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Justiça diz que chilena terá que devolver filho autista para pai na Espanha

A chilena Nicole Rivera - Arquivo pessoal
A chilena Nicole Rivera Imagem: Arquivo pessoal

Daniel Leite

Colaboração para Universa

17/09/2019 04h00

A administradora de empresas Nicole Rivera, 42, nasceu no Chile, mas morou no Brasil -em São Paulo e Santa Catarina— dos oito aos 19 anos.

Em 2015, já de volta a seu país, se casou com um espanhol. "Aqui no Chile, ele era o melhor homem do mundo." Os dois tiveram um filho. Tudo ia bem, conta Nicole, até que o casal se mudou para a Espanha e ela começou a notar comportamentos estranhos do marido e descobriu que ele era viciado em cibersexo.

Meses depois, em 2017, voltou com o filho ao Chile com a autorização do pai, que seguiu morando na Espanha. No ano passado, Nicole recebeu uma notificação em que o pai de seu filho, um engenheiro de 42 anos, a acusava de sequestro internacional e exigia que ela retornasse com o garoto para a Espanha. José Manuel, de 3 anos e 9 meses, é autista.

Depois de uma sequência de decisões contraditórias, a Suprema Corte do Chile determinou que a mãe terá que devolver o filho ao pai até o próximo dia 21 de setembro. Procurado, o pai não respondeu as mensagens da reportagem.

A seguir, Nicole conta sua história:

"Logo que voltamos da Espanha, o pai fazia ligações diárias, mas logo o fluxo foi diminuindo. O pai do meu filho iniciou terapia para o seu vício a meu pedido e insistência. Na medida em que o tratamento foi avançando, foi diminuindo o interesse por nós e, principalmente, pelo nosso filho. Deixou de ligar para vê-lo por vídeo. Logo começou a enviar a metade do dinheiro que tínhamos combinado e, de um dia para o outro, há seis meses, deixou de enviar dinheiro completamente.

Em setembro de 2018, recebi uma notificação a pedido do pai do meu filho, fazendo referência à Convenção de Haia e à subtração de menores. Nela, ele me acusava de sequestro internacional e retenção ilegal de menor e exigia que eu retornasse para a Espanha com o meu filho de forma imediata. Mas logo os advogados dele retiraram a acusação de sequestro, deixando somente a retenção de menor.

Naquele dia, meu mundo desabou. Um ano depois dessa notícia e estando há mais de dois anos morando no Chile, recebemos uma decisão da Suprema Corte daqui, no último dia 6, a favor do pai biológico do meu filho. Indicava que meu pequeno, uma criança com três anos, autista com grau entre moderado e severo, deve ser enviado para a Espanha para viver com o pai em até 15 dias, ou seja, até o próximo dia 21.

Temo pelo meu filho por duas razões muito significativas. Uma delas é que ele é autista, requer cuidados especiais, uma rotina específica, comida feita de uma forma especial, todas as questões que o pai e a família dele ignoram completamente.

Meu filho, por indicações nutricionais, ainda toma leite materno, e isso teria que ser interrompido. Além disso, temo pelas consequências psicológicas do que poderia acontecer com ele pelo fato de ser separado da mãe, sua única figura de apego desde que nasceu.

Outro ponto importante é que meu filho não conhece nem reconhece o pai biológico nem os parentes da Espanha, já que nenhum deles tem procurado continuar o contato. Assim, estaria com pessoas completamente desconhecidas para ele.

Além disso, por causa do vício de mais de dez anos em pornografia e cibersexo, acredito que o pai dele deva ser checado em termos psiquiátricos e psicológicos para ver se é apto ou não para estar com meu filho.

Não posso entrar na Espanha e acompanhar meu filho porque lá seria presa pelo crime de retenção, que não cometi.

Tanto o Tribunal de Família de Viña del Mar quanto o Tribunal de Apelações de Valparaíso decidiram contra o pedido do pai, garantindo os melhores interesses de meu filho e seu bem-estar. Mas a Suprema Corte chilena decidiu a favor do pai.

Tenho esperanças de reverter essa situação. Recorremos e os outros ministros da Corte podem reverter o resultado dos três que votaram. Todos podem errar, por que não a corte suprema? Acredito que esse erro se deva ao desconhecimento do poder judiciário sobre a condição dos autistas.

Levo vários dias sem dormir, estou apavorada. Não consigo imaginar minha vida sem ver seu rostinho, sem sua mão no meu peito toda vez que ele dorme. Tenho pedido para várias pessoas viralizarem meu caso para me ajudar a proteger meu 'pepito' de ser enviado para outro continente e separado da mãe, avô, escolinha, terapias, amigos e tudo o que, no Chile, há mais de dois anos, faz dele uma criança autista, saudável e feliz."