Modelos plus size estão tendo que emagrecer para conseguir trabalho
Desde que a roraimense Fluvia Lacerda, 36, estourou como modelo, um rótulo a persegue: o de “Gisele Bündchen plus size”. Ela não gosta. “Me atrelaram a uma mulher magra como se me dessem um selo de aprovação”. A situação vem se tornando cada vez mais comum no universo das modelos GG. Criado para contemplar –e exaltar– silhuetas grandes e curvilíneas, o mercado plus size, agora, aponta para um ideal de “magreza”. Modelos de manequim superior a 46 estão tendo que emagrecer para conseguir trabalho.
Aconteceu com Mayara Russi, 28, modelo paulista que veste manequim 52. “Já cheguei a pesar 165 kg. Hoje, estou com 112 kg. Essa perda já foi bem difícil para mim, entrei até em depressão. Ainda preciso emagrecer 15 kg, segundo as exigências do mercado. Isso me deixa bastante chateada.” A circunferência de 137 cm de quadril tem que baixar para 119 cm.
A realidade é completamente diferente daquela de 13 anos atrás, quando começou a modelar. “Eu vestia entre 46 e 48, mas as marcas pediam modelos mais cheinhas. Agora que alcancei o manequim desejado na época, um novo padrão está sendo criado.”
A modelo paulista Daisy da Silva, 23, passa pela mesma situação da colega. Quando começou, há dois anos, vestia 46. “Agora, visto 52. Eu cheguei a ter quatro vezes mais trabalho, principalmente, nesta temporada em que se começa a fotografar campanhas de verão”, conta. Durante um casting chegou a ouvir de um estilista que só seria escolhida depois que perdesse 10 cm de quadril.
“Sei que a fita métrica não define a minha beleza. Só fui entender isso e me aceitar depois que comecei a modelar como plus size. Mas, infelizmente, estou tendo que emagrecer para me manter na profissão. Já procurei uma nutricionista, readequei minha dieta e sigo uma rotina diária de exercícios. É uma baita pressão psicológica.”
Os novos hábitos remetem à adolescência, quando ela agrediu o corpo de diversas maneiras para ficar magra. “Passei semanas à base de dieta líquida, cheguei a desmaiar de fraqueza.” Por isso, lamenta as novas regras de um setor que tinha como apelo inicial a inclusão e valorização da diversidade.
Militante e modelo, a carioca Bia Gremion, 20, veste manequim 60 e sente na pele a falta de representatividade na área. “Não sou agenciada. Já procurei duas agências, mas nenhuma me deu retorno”, diz. A solução foi usar as redes sociais para conseguir trabalho. “Eu não emagreceria pela minha profissão. Não nego, porém, que essa ideia passa pela minha cabeça todos os dias em que perco oportunidade para mulheres mais magras.”
De onde vem as novas regras?
Um dos motivadores, segundo as modelos, foi a recente criação da categoria “curve” nas agências. Na prática, ela se refere a meninas que vestem entre 42 e 44. E o que deveria ser uma nova categoria acabou virando padronização, excludente como qualquer outra.
Essa novidade fez brilhar os olhos de grandes marcas, que enxergaram aí uma oportunidade para adotar modelagens maiores, e dos donos de grandes agências antes focadas em modelos magras. “Curve virou sinônimo de ‘menos gorda’”, explica Mayara. Para Daisy, a criação dessa nova área só contribuiu para a perda de espaço das meninas plus size.
A modelo e primeira Miss Plus Size Sênior Silvia Neves, 43, veste 46. “Sou considerada a PP do plus size”, conta. “Apesar de feliz com as minhas medidas, já fui orientada a emagrecer para virar curve. Para conseguir mais trabalho de lingerie e moda praia, eu precisaria usar entre 42 e 44.”
Com a palavra, os agenciadores
A agência Ford Models, responsável por grandes nomes da moda nacional como Celina Locks e Vivi Orth, viu neste nicho uma boa oportunidade de atuação. Contratou em fevereiro uma booker que se dedica apenas às meninas de tamanhos maiores, mas que não passam do manequim 48. Deborah Neumann prefere o termo “curve” a “plus size”, por achar mais “chique”. Ela reconhece que as marcas que pagam melhor preferem as mais magras.
“Tem uma grande modelo do mercado que só não veio para cá ainda porque está gorda demais”, diz a booker. “Ela não vai trabalhar para grandes etiquetas nem fast fashion, se não emagrecer. É uma exigência da moda como um todo.”
Além das medidas –quadril entre 115 cm e 125 cm e altura entre 1,70 m e 1,80 m–, os agenciadores e estilistas cobram também barriga sequinha, cintura fina e o mínimo possível de celulite das modelos. “As marcas querem uma mulher de corpo violão, sem fazer apologia à obesidade. O apelo sexy vende”, diz Clovis Pessoa, dono da agência Rock MGT, que atua há cinco anos nessa seara.
Para ele, só será possível promover uma mudança efetiva quando as lojas incluírem mais etiquetas grandes em suas araras. “Isso vai incentivar a publicidade a olhar mais para esse mercado e, consequentemente, promover a diversidade. É fato que hoje existe um padrão mais magro dentro do plus size”, afirma.
Entre todas as modelos, um desejo é unânime: dar fim aos rótulos. Quando foi descoberta por um olheiro, Mayara achou que fosse uma brincadeira. Aceitou o convite e sentiu um orgulho enorme de poder mostrar a muitas meninas que não é preciso ser escrava da magreza. “Saber que agora tenho que perder medida é frustrante. Acho que toda profissão tem sua exigência, mas essas cobranças são incoerentes. Estou na moda para quebrar um padrão, não para reforçá-lo.”
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