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Escolas fechadas: o que têm feito as mães que precisam trabalhar fora?

Lorena Oliveira  tem deixado a filha Sophia, de 8 anos, com avó - Acervo Pessoal
Lorena Oliveira tem deixado a filha Sophia, de 8 anos, com avó Imagem: Acervo Pessoal

Helaine Martins

Colaboração para Universa

26/03/2020 04h00

No esforço de conter o aumento de casos do novo coronavírus no Brasil, escolas públicas e particulares suspenderam as aulas e fecharam suas portas por tempo indeterminado. A medida restritiva está sendo adotada principalmente nos estados onde já há transmissão comunitária da doença, quando já não é mais possível detectar a origem da contaminação de um caso confirmado, como no Rio de Janeiro e São Paulo. São milhões de alunos sem aulas.

Os impactos do cancelamento das aulas, no entanto, vão além do ensino e obrigam as famílias a repensarem suas rotinas. Muitas mães já foram liberadas pelas empresas para trabalharem no esquema home office. Mas nem todas conseguem, seja por serem autônomas, não terem um trabalho possível de fazer de casa ou por enfrentarem a resistência dos patrões. E com os filhos em casa, elas precisaram pensar soluções que não prejudique o trabalho e, ao mesmo tempo, não coloque a saúde de ninguém em risco.

Abaixo, confira como Lorena, Mayara, Nathashe e Gisele repensaram suas rotinas de trabalho e cuidados com os filhos em tempos de coronavírus:

"Levei a Sophia para a casa da minha mãe: nos falamos por chamada de vídeo"

"Sou bancária e ainda não há definição de qual será a nossa jornada neste período. Por enquanto, não temos previsão de alteração. Assim que a escola da minha filha comunicou a suspensão das aulas, a solução que encontrei foi levar a Sophia para a casa da minha mãe. Para não colocar a vida das duas em risco, combinamos de só nos reencontrarmos quando tudo isso passar. Ou seja, não há previsão de quando poderei vê-las pessoalmente de novo. Para conversar e matar a saudade, nos falamos todos os dias por chamada de vídeo. Ela tem reclamado muito pela falta de contato físico, mas expliquei para ela que o vírus é muito pequeno e pode se esconder em lugares que não percebemos. Por isso, não pode abraçar a avó. Contei que o mundo está brincando de um grande pique-esconde coletivo e ela perguntou se é a vez do corona de procurar. Respondi que sim e que, se todo mundo ficar quietinho, a gente tem chance de ele ir embora e não encher mais o saco de ninguém. Optei por fazer assim para não gerar pânico e confusão na cabecinha dela. Agora ela é minha soldada lá na casa da vovó."
Lorena Oliveira, 39 anos, mãe da Sophia, de 8 anos, do Rio de Janeiro (RJ)

"Meu marido e eu nos revezamos para trabalhar e cuidar das crianças"

mayara - Acervo Pessoal - Acervo Pessoal
Imagem: Acervo Pessoal

"Com meus três filhos em casa, sem ir à escola, eu e o meu marido tivemos que fazer algumas alterações na rotina para nos dividirmos no cuidado com eles. Sou diarista, saio todos os dias às 06h45 para trabalhar e tenho que fazer as faxinas correndo para conseguir sair até às 16h. Muitas vezes nem almoço. Às 18h meu marido precisa estar no trabalho. Ele é ajudante de operador de máquinas em uma empresa e trabalha até às 06h. Agora, ele passou a dormir apenas três horas por dia para poder ficar com os meninos depois que eles acordam, ficar de olho se ninguém sai do isolamento e se lavam as mãos como ensinei. Isso porque ainda tenho deixado meus filhos dormirem até tarde para ele poder dormir o máximo que puder. Quando chego do serviço, ainda passo uma vassoura na casa, lavo louça e deixo comida pronta para o dia seguinte. Se eu tivesse escolha, preferia ficar em casa com a minha família, em segurança. Mas, na verdade, tenho mais medo de ficar sem trabalho do que de pegar o vírus.
Mayara Abreu Silva, 34 anos, mãe de Winicius, 10, Pietro, 11, Kauã, 14, de Americana (SP)

"Levo minha filha para o meu trabalho todos os dias — meu trabalho não pode parar"

natasche - Acervo  pessoal - Acervo  pessoal
Imagem: Acervo pessoal

"Tenho uma empresa que presta serviços na área comercial para pequenas empresas. Eu, minha mãe e meu marido trabalhamos juntos e, infelizmente, não conseguimos parar ou os clientes ficam sem faturamento. Antes, a Niccolly ficava na escolinha durante todo o expediente, das 10h às 17h. Com a escola fechada, a única solução que encontramos foi levá-la para a empresa. Nós nos revezamos nos cuidados com ela, sempre nos certificando de todas as medidas de higiene e informamos para os clientes que o atendimento será por telefone ou pelo WhatsApp para ter menos circulação de pessoas. Montamos um cantinho com berço para ela descansar, em uma sala onde só entramos nós três. Levo cada dia um brinquedo diferente para que a Niccolly não fique muito entediada e fazemos várias pausas durante todo o dia para dar atenção a ela. Não tem sido fácil. Com isso acabamos estendendo nossa jornada até 21h, já que não conseguimos produzir 100% do tempo. Percebemos que é, sim, muito cansativo, mas por enquanto não temos outra solução.
Nathashe Evangelista, 31 anos, empresária, mãe da Niccolly, 2 anos, de São Paulo (SP)

"Combinamos uma nova rotina com a diarista: nesse momento, não temos outra opção"

"Eu e o meu marido somos jornalistas e trabalhamos em televisão. Ele tem participado ativamente da cobertura sobre a pandemia do coronavírus, passando praticamente o dia inteiro fora, inclusive aos fins de semana. Eu trabalho em um canal de arte e não paramos porque acreditamos que a TV virou uma grande companhia para as pessoas nesse momento. Conseguimos fazer uma escala de revezamento, então não preciso ir todos os dias. Com essa mudança na rotina e nossos três filhos em casa, combinamos uma nova dinâmica com a diarista: em vez de vir todos os dias, ela vem apenas quando eu preciso sair para trabalhar e fica com as crianças. Optamos por ela vir e voltar de Uber, por ser mais seguro, e mantemos o salário integral. Sabemos que o ideal seria ela não vir, mas infelizmente não temos outra opção agora. Nossa família é pequena e meus pais e irmãs fazem parte do grupo de risco. Não tem sido fácil, como não tem sido para ninguém, e eu carrego essa culpa, todos os dias. Acho importante aproveitarmos a pandemia para olharmos as relações para além do regime de exceção de agora. A culpa de precisar de uma diarista não é de agora."
Gisele Kato, 42 anos, jornalista, mãe de Vítor e Tomás, 11 anos, e Liv, 3 anos, de São Paulo (SP)