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Você leva o relacionamento nas costas? Dividir tarefas evita crise conjugal

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Imagem: Getty Images

Heloísa Noronha

Colaboração com Universa

21/05/2018 04h00

Por mais que as pessoas sejam diferentes - e, portanto, também expressem seus sentimentos de maneira distinta -, às vezes acontece de, num casal, um ou outro passar a ter a impressão de que leva a relação nas costas. Essa sensação nem sempre diz respeito à intensidade nas maneiras de demonstrar amor, mas às coisas, digamos, mais práticas que permeiam um relacionamento.

Exemplos: assumir praticamente todas as decisões, desde o destino das férias até o filme que vão ver no Netflix, até se sobrecarregar pelas tarefas domésticas ou por questões que envolvem a família de origem do par, como comprar presentes ou comparecer (ou não) em certos eventos.

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Quando isso acontece, o risco de a relação entrar em crise é enorme. Afinal, ninguém gosta de se sentir lesado nem de se dar conta de que tem que pensar em tudo porque o outro não move um dedo. Para enfrentar essa situação, porém, primeiro é preciso entender como ela se instalou no cotidiano do casal.

Liderança natural ou compulsão de controle?

De acordo com o psicoterapeuta e terapeuta de casais Luciano Passianotto, de São Paulo (SP), em certos relacionamentos um parece se importar mais do que o outro porque algumas pessoas tendem mesmo a ser mais ativas em todas as suas relações - e não agem de modo diferente nas amorosas. "Isso não significa que seja algo positivo ou negativo, é só uma característica da personalidade. Pode ser um sinal de liderança natural e de proatividade, mas também de ansiedade, nervosismo ou compulsão pelo controle", diz.

Luciano lembra ainda que, com o tempo, é normal todo casal criar algumas combinações veladas com o objetivo de organizar e tornar a vida mais simples e confortável. "Tanto nos acordos explícitos, do tipo 'eu cuido das roupas e você faz a comida', quanto nos implícitos, são estabelecidos papéis. Quando há vácuos não discutidos, alguém acaba assumindo alguns papéis, a favor ou contra sua vontade, sabendo ou não", explica. Daí a confusão se instala.

As duas pessoas precisam transformar a relação

Para o psicólogo Yuri Busin, diretor do CASME (Centro de Atenção à Saúde Mental Equilíbrio), de São Paulo (SP), as pessoas também acabam assumindo o controle das coisas e levando a relação nas costas porque amam demais, não querem desistir e, no fundo, desejam mudar a forma como o relacionamento vem sendo conduzido. "Mas relacionamentos são feitos de duas pessoas e, para mudar, é preciso que ambas tenham a vontade de transformar", afirma.

Já a psicóloga Raquel Fernandes Marques, membro da equipe da Clínica Anime, de São Paulo (SP), pontua outro aspecto bem importante: o fato de que muita gente alimenta a falsa crença de que o controle que exerce sobre o par é 100% calcado no amor e na preocupação com o seu bem-estar. "Controle não tem nada a ver com amor, mas quem enxerga dessa forma costuma se dedicar integralmente a esse modelo de relação, por achar que essa é a 'fórmula mágica' para um relacionamento duradouro", declara.

E como, em geral, para todo controlador existe alguém querendo ser controlado, eis uma relação patológica que precisa urgentemente ser modificada, sob o risco de naufragar.

Dificuldade em delegar tarefas

Outro elemento crucial a ser lembrando é que algumas pessoas têm preocupações excessivas em manter tudo em uma ordem exagerada, ignoram opiniões diferentes e sentem sérias dificuldades em delegar tarefas. E as justificativas, normalmente, são sempre as mesmas: “ninguém faz como deve ser feito", "nunca sai do jeito correto", "fulano demora muito para tomar uma decisão", etc.

Os controladores acabam criando regras que viram referência de julgamento para avaliar e controlar tudo e todos ao seu redor. "Os possíveis conflitos e discussões desgastam a relação. O controlador sofre por desejar algo impossível, pois ninguém tem o controle de tudo, e a pessoa controlada sofre por não poder fazer suas próprias escolhas, opinar e traçar seu caminho com segurança e independência, resultando em uma relação totalmente tóxica para ambos", avisa Raquel.

Como mudar o padrão?

É válido destacar que as mulheres são culturalmente estimuladas a não só ocupar a função de cuidadoras, mas também a acreditar que seus sentimentos são capazes de mudar o outro. Se esse é o seu caso, é importante, então, usar essa força para promover primeiro a mudança em si mesma e na forma com que se relaciona com o outro, para, assim, comunicar ao par o que e como pretende melhorar a relação.

Independentemente de quem se vê na posição de levar a relação nas costas, porém, quem a ocupa deve refletir se a sua personalidade mais ativa é o fator por trás da mania de trazer para si tanta responsabilidade.

"Para mudar esse cenário, é preciso dar tempo para o outro perceber algumas coisas e aprender a negociar. Tenha mais calma e paciência e pondere se você não está agindo como um pai ou mãe", aconselha Luciano. "Tornar-se uma pessoa mais democrática também é um bom começo para a mudança, pois possibilita uma rotina mais leve, com maior flexibilidade para lidar com qualquer tipo de decisão e é fundamental no processo de delegação de tarefas", diz Raquel.

Colocando limites no outro

Seja o que for que estiver por trás de seu comportamento, é necessário avaliar o que você deseja e espera desse relacionamiento, abrir o jogo com a pessoa sobre isso e, assim, ver se ambos estão na mesma sintonia de mudar o relacionamento.

Quem tem um papel mais passivo também pode - ou melhor, deve - começar a mudar. "Aquele que se sente desconfortável com sua passividade na relação precisa se atentar ao que o outro valoriza, para então opinar sobre isso", fala Luciano. "Cultivar raiva ou ressentimentos de nada adianta. É necessário aprender a colocar limites no outro. Dessa forma a pessoa elimina o processo de autossabotagem, requalificando assim a sua autoestima", conta Raquel.