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Fala de influencer sobre "racismo instintivo" viraliza e traz 4 lições

No Twitter, pessoas se manifestaram sobre o compartilhamento do perfil da influencer e aumento de seus seguidores - golubovy/Getty Images/iStockphoto
No Twitter, pessoas se manifestaram sobre o compartilhamento do perfil da influencer e aumento de seus seguidores Imagem: golubovy/Getty Images/iStockphoto

Nathália Geraldo

De Universa

05/06/2020 10h00Atualizada em 05/06/2020 12h40

Com 55 mil seguidores no Instagram, a influenciadora digital Luisa Nunes Brasil viu seus Stories se tornarem alvo de críticas nesta quinta-feira (4). Luisa afirmou para seus seguidores que o racismo é "natural" e faz parte de um "instinto de defesa". Racismo é crime no Brasil.

Em um vídeo que foi deletado de sua conta no Instagram horas depois de publicado, ela afirma: "O racismo existe enquanto a maior parte de crimes for causada pela população negra. Vai existir, gente, isso é uma coisa natural. É um instinto de defesa da gente. Vai ser sempre natural, normal, instintivo do ser humano ter um pouco da coisa que a gente chama de racismo. Julgar a pessoa pela raça". Procurada, a influenciadora ainda não se posicionou sobre o caso.

Em um momento em que a internet tem sido espaço de mobilização para a divulgação de práticas antirracistas, a fala de Luisa, uma mulher branca, chocou usuários do Twitter, inclusive celebridades. Em um post no Instagram, após repercussão, ela admitiu que deletou o vídeo porque "foi muito infeliz no jeito" que falou. "Eu não sou racista e não defendo movimentos racistas", disse, em seguida.

Diante da repercussão sobre racismo nas redes, Universa reúne abaixo informações para que você saiba o que é possível fazer quando se deparar com um conteúdo que menospreza, exclui ou discrimina grupos minoritários e minorizados (como pessoas negras) em plataformas da internet, como o Instagram.

Entender de onde vem o pensamento racista

Racismo "instintivo" e pessoas negras associadas a "algo ruim" não são conceitos criados a partir da individualidade das pessoas. Eles são construções históricas e sociais. Em debate promovido pelo Ecoa sobre a luta antirracista no Brasil e nos Estados Unidos, a escritora e arquiteta negra Stephanie Ribeiro explicou como a população afro-brasileira é sempre ligada, estruturalmente, a "algo ruim".

Parte daí o reforço de estereótipos ligados à criminalidade, por exemplo, em que homens negros que usam máscara nas ruas, em tempos de pandemia, são vítimas de racismo de outras pessoas.

"Como a gente vai querer ser negro se o ser negro na estrutura racista brasileira é algo ruim? Ser negro no Brasil não é bom. E não falo por conta da estrutura ser violenta. Mas não é bom no sentido mais simples do bom. Toda a narrativa é no sentido do negro ruim, violento. Quando a narrativa feminina existe, é a da mulher sofredora, a mulher que vai ser violentada e depois vai insurgir. Você quer ter essa vida? Você quer se identificar com algo que você provoca sofrimento?", pontuou.

A associação de pessoas negras a aspectos de brutalidade e a uma "tendência à criminalidade" não é uma reflexão pontual e, sim, uma das ferramentas sociais que perpetuam o racismo contra negros no Brasil.

De acordo com o escritor Ale Santos, que também aborda questões raciais e de sociedade em suas redes sociais, a importação de preceitos do "racismo científico" no passado é uma das raízes desse pensamento. A ideia, elaborada pela conceituação da criminologia do médico italiano Cesare Lombroso, no século 19, apontava que homens negros se associavam "naturalmente" à inferioridade, à brutalidade e ao crime.

"Realmente se acreditava que o negro era inferior. E, com a frenologia, que é o estudo dos crânios, criou-se uma categorização em que o homem mais negro era mais animalesco e criminoso — inclusive reforçando estereótipos ligados a crimes sexuais", explicou o escritor para Universa a respeito dos comentários sobre ter "medo do Babu", participante do BBB 20, à época que eles surgiram dentro e fora do reality show.

Saber que racismo é crime no país

Racismo e injúria racial são crimes previstos em lei, com tipificações diferentes. A Lei de Racismo é de 1989 e diz respeito aos "crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional".

Na maioria dos artigos da lei, há a relação com o "impedimento de acesso" a locais, como restaurantes, espaços de lazer; quem nega atendimentos de serviços a alguém por conta de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional também pode responder por racismo.

A injúria racial, prevista no Código Penal, diz respeito ao uso dessas características para "ofender a dignidade e o decoro" de alguém.

Ler o que outras pessoas negras estão falando sobre o caso

Nem sempre a divulgação de um comentário racista tem o efeito desejado por quem o visualiza. Às vezes, a propagação do conteúdo só dá mais voz ao racismo — e projeção a quem comete um crime.

É preciso, assim, estabelecer diálogos com quem foi potencialmente afetado de maneira negativa pelo conteúdo e questionar sobre a melhor forma de proceder.

Nestes casos, denunciar o conteúdo para a plataforma que o abriga — como o Instagram — pode ser uma saída, como foi tema nesta quinta de alguns tuítes. O combate ao racismo, aliás, pode passar por outras estratégias: divulgar e seguir influenciadores e profissionais negros, estudar e conhecer pensadores negros e se informar sobre práticas antirracistas no cotidiano também reforçam a luta.

Denunciar o conteúdo para a plataforma

A assessoria de imprensa do Instagram afirmou, nesta sexta (5), que "não permite conteúdo que ataque pessoas com base em raça, etnia, nacionalidade, religião ou orientação sexual, classe social, sexo, gênero, identidade de gênero, doença ou deficiência".

"Encorajamos que a nossa comunidade denuncie conteúdo que acredite violar nossas políticas e, respondendo às suas dúvidas, compartilho um passo a passo de como reportar conteúdo relacionado a discurso de ódio - seja no Feed, IGTV, Stories ou Direct", diz a empresa.

Como denunciar conteúdos e perfis na rede social: ao lado do perfil da pessoa, clique nos três pontinhos e, então, em "Denunciar" e vá para "O conteúdo é inadequado". Não há motivação explícita associada a "racismo". É possível denunciar por "Símbolos ou discurso de ódio".

A plataforma diz que, entre os critérios para a remoção do material, está "publicações com legendas que estimulam a violência ou atacam qualquer pessoa com base em quem ela é". Clique em "Enviar denúncia".

A plataforma da SaferNet também recebe denúncias de crimes e violações contra os direitos humanos na internet.