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#MeToo da moda: Desfile na NYFW traz histórias de assédio de modelos

Mariana Araújo

do UOL, em São Paulo

10/02/2018 09h54

A discussão sobre assédio e a luta para o seu fim chegou ao mercado fashion e subiu às passarelas da New York Fashion Week.

Nesta sexta, 9, as histórias de assédio e abuso de modelos dentro da indústria de moda foram contadas em um desfile: o #MeToo Fashion Show, que trouxe de maneira literal pela primeira vez a voz das mulheres que são rostos — e corpos — para grandes marcas.

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O projeto foi concebido pela produtora Myriam Chalek, que falou sobre a ideia ao "Daily Beast". "Conversei com muitas mulheres e, muitas vezes, elas são culpadas pelo que aconteceu a elas. Há uma forte conexão entre as roupas que alguém usa e a culpa que a sociedade imputa a vitimas e sobreviventes", ponderou.

"Este desfile é uma maneira de dizer: 'Não importa o que você está vestindo, não são as suas roupas as responsáveis pelo que aconteceu a você".

As modelos surgiram na passarela vestindo peças da marca "American Wardrobe" e asas de anjo, como as muito cobiçadas (pelo público masculino, principalmente) Angels da Victoria's Secret. Ao lado (ou algemados a) elas, modelos masculinos vestiam máscaras de "porco", uma alusão ao movimento #BalanceTonPorc, o #MeToo francês.

Uma das histórias contadas foi a de Alicia Kozakiewicz, que ainda sofre de Transtorno de Stress Pós-Traumático após ter sido sequestrada e estuprada aos 13 anos. "Não deixe que alguém tire a sua voz como fizeram comigo", pediu à plateia.

A modelo Cheyenne Jacobs também assumiu o microfone e contou que já sofreu experiências de assédio, abuso e estupro em diferentes ocasiões, mas que tinha apenas 15 anos quando um colega de escola tirou o pênis para fora da calça e a forçou a tocá-lo. "Não somos apenas histórias, somos pessoas".

Outro caso que comoveu os presentes foi o da atriz Sabrina Piper, que revelou que um namorado a estuprou e a abandonou em um parque infantil ensanguentada.

"Acredito que contar a minha história em um desfile seja assustador, mas acho que nada pode ser mais assustador do que aquela noite", disse ela ao jornal "New York Daily News" após o evento.

O impacto do movimento #MeToo na moda

Esta, no entanto, não é a primeira iniciativa que tem relação direta com o movimento #MeToo, de denúncias de assédio e abuso sexual, que tomou conta das redes sociais e das mídias da indústria do entretenimento no mundo todo.

A própria organização desta edição da NYFW foi impactada por ele. Na terça, 6, dois dias antes do início do evento, o CFDA (Council of Fashion Designers of America) anunciou em parceria com a ONG Model Alliance — que luta pela manutenção dos direitos humanos na indústria da moda — que modelos teriam acesso a uma área privada para trocar de roupa entre os desfiles.

É a primeira vez que isso acontece na história da semana de moda. A estilista Diane Von Furstenberg, presidente do CFDA, justificou a decisão pioneira em comunicado à imprensa: "O clima atual está marcado por mulheres e homens corajosos e suas revelações sobre a cultura inaceitável [de assédio] na política, no esporte, no entretenimento, como também na moda".

No documento, a instituição também responsabiliza as marcas por quaisquer violações em relação à saúde e a segurança dos profissionais e encoraja todos a denunciarem casos de abuso e assédio.

O "Time's Up" fashion

Ainda esta semana, a modelo Kristina Romanova, que aos 23 anos já trabalhou para Ralph Lauren, Calvin Klein e Marc Jacobs, se juntou à advogada especializada em moda Antoniette Costa, de 32 anos, que já trabalhou para a Louis Vuitton, e anunciaram a criação de uma iniciativa inovadora: a Humans of Fashion Foundation.

A organização oferecerá informação e serviços gratuitos de médicos, terapeutas, psicólogos especializados e advogados para sobreviventes de assédio em quaisquer esferas da indústria, sejam modelos, produtores, fotógrafos e etc.