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É possível trabalhar de qualquer lugar? Blogueiros testam

A blogueira Jaqueline Barbosa, que trabalha enquanto viaja, na Praia Brava, em Florianópolis (SC) - Arquivo Pessoal
A blogueira Jaqueline Barbosa, que trabalha enquanto viaja, na Praia Brava, em Florianópolis (SC) Imagem: Arquivo Pessoal

Yannik D´Elboux

Do UOL, no Rio de Janeiro

17/05/2014 08h05

Desde o início do ano, Jaqueline Barbosa e Emerson Viegas já passaram por Florianópolis, Búzios, Rio de Janeiro, Los Angeles, Barcelona, Berlim e Amsterdã. Ao contrário do que parece, o casal não está de férias. Eles apenas resolveram unir o trabalho ao que mais gostam de fazer: viajar. 

Trabalhar sem endereço fixo é o estilo de vida daqueles que vêm sendo chamados de nômades digitais. Jaque e Eme, como são mais conhecidos, decidiram viver dessa forma para serem felizes no presente, sem esperar pela aposentadoria para realizarem seus sonhos.
 
O casal