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Elas sobreviveram ao câncer de mama e praticam remo para celebrar vida

Remama existe desde 2013 e tem 40 integrantes; Elas praticam exercício no Dragão Rosa, como é batizado o barco delas - Natália Eiras/UOL
Remama existe desde 2013 e tem 40 integrantes; Elas praticam exercício no Dragão Rosa, como é batizado o barco delas Imagem: Natália Eiras/UOL

Natália Eiras

De Universa

24/10/2019 04h00

Estar em pé às 8h na raia olímpica da USP (Universidade de São Paulo) não parece ser um problema para um grupo de 20 mulheres que ostentam um sorriso no rosto e, no peito, a camiseta rosa da Remama, equipe de remo formada por sobreviventes do câncer de mama.

O projeto, feito pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), usa o esporte para reabilitar mulheres que passaram pelo tratamento da doença. "Existe esse 'mito' de que mulheres que fizeram mastectomia não podem levantar os braços ou fazer exercícios, mas estamos aqui para mostrar que não é verdade", diz a coordenadora do grupo, Denise Reis Chagas, 49, para Universa.

A gastrônoma Denise de Chagas, 49, é coordenadora da equipe. "A ideia de que mulher que teve câncer de mama não pode fazer exercício é mito" - Natália Eiras/UOL - Natália Eiras/UOL
A gastrônoma Denise de Chagas, 49, é coordenadora da equipe. "A ideia de que mulher que teve câncer de mama não pode fazer exercício é mito"
Imagem: Natália Eiras/UOL

Denise descobriu o câncer de mama há três anos, quando ele já havia atingido o sistema linfático -e, por isso, precisou retirar os gânglios linfáticos de seu braço esquerdo. O procedimento, bastante comum entre as mulheres que passam pela mastectomia, pode causar linfedema, inchaço repentino do braço.

Sempre munida com uma luva compressora no braço esquerdo, ela já estava convencida de que não poderia fazer mais exercícios. O remo surgiu, então, como uma forma lúdica de evitar as consequências do procedimento. "Ninguém quer ficar com um bração, né? Só se for de tanto remar", brinca.

A enfermeira Camila Jacinto, 40, é a mais jovem da equipe. "Achei que nunca mais poderia fazer exercícios" - Natália Eiras/UOL - Natália Eiras/UOL
A enfermeira Camila Jacinto, 40, é a mais jovem da equipe. "Achei que nunca mais poderia fazer exercícios"
Imagem: Natália Eiras/UOL

O Remama foi criado no início de 2013 quando, ao estudar os benefícios do exercício físico para pacientes que tiveram câncer, Christina May de Brito, coordenadora médica do Serviço de Reabilitação do Icesp, descobriu um movimento canadense que usava o remo como reabilitação para sobreviventes do câncer de mama. Hoje, os treinos acontecem toda terça e quinta-feira e são orientados pelos professores José Farah e Christian Klausener.

Segundo pesquisas, o remo é uma das principais formas de controlar o linfedema, inchaço após a retirada do sistema linfático. Porém, mais do que isso, a prática também traz benefícios como melhora da fadiga oncológica e dos transtornos de humor, como depressão e ansiedade, uma vez que une o exercício físico de baixo impacto com a interação social.

A capitã Etsuko Takaoka Saizaki, 68, é conhecida na equipe por ser praticamente uma triatleta. A aposentada descobriu o câncer de mama há três anos, quando estava sem convênio médico. Por sorte e insistência, conseguiu fazer o tratamento no Icesp. Uma vez passada a pior parte da doença, Etsuko começou a praticar o remo e pegou gosto por atividades físicas.

Antes de ir para o treino do Remama, ela corre pelo menos cinco quilômetros no campus da USP e está aprendendo outras modalidades de remo. "Decidi aproveitar mais o fato de ter ganhado uma segunda chance", fala a aposentada.

A capitã Etsuko Takaoka Saizaki, 68, é conhecida na equipe por ser praticamente uma triatleta - Natália Eiras/UOL - Natália Eiras/UOL
A capitã Etsuko Takaoka Saizaki, 68, é conhecida na equipe por ser praticamente uma triatleta
Imagem: Natália Eiras/UOL

Etsuko fica tímida na frente das câmeras, mas é cheia de pique na hora de sentar-se no primeiro branco do Dragão Rosa, o barco da equipe. Porém, mais do que sentir a seratonina após o exercício físico, a capitã diz que o Remama também bomba a sua autoestima e bem-estar emocional. "É bom passar esse tempo com outras mulheres que passaram pelo mesmo que eu, que me entende. Faz bem para o corpo e para a cabeça."

Ao vê-las em ação, parece que não existe tempo ruim para as integrantes do Remama. No dia que Universa foi acompanhar um treino, o tempo estava nublado, mas, dentro do barco, o clima era ensolarado e de bom humor. Entre uma remada e outra, elas brincavam, riam com os treinadores e tiravam um sarro da reportagem, que estava morrendo de medo de o barco virar.

Uma das brincalhonas era a enfermeira Camila Jacinto, 40, que está há cinco meses na equipe. A mais jovem participante é, também, a que passou mais recentemente pelo tratamento. "Fiz a mastectomia no começo desse ano", afirma. Antes de descobrir o câncer de mama, Camila praticava muay thai. "Quando fiz a cirurgia, achei que nunca mais poderia fazer o que gostava, que era fazer esses exercícios mais intensos." Apesar de nunca ter pensado em praticar remo, a enfermeira logo se apaixonou pelo esporte. "Voltei a fazer algo que gosto e, além disso, conheci mulheres que tiveram a mesma vivência que eu", diz.

Camila não é a única. A sensação de conquista, seja por estarem aprendendo algo novo, por terem superado um câncer ou pelo trabalho em conjunto que é fazer um barco a remo navegar, é o que une essas sobreviventes. "Temos que remar em sintonia para que o barco ande com mais leveza", fala Etsuko, ensinando a reportagem a usar o remo. "Hoje foi difícil de levantar da cama, mas depois sempre vale a pena", reflete outra participante, enquanto o Dragão desliza pela raia.

O projeto é gratuito e tem treinos às terças e quintas-feiras - Natália Eiras/UOL - Natália Eiras/UOL
O projeto é gratuito e tem treinos às terças e quintas-feiras
Imagem: Natália Eiras/UOL