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"Você só engorda": controlar comida e peso do par é relacionamento abusivo

Dora Figueiredo revelou em vídeo que ex controlava tudo que ela comia - Reprodução/Instagram
Dora Figueiredo revelou em vídeo que ex controlava tudo que ela comia Imagem: Reprodução/Instagram

Jacqueline Elise

De Universa

24/07/2019 04h00

A youtuber Dora Figueiredo divulgou um vídeo em seu canal, na semana passada, falando sobre ter vivido um relacionamento abusivo. Ela conta, em detalhes, como grande parte do abuso que sofreu acontecia quando ela ia comer.

O ex dizia coisas como "desde que eu te conheço, você só engordou", controlava tudo que ela comia e dizia que ela era "nojenta" comendo: "Ele falou 'eu não vou comer nunca mais perto de você, porque você não respeita a comida'. Isso porque eu tinha deixado garfo e faca em posições não paralelas", relata em vídeo.

Dora chegou a dizer, em seu Instagram, que até perdeu o prazer de comer, e que tinha medo de se alimentar perto dele. A prática de controlar obsessivamente o que o parceiro ou parceira come, além de constranger ou ameaçar a pessoa por conta da comida, pode ser considerada violência psicológica, segundo especialistas.

"É loucura isso, uma forma de controle muito agressiva e humilhante, no qual o agressor detona a autoestima da pessoa. Não cabe, numa relação, esse tipo de comportamento", diz Marina Vasconcellos, psicóloga, psicodramatista e terapeuta familiar pela PUC-SP.

"Essa coisa da crítica ao peso ainda pega muito para as mulheres. Para os homens também, mas não tanto quanto para elas. Isso ainda acontece por conta da cobrança da sociedade para ser magra, o que ainda é considerado o 'padrão'. Fica pior ainda se a mulher já tem um problema com a própria imagem. As humilhações vão afetando cada vez mais e ela vai se levando pela manipulação do parceiro".

Cristiane Maluf Martin, psicanalista e terapeuta de casais, explica que nessas relações, o abusivo só se importa com os sentimentos dele porque ele mesmo tem a autoestima muito frágil. "Então, quanto mais ele diminuir o par, melhor ele se sente".

O peso e a comida, nesse caso, foi a forma que o parceiro abusivo encontrou de diminuir Dora. Segundo a especialista, mulheres que passam por esse tipo de relação podem desenvolver dependência emocional, estresse pós-traumático e até mesmo transtornos alimentares.

"É preciso ter um grau de autoconhecimento e de autoaceitação muito grande para não se deixar levar por isso, porque realmente é um controle abusivo da vida da pessoa. A pessoa pode perder a própria identidade, se afastar de família e amigos", diz Cristiane.

Para conseguir reconstruir a autoestima, as especialistas falam que acompanhamento psicológico e, em alguns casos mais graves, tratamento psiquiátrico são os mais indicados.

Caso pode ser enquadrado como violência psicológica

Controlar e humilhar a parceira por sua alimentação e seu peso podem se enquadrar na Lei Maria da Penha (11.340), no artigo 7, segundo Denise Rocha, advogada pela Universidade Federal Fluminense e membro associada do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família.

"A violência psicológica é entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões. Isso pode acontecer sob ameaça, humilhação, manipulação e chantagem", explica. Muitas vezes, o parceiro ameaça terminar o relacionamento se a outra pessoa não se enquadrar em seus padrões, como no caso de Dora.

Denise explica como alguém pode denunciar esses casos:

  • Procurar uma delegacia da mulher -- ou, se não houver na cidade, uma delegacia tradicional também pode fazer o boletim -- e buscar registrar a ocorrência dessas atitudes;
  • Cada ato de violência psicológica é uma ocorrência diferente;
  • A vítima pode solicitar uma medida protetiva física até mesmo se dividir o teto com o parceiro;
  • Se tiver mensagens no celular, qualquer situação documentada, gravações, testemunhas que tenham visto esse comportamento acontecer, melhor. Tudo isso vale como sustentação da denúncia;