Topo

Engravidar agora? O que dizem médicos sobre tentar ser mãe durante pandemia

Com a provável superlotação das redes pública e privada de saúde, a recomendação dos especialistas é adiar planos de engravidar no momento - iStock
Com a provável superlotação das redes pública e privada de saúde, a recomendação dos especialistas é adiar planos de engravidar no momento Imagem: iStock

Nathália Geraldo

De Universa

16/04/2020 04h00

Grávidas (e puérperas) entraram, por determinação do Ministério da Saúde, no grupo de risco para a covid-19. A informação serviu de alerta para algumas mulheres e seus parceiros ou parceiras: por causa da pandemia de coronavírus é melhor adiar os planos de ter um filho?

A orientação dos especialistas é esperar. Segundo o médico e presidente da Comissão Nacional Especializada em Assistência Pré-Natal da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) Olímpio Barbosa de Moraes Filho o momento é um fator complicador. "Se a mulher pode adiar esse momento, deve adiar. Ao engravidar, ela precisará sair de casa para fazer exames, pode ter que enfrentar aglomerações; se a consulta é no SUS, o hospital pode estar superlotado", analisa.

Em casos de reprodução assistida, no entanto, há duas alternativas: quem já está no caminho para ter o filho pode trocar o tratamento para um procedimento de congelamento de óvulos - o que garante mais tempo para que o sonho se concretize - e, quem ainda estava se organizando para começar o processo deve se certificar se faz parte do grupo de pacientes que "não podem esperar indefinidamente", afirma o médico especialista em reprodução humana Fernando Prado Ferreira.

"Não tente engravidar agora"? Recomendações em tempos de pandemia

Em tempos de isolamento social, parte dos planos de vida de muita gente está sendo reconfigurada ou suspensa - ter um filho ou não pode ser uma delas.

De antemão, o ginecologista Olímpio Barbosa de Moraes Filho explica que essa não é a mesma realidade que viveram as mulheres - grávidas e tentantes - de quando aconteceu o surto de zika vírus, associado a casos de microcefalia nos bebês que nasceram à época ou de H1N1. O fato de grávidas e mulheres que pariram estarem no grupo de risco no coronavírus, explica, é mais uma medida preventiva do Ministério de Saúde.

"Até agora, os estudos feitos não demonstram que a gestante tem um aumento de risco de morte, como acontecia com o H1N1, e não há aumento de risco de malformações ou abortamento do bebê, como no zika vírus. Foi identificado, no entanto, que ter coronavírus no último terceiro trimestre da gestação pode ter complicações associadas; se a grávida tem uma pneumonia, por exemplo, pode ter um índice maior de parto prematuro. Mas isso aconteceria se a gestante tivesse qualquer infecção grave", pontua. Os estudos na área, diz Olímpio, ainda são recentes e não conclusivos.

Também são poucas as conclusões sobre se haverá impacto na "geração de bebês coronavírus". "Por enquanto, ainda não observamos nenhuma situação como aconteceu com a microcefalia, que já era identificada no ultrassom. Mas as mulheres que podem ter tido coronavírus ainda vão parir; então, algum diagnóstico, se houver, de que essas crianças podem ter coisas como um déficit de aprendizado, será feito no futuro. Não há certeza absoluta de nada, agora".

Por que adiar a gravidez, então? O médico sugere que é preciso olhar para as condições a que a mulher poderá se submeter em tempos de isolamento social - sair de casa para fazer exames, por exemplo, é uma delas. O acesso às redes pública ou privada de saúde que, neste momento, se preparam para receber casos de coronavírus ou já estão superlotadas, e até mesmo a exposição ao risco do vírus no trajeto a consultas e exames precisam ser levados em conta, diz o representante da Febrasgo.

Há ainda o aspecto emocional: o medo e a ansiedade frente à nova doença viral também fazem parte da rotina das mulheres que querem engravidar. "Não é preciso estar grávida para estar com medo agora; todo mundo está, inclusive os profissionais de saúde. Já entre as gestantes, vemos que há receio, ansiedade, e a pandemia traz uma somação desse efeito e mexe na saúde mental".

Tentar engravidar por meio de reprodução assistida: recalcule planos

Neste momento, engravidar por meio de técnicas de reprodução assistida, como inseminação artificial e fertilização in vitro, também deve ser reavaliado, afirma o médico especialista em reprodução humana Fernando Prado Ferreira.

A Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, e as entidades que representam os médicos da especialidade nos Estados Unidos e na Europa, recomendam que não sejam iniciados novos tratamentos agora.

"Há pacientes, porém, que não podem esperar: são as oncológicas, que têm câncer, quem tem baixa reserva ovariana (o que é avaliado com exames), quem tem mais de 35 anos; esse grupo, que tem relativa urgência para engravidar, deve levar em conta a situação junto ao médico, e avaliar as condições de segurança para que o tratamento permaneça - as clínicas, por exemplo, atendem com horários reduzidos para evitar o encontro de pacientes", diz o médico. Vale dizer que a fertilização in vitro é oferecida pelo SUS e também em clínicas particulares.

Quem está no meio do tratamento também deve continuar, já que o uso de hormônio não deve ser interrompido - e, claro, deve ter acompanhamento médico. "O que se recomenda é, então, congelar os embriões e aguardar uma oportunidade para prosseguir, quando tudo se normalizar".

Sonho de ser mãe adiado: como lidar com frustração?

A psicóloga clínica Helena Montagnini, que atende também na Huntington Medicina Reprodutiva, explica que a tentante — seja a que quer engravidar naturalmente ou a que busca técnicas artificiais de fertilização — precisa acolher a frustração que a situação completamente atípica — viver uma pandemia — traz ao planejamento de todos.

"No caso dessas mulheres, a impossibilidade de seguir com o plano ou a contraindicação representa uma perda. E quem estava em um tratamento, que já veio de uma sequência de frustrações, tem ainda que lidar com mais esse impeditivo", diz.

Não se sentir paralisada nestas condições e "fora do controle", diz Helena, pode ser bem comum a esses núcleos familiares que estão tentando ter filhos.

"É como se a vida ficasse suspensa ou para o futuro. Porque engravidar se torna um desejo que não se sabe quando será retomado. E isso gera ansiedade. Um dos primeiros passos é, portanto, reconhecer essas incertezas, entender que o sofrimento é legítimo e não minimizá-lo".

A psicóloga alerta que são tempos de se "viver a vida possível", e isso vale para todas as pessoas que se sentem abaladas com as medidas decorrentes da pandemia. "Para as grávidas, por exemplo, sugiro que elas se informem com os obstetras para entender bastante quais são os riscos. E, de maneira geral, este é o momento de nos conectarmos cuidando de nós como potência, descobrindo novos interesses e reorganizando a vida", avalia. Por fim, caso seja necessário, buscar ajuda com terapeutas e psicólogos para ajudar nesse processo.