Falsificação afeta mais a imagem do que o bolso das grifes de luxo

Ainda longe da invenção das máquinas de costura --criada em meados do século 18--, a nobreza europeia mandava fazer seus trajes sob medida; um processo custoso e demorado para a época. A ascendente burguesia esperava ansiosamente pelas novas roupas, para que logo pudesse copiá-las. Desta mecânica de criação e cópia, nasceu o que hoje chamamos de moda.
Mas o termo “cópia” ganhou outros significados nos tempos modernos. Em 2012, a grife norte-americana Coach moveu processo contra Linda e Courtney Allen, mãe e filha que, de Nova York, comercializavam modelos falsificados das bolsas de luxo da marca. A dupla, que já havia sido processada pela Chanel, em 2007, por comercialização de bens contrabandeados, foi sentenciada a indenizar a marca norte-americana em R$ 100 milhões.
Recente também é a tendência dos “produtos inspirados”. Atire a primeira pedra aquele que nunca viu (ou comprou) uma bolsa da Kate Spade, Céline ou Louis Vuitton anunciada assim. Um caso famoso foi a sanção imposta à rede brasileira 284, processada pela francesa Hermès por comercializar uma imitação declarada da bolsa Birkin feita em moletom. A marca nacional foi impedida de vender o produto sob ameaça de pagar multa de R$ 10 mil por dia em que a medida fosse descumprida.
Cópia como reconhecimento
O consumo de falsificações denota que o império das marcas segue robusto. Adquirir um bem ilegítimo é endossar o poder daquele nome, ainda que não se saiba de que empresa se trata. Mas há quem defenda que as cópias prejudicam a marca, uma vez que suas criações são voltadas para um público seleto. A dispersão deixaria o produto marginalizado.
Histórias dão conta de que Coco Chanel ficava felicíssima ao ver os camelôs de Paris vendendo cópias de seu perfume Nº 5. Diz-se que ficava tão lisonjeada com o reconhecimento de sua marca, que chegava a abraçá-los. Da mesma maneira se sente Rony Meisler, estilista da carioca Reserva. Para ele, a pirataria afeta mais o moral que o financeiro de sua marca. “Moralmente, sinto-me homenageado. A falsificação é uma consequência do fato de a demanda e o carinho pela marca serem maiores do que a oferta dela”, completou.
Mas, se as marcas pirateadas desenvolvessem produtos a preços populares, acabariam as falsificações? A questão não é tão simples. O desenvolvimento de uma linha acessível demais pode comprometer o posicionamento de uma marca de luxo. O executivo Fabio Garcia, dono do blog Bolsas de Valor, dá um exemplo: “A Dolce & Gabanna encerrou as operações de sua segunda e lucrativa marca, a D&G. A similaridade entre nomes e publicidade acabava gerando confusões”. A Dior tomou outra atitude ousada: tirou de linha todos os modelos de bolsa que traziam os logotipos, para dificultar as réplicas. “Fazer produtos com certa complexidade de confecção, que são difíceis de copiar, também é uma maneira de se proteger”, explicou Luc Perramond, diretor geral da La Montre Hermès, divisão de relógios da tradicional grife francesa.
A presidente da associação francesa de luxo Comitê Colbert, Elisabeth Ponsolle des Portes, é franca ao falar sobre a influência que a pirataria tem sobre este mercado exclusivo da moda. “Não posso dizer que há impacto no nosso trabalho, mas um problema de imagem. Se o produto circula demais, mata o sonho, explicou a representante do comitê que reúne 75 grifes, entre Baccarat, Cartier, Chanel, Dior, Givenchy, Louis Vuitton, Hermès e Saint Laurent.
Estudo dos pesquisadores brasileiros Genaro Galli e Paula Cristina Hinz mapeou hábitos de consumo de falsificados. Dados do IBGE acusam que, em 2006, roupas e tênis copiados abocanhavam o equivalente a 40% da arrecadação da extinta CPMF, cifra de mais de R$ 12,8 milhões. A estilista Tory Burch é outro importante nome do mercado que argumenta contra essa tendência da imitação. “Este é um assunto sério que ainda não foi abordado como deveria. Vemos que todo mundo é inspirado por todo mundo. Mas, quando você copia algo literalmente, é roubo. A moda é a segunda maior indústria em Nova York e o mercado de falsificados tira milhares de dólares de empresas ao redor do mundo”, falou ela ao UOL.
E quanto às empresas que não são de luxo, mas habitam o imaginário do consumidor? A calçadista Melissa, queridinha das consumidoras jovens, é alvo frequente das falsificações. “O posicionamento é prejudicado, porque o produto falsificado não tem a qualidade que oferecemos e acaba enganando o consumidor”, afirmou Paulo Pedó, gerente de operações da marca. “Para o financeiro é uma concorrência desleal que influencia diretamente nas vendas”.
Querer ter x querer ser
Os falsificados estariam hoje relacionados à necessidade de espelhamento das pessoas. É o que defende Gilda de Melo e Souza, pesquisadora de Sociologia da Moda no Brasil, que explorou o assunto em seu livro “O Espírito das Roupas”. As pessoas hoje em dia têm como referenciais os artistas, pessoas de alto poder aquisitivo e consumidoras de grifes. Junta-se a isso a um poder de compra inferior e a saída acaba sendo as cópias. “As pessoas preferem ser tidas em alta conta pelo que parecem ter a serem tidas pelo que de fato possuem”, afirma o economista Eduardo Giannetti da Fonseca.
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