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"Amy Winehouse já me fez rasgar um Dolce&Gabbana", lembra melhor amiga

Amy Winehouse em show de 2008: amigas contam histórias em Los Angeles - Reprodução
Amy Winehouse em show de 2008: amigas contam histórias em Los Angeles Imagem: Reprodução

Fernanda Ezabella

Colaboração para a Universa de Los Angeles

23/01/2020 04h00

"Ficar pronta era sempre um desafio para Amy Winehouse", lembra a estilista e uma das melhores amigas da cantora e compositora inglesa, na abertura de uma exposição dedicada ao seu lado fashion, no Grammy Museum, em Los Angeles, que abriu na última sexta (17). "Ela também não gostava de usar preto, dizia que parecia uma bruxa", disse sobre a cor com a qual Amy é mais lembrada.

Vestidos, acessórios, anotações de diários e uma letra de música inédita foram reunidos para a mostra "Beyond Black: The Style of Amy Winehouse", que fica em cartaz até abril. Depois, viaja para Inglaterra, Chile e Irlanda. Suas músicas e obra continuam sendo lembradas no mundo todo.

"Amy procrastinava por horas no camarim. Ouvia música, conversava com cada integrante da sua banda, com a faxineira, era uma grande faladora. E depois de muito atraso, ficava pronta em cinco minutos", lembra a estilista inglesa Naomi Parry. "Podia ser frustrante, mas era divertido também. Ela era muito respeitosa, não tinha brigas."

O vestido Dolce&Gabanna que Amy pediu para rasgar, para ficar mais curto, está na exposição - Courtesy of the Recording Academy?/photo by Timothy Norris, Getty Images © 2020 - Courtesy of the Recording Academy?/photo by Timothy Norris, Getty Images © 2020
O vestido Dolce&Gabanna que Amy pediu para rasgar, para ficar mais curto, está na exposição
Imagem: Courtesy of the Recording Academy?/photo by Timothy Norris, Getty Images © 2020

Mas tinha muito estresse, sim. Como num show da turnê europeia em 2007, quando Winehouse já estava com um pé no palco e voltou atrás, com um pedido para a amiga. "Seus vestidos foram ficando cada vez mais e mais curtos. E naquela noite, não dava mais tempo, mas ela pedia: 'Corta, corta, corta!'. Acabei rasgando de qualquer jeito. Era algo frequente."

O vestido dourado de barra destruída está na exposição. Era "apenas" um Dolce & Gabbana. Também nas vitrines do museu estão as peças que ela usou no Brasil em 2011, um tubinho amarelo (da marca brasileira Luko) e outro de oncinha (Deadly Dames), além do vestido colorido do último show, em Belgrado, assinado pela própria Parry.

Da esq. para dir., Naomi Parry, Catriona Gourlay (meio) e a jornalista entrevistadora Eve Barlow - Fernanda Ezabella - Fernanda Ezabella
Da esq. para dir., Naomi Parry, Catriona Gourlay (meio) e a jornalista entrevistadora Eve Barlow
Imagem: Fernanda Ezabella

"Quando se fala em Amy, todo mundo pensa nela toda de preto. Mas, na verdade, ela não tinha muitos pretinhos."

Vestidos usados no Brasil

Winehouse (1983-2011) gostava de divulgar novos designers e não dava bola para grifes. Vestia as mesmas criações várias vezes, boa parte de seus acessórios eram bijuterias, e comprava delineador de marca popular de farmácia.

"Alguém do museu me perguntou se seus brincos eram tão baratos como pareciam, e sim, eram. Alguns acessórios eu nem acredito que estejam agora num museu", brincou.

Óculos de corações rosas, fivelas e bolsas de plástico, lenços e um par de sapatilhas estão reunidos numa vitrine decorada com desenhos de suas tatuagens. A maioria dos objetos da exposição será leiloada em 2021 em benefício da Fundação Amy Winehouse, voltada à prevenção de drogas e álcool na juventude. A inglesa morreu de intoxicação alcoólica aos 27 anos, em 2011.

Foi pelas ruas e lojas de Camden Town, epicentro da boemia de Londres, que Winehouse desenvolveu seu estilo retrô, comum no bairro, com o cabelão montado, delineador de gatinho e vestidos vintage. Logo, virou sua marca registrada. E a moda se espalhou pelo mundo, embalada pelos vários sucessos nos álbuns "Frank" (2003) e "Back to Black" (2006).

Num show no Brasil, aliás, a cantora avistou na plateia uma mulher nos ombros de um amigo vestida igualzinha a ela e comentou com Parry: "Estava mais Amy Winehouse do que eu!"

Mão leve

Parry participou de um painel no Grammy Museum ao lado de Catriona Gourlay, melhor amiga de Winehouse. Parry e Gourlay moraram com a cantora em momentos diferentes, em Londres. Antes da fama internacional, as três costumavam sair juntas para jogar sinuca no bairro.

Gourlay era vendedora em lojas de roupas vintage em Camden e com frequência recebia visitas de Winehouse. "Amy vendia qualquer coisa para qualquer um", lembrou Gourlay. "Ela chegava em alguém experimentando uma peça e elogiava. A pessoa comprava na hora. De cantinho, escondida, ela fazia um sinal pra mim que, na verdade, tinha ficava um horror!"

"Ela ajudava muito as minhas vendas. Às vezes, afanava umas coisinhas, mas acho melhor não falar sobre isso", disse, rindo. "Nossa amizade era muito intensa, ela era muito importante para mim. Esta é a primeira vez que falo publicamente sobre ela, nunca dei entrevistas."

Gourlay, que hoje trabalha na indústria musical e ajuda na Fundação Amy Winehouse, contou que a amiga era obcecada por certos filmes e assistia a "Sin City" (2005), "Death Proof" (2007) e "Planet Terror" (2007) repetidamente. Também ouvia Lauryn Hill sem parar e às vezes cantava Donny Hathaway para a amiga dormir.

"De vez em quando, ela me deixava uns recados esquisitos de manhã: 'Fiquei vendo você dormir, tão em paz'", disse.

Nada de tattoo

As duas amigas não quiseram falar dos problemas de Winehouse com drogas e álcool, mas mostraram um pouco do seu lado conservador. A cantora não queria de jeito nenhum que Gourlay fizesse tatuagens. "Ela me deixou ter uma só. Fiz umas bonecas russas com suas iniciais", contou.

"Amy dizia que ela nunca ficaria bem num vestido de noiva por causa de suas tatuagens nos braços, não importava o quão caro fosse o vestido", falou a amiga, que hoje tem várias. "Mas ela absolutamente amava suas tatuagens."

A cantora tampouco se identificava com a mulherada mais independente, "que não precisava de homem e podia fazer seu próprio dinheiro". "Amy costumava dizer que éramos mulheres dos anos 50, que nossos corações podiam ser estraçalhados mil vezes e a gente ainda amava nossos namorados", contou.

Sempre romântica, Winehouse desenhava coraçõezinhos nas letras de suas músicas escritas à mão, algumas expostas no museu, como "Cherry", "Help Yourself" e "Wasting My Breath".

Há também a letra de "Dolly's Diner", nunca gravada. A canção fala sobre seu sonho de ter um restaurante e trabalhar como garçonete de patins, como nas antigas lanchonetes americanas. Escrita nos anos 2000, a letra parece trazer um presságio.

"Claro que eu tinha talento [...] mas para quê serve talento se não há senso comum?", Winehouse escreveu. "Bem, agora está tudo acabado, fiz uma escolha errada, perdi minha confiança e arruinei minha voz."