensa ao disposto no artigo 129, inciso I, da Constituição Federal. O requerimento de absolvição
formulado pela acusação passa a ser vinculativo, isto é, obrigatório para o julgador. O artigo 385, do Código de Processo Penal, que autoriza o juiz a condenar o acusado mesmo que a própria acusação tenha requerido a absolvição, não foi recepcionado pela Constituição. Na
hipótese dos autos, observo que o Ministério Público requereu a absolvição do acusado ao argumento de fragilidade da prova. ASSIM SENDO, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão acusatória para o fim de ABSOLVER PAULO LEITE FILHO das imputações contidas na denúncia, o que faço com fundamento no disposto no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal".