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Conheça o "deschupete", forma mais gentil para seu filho largar a chupeta

Segundo especialista, pais não devem retirar a chupeta, mas promover as condições para que a criança largue o acessório - Osobystist/Getty Images/iStockphoto
Segundo especialista, pais não devem retirar a chupeta, mas promover as condições para que a criança largue o acessório Imagem: Osobystist/Getty Images/iStockphoto

Juliana Tiraboschi

Colaboração para o Universa

21/08/2020 04h00

O processo de retirada da chupeta de uma criança pode ser tranquilo e natural em algumas famílias, mas pode ser altamente estressante para outras. Muitos pais usam táticas como oferecer presentes, incentivar a criança a dar a chupeta para o Papai Noel ou o Coelhinho da Páscoa, mostrar fotos de pessoas com dentes estragados e dizer que foi por causa da chupeta e até fazer furos no acessório, para que fique murcha e deixe de oferecer o prazer da sucção.

Mas qual seria a maneira mais gentil de fazer esse processo? Veja a história de um processo bem-sucedido de retirada da chupeta e conheça os conceitos de "desábito da chupeta" ou "deschupete".

"Desábito" ou "deschupete"

Nanda Perim, psicóloga e educadora parental, tem a filosofia de que os pais não devem retirar a chupeta, mas promover as condições para que a criança largue o acessório. Ela chama esse processo de "desábito da chupeta" ou "deschupete".

Para a psicóloga, que é mãe de Théo, 6, e Gael, 4, e autora do livro "Quando Dei Tchau Para Pepê", que trata do deschupete, o processo deve ser feito em etapas, e não de forma abrupta. A primeira etapa é reduzir o uso da chupeta durante o dia. Ela aconselha os pais a não negarem o objeto quando a criança pede, mas também não oferecer e não deixar o acessório no campo de visão do filho. "Às vezes os pais deixam a chupeta tão à mão que tiram oportunidade da criança esquecê-la.

Passo a passo pro deschupete

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A segunda etapa é, toda vez que a criança pedir pela chupeta, tentar distraí-la com outro assunto ou fazer alguma outra atividade que ela gosta.

Durante todo o processo, ela indica que os pais contem histórias sobre desapego para os pequenos, não necessariamente que envolvam a chupeta. Por exemplo, inventar uma história de uma criança que tinha um bicho de pelúcia, que andava com ele para cima e para baixo, e depois ela começou a deixar o brinquedo de lado e a não precisar mais dele. "Essas histórias trazem confiança para a criança de que ela vai conseguir desapegar da chupeta e não precisar mais dela", diz Nanda.

Outra dica é encontrar outras formas de acalmar a criança. Por exemplo, se a criança chorar e pedir a chupeta, os pais podem dá-la, mas oferecendo outra coisa junto, como um bicho de pelúcia. "Assim a criança associa o outro objeto à calma", diz Nanda. Também é importante que os adultos mantenham a própria calma, acolham e legitimem o sofrimento do filho, dizendo que entendem que ele se sente triste, afirma a psicóloga.

Uma vez que a criança se habitue a ficar sem chupeta durante o dia, as mesmas etapas podem ser feitas durante a noite. Nanda sugere que os pais conversem com a criança e expliquem que, quando ela dormir, eles vão guardar a chupeta, que ela não precisa se preocupar com isso. "A ideia é que a criança acorde e não lembre que a chupeta existe", diz.

Depois que a criança relaxar e pegar no sono, a psicóloga recomenda que os pais falem com o filho e digam que, aos poucos, ele não vai precisar mais da chupeta e não vai pedir mais por ela. Essa técnica é um método certificado chamado "Sleep Talk" e consiste em conversar com a criança durante a fase de sono leve, O método defende que as informações e sugestões fornecidas nesse momento são absorvidas pelo cérebro, mesmo que a pessoa não esteja acordada.

Quanto à estratégia de oferecer presentes em troca da chupeta ou incentivar a criança a dar o acessório para o Papai Noel, a psicóloga acredita que não são as melhores táticas. "Considero uma troca injusta, porque é claro que a criança vai topar o presente. Ela não planeja a longo prazo, não sabe o quanto vai sofrer sem a chupeta", afirma. Ou seja, o filho pode até topar fazer a troca, mas depois que perceber o que ela realmente significa, pode querer voltar atrás, e isso deixa os pais em uma situação difícil. "Já vi até crianças ficarem com raiva do Papai Noel", diz. A psicóloga indica que, caso a criança largue a chupeta, mas depois de alguns dias queira de volta, nada consiga distraí-la e ela faça muita questão, que os pais devolvam o objeto e continuem seguindo as etapas pelo tempo necessário. "Nesse caso ela ainda não elaborou bem a retirada", diz.

Em relação à estratégia de furar a chupeta, a psicóloga diz que pode ser tranquilo para algumas crianças, mas que pode ser estressante para outras. "Se sentiu que a tática está pesada para a criança, deixe para lá", diz. Ela diz que não é muito fã dessa ideia mas que, se os pais realmente quiserem tentar, que deixem para o final do processo, quando a criança já está começando a desapegar do objeto. "Se a criança está superapegada e de repente você tira a sucção, acho maldade", afirma.

