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Mãe e filha: como retribuir amor em um relacionamento complicado

Mesmo uma relação próxima como a de Lorelai (Lauren Graham) e Rory (Alexis Bledel) em "Gilmore Girls" tem seus altos e baixos - Divulgação
Mesmo uma relação próxima como a de Lorelai (Lauren Graham) e Rory (Alexis Bledel) em "Gilmore Girls" tem seus altos e baixos Imagem: Divulgação

Geiza Martins

Colaboração para Universa

17/04/2018 04h00

Relacionamentos mais profundos e complicados entre as duas envolvem outros sentimentos além do amor e devem ser tratados com todo cuidado

Não dá para embalar a relação entre mãe e filha em um pacote romantizado cujo único conteúdo é amor. Há muito mais sentimentos envolvidos. O clássico filme de Ingmar Bergman "Sonata de Outono" (1978) relata o lado mais obscuro dos sentimentos de uma mãe ausente e uma filha magoada. São quase duas horas de um acerto de contas cheio de desabafo, choro, amor e lágrimas. Na série queridinha "Gilmore Girls", Lorelai e Rory vivem grudadas, mas também têm lá seus desentendimentos, passando inclusive tempos sem se falar ou se ver. 

Fato é: existem mães rivais, parceiras, companheiras, ausentes, superprotetoras e por aí vai. Algumas amam suas filhas em demasia, outras nem tanto. Independentemente de qual seja a sua, há muito espelhamento e expectativas envolvidas e o embate é certeiro. "Os conflitos transgeracionais marcam a ferro a alma. É uma relação muito delicada que deve sempre ser regada e trabalhada no intuito de causar menos dano possível", explica a psicóloga Triana Portal.

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Amor e ódio

Quando as brigas aparecem, geralmente a filha se rebela e põe em dúvida o laço afetivo das duas. Rapidamente, ela se permite a não gostar da mãe ou passa a desejar que seu afeto seja conquistado e não entregue simplesmente pelo vínculo de sangue. Por outro lado, a mãe passa a ser habitada por um sentimento de traição, como se a filha fosse pura ingratidão ao negar o seu amor.

No quadro geral, ao mesmo tempo que a filha quer ser diferente da mãe, ela é um reflexo dela e aí moram as chances de enfrentamento. Nem sempre esse sentimento de rancor e raiva é explícito, algumas vezes eles tendem a ficar escondidos.

Laço forte

Por maior que sejam as desavenças, o vínculo de sangue, a lealdade e a referência nunca deixarão de existir e sempre vão prevalecer. Esse é o aspecto mais positivo da relação mãe e filha.

De acordo com Triana, costumamos retribuir o amor para nossas mães quando ocorre a parentalidade invertida, ou seja, quando a filha passa a cuidar dos pais como filhos, seja por doença ou idade.

Mas o ideal é não esperar esse momento chegar e aproveitar os melhores anos da vida de sua mãe juntinho dela. "Conflitos podem ser enfrentados, resolvidos, digeridos ou abafados, guardados como mágoa e dor. Não há como ignorá-los. Seja como for, eles estão lá", explica a psicóloga.

Desconstruindo o ódio

Para resolver essa guerrilha disfarçada, mãe e filha devem se aceitar e conviver com suas diferenças, transpor o padrão negativo de repetição desses conflitos. Deve-se romper com os sentimentos de culpa, necessidade de reparação, ingratidão, injustiça, além das expectativas frustradas e mais uma infinidade de vivências nocivas.

"Retribuir o presente que ela te deu, chamado 'vida', seria pagar por tudo que ela lhe proporcionou de bom em todos os sentidos e aceitar, perdoar tudo o que fez de ruim", comenta. A chave para encontrar harmonia é trabalhar a empatia, colocar-se no lugar dela e entender seus medos, dificuldades e defeitos. Afinal, o papel de mãe também é custoso, sobretudo para ela mesma.

Você, mãe

Se esse for um passo muito difícil, uma saída é pensar que você também não será - ou já é - uma mãe perfeita. Isso porque quando temos filhos passamos a ver o relacionamento sob outra perspectiva, a da mãe. A maternidade possibilita a vivência de sentimentos e o entendimento do que até então não entendíamos.

"O perdão e a reconciliação [entre mãe e filha] são possíveis nessa fase, pois a tendência é nos aproximarmos ou reaproximarmos de nossas mães. Passamos a entendê-la melhor, nos identificar com ela dentro do papel porque deixamos de ser filhas para sermos mãe".

Amar no dia-a-dia

"Reescrever o passado. Aceitá-lo. E tentar ,a partir do presente, reconstruir a relação, é o caminho para uma vivência verdadeira, autêntica e afetuosa", afirma a psicóloga. Depois que acontece esse processo de ressignificação, fica muito mais fácil retribuir o carinho maternal no cotidiano.

Os pequenos gestos afetuosos são responsáveis por manter o vínculo reforçado. Um simples telefonema, por exemplo, pode ajudar e muito. Vale também acompanhar numa consulta médica, ter um dia da semana para fazerem algo juntas, o almoço em família semanal, celebrar datas comemorativas e aniversários. "Também vale ajudar em tarefas, como ir a um banco, carregar compras do mercado ou simplesmente estar aberta para escutar", finaliza.