Sobre a idade ideal para fazer o processo do deschupete, Nanda é da opinião de que, se o bebê ainda mama no peito, ele deve ser feito o quanto antes. "Como a chupeta leva a confusão de bicos e, consequentemente, desmame, sugiro tirá-la e substituir pelo peito mesmo", diz. Caso contrário, deve ser seguida a orientação dos odontopediatras, que é a de deixar o objeto de lado entre dois e três anos, no máximo.

E, caso a criança ultrapasse essa idade e ainda esteja viciada na chupeta, pode ser que o objeto carregue um peso emocional que vá além do simples hábito, e que deve ser investigado. Vale procurar um psicólogo para uma avaliação.

As vantagens de ser grande

A professora Izany Jales Berger, 40 anos, considera que o processo de abandono do hábito de chupar chupeta foi tranquilo com seu filho Benjamin, que hoje tem quatro anos. Ela ofereceu o acessório à criança desde o nascimento, para que ela não adquirisse o hábito de chupar o dedo ou ficasse "viciado" em chupetar o peito.

Izany filho com chupeta - Acervo pessoal - Acervo pessoal
A meta da professora Izany Jales Berger era que o filho abandonasse o hábito de usar chupeta até os 3 anos
Imagem: Acervo pessoal

No início, ela oferecia a chupeta sempre que o bebê chorava e o motivo não era fome ou para se acalmar na hora de dormir. Já maiorzinho, Benjamin às vezes pedia a chupeta durante o dia, mas os pais evitavam dar o objeto. "Às vezes ele chorava muito, a gente tinha essa dificuldade, mas só dávamos na hora de dormir", conta.

Izany diz que planejava retirar a chupeta somente quando Benjamin conseguisse entender a situação, mas sem ultrapassar os três anos, que foi a idade limite informada por sua odontopediatra. Quando o filho tinha dois anos e meio, a família se mudou para Portugal e os pais acharam que não era o melhor momento para fazer o processo de retirada. Mas, depois que estavam instalados na casa nova e Benjamin bem adaptado à escola e à nova rotina, a mãe conta que se sentiu confiante de iniciar o processo.

A princípio ela tentou as táticas de mostrar fotos de dentes feios e furar a chupeta, mas essas estratégias não surtiram efeito. "Então comecei a falar para ele que ele estava crescendo, que chupeta era para bebês, e que a chupeta dele ia morar na casa de um bebê". "Fomos indicando para ele o que ia acontecer".

Um dia, Benjamin tinha ido para a escola e feito um passeio à tarde, e à noite estava muito cansado. Na hora de dormir, o garoto pediu a chupeta, mas Izany o distraiu com carinhos e ele acabou dormindo sem chupeta. No dia seguinte, os pais contaram a Benjamin que a chupeta tinha ido morar "na casa de um bebê", porque os bebês precisavam dela. Para estimular a nova fase, ofereceram um brinquedo novo e o incentivaram a trocar a chupeta por ele.

Izany filho SEM chupeta - Acervo pessoal - Acervo pessoal
A professora Izany e o filho Benjamin: ela explicou para ele que largar a chupeta faz parte da transição de bebê para "criança grande"
Imagem: Acervo pessoal

"Ele chorou um pouco na segunda e terceira noite, mas o acalmei. Nós sempre mostrávamos os benefícios de ser uma criança grande e poder fazer coisas que os bebês não fazem, como subir no escorregador ou comer um lanche", diz Izany.

Outra estratégia que a professora usou foi levar Benjamin para brincar no parque à tarde, depois da escola, para que ele gastasse mais energia e dormisse mais facilmente à noite.

O que diz a odontopediatra

Para a odontopediatra Helenice Biancalana, antes de falar em chupeta devemos lembrar a relevância do aleitamento no peito pelo valor nutricional, imunológico, emocional e por promover um desenvolvimento da face, mantendo em equilíbrio funções de respiração, deglutição, fala, mastigação e condição postural. "É importante valorizar a amamentação sem o uso de acessórios artificiais, como a chupeta e as mamadeiras", diz.

Porém, se os pais optarem por oferecer a chupeta para o bebê, a odontopediatra diz que seu uso deve ser controlado, sem deixar o acessório disponível o tempo todo para a criança, porque o seu uso contante pode comprometer o crescimento facial e causar desequilíbrio e alterações funcionais. "A chupeta deve ser guardada longe do alcance da criança e oferecida nos momentos em que o bebê apresente certa inquietude ou irritabilidade, geralmente quando o sono está chegando, para proporcionar relaxamento", afirma a Helenice.

Com o crescimento da criança, a sucção deve dar lugar à mastigação. A dentição de leite se completa por volta dos 2 anos e meio, idade em que o pequeno deve usar todos os dentes para a mastigar. "É nesse momento que a chupeta naturalmente deve ser deixada de lado", diz a odontopediatra.

Segundo Helenice, o uso prolongado da chupeta pode promover diversos problemas, como alterações na respiração bucal, atresia de maxila (discrepância da maxila, estrutura que suporta os dentes superiores, em relação à mandíbula), desequilíbrios na fala e na deglutição, má postura de língua e bochechas, mau posicionamento dentário, levando à má oclusão com mordidas abertas e mordidas cruzadas, sem falar na dependência emocional que muitas crianças podem adquirir. Para a odontopediatra, dedicar muita atenção, carinho e conversa são as formas mais efetivas de ajudar a criança a se sentir segura, minimizar o apego emocional que ela pode desenvolver pela chupeta e ajudá-la a largar o hábito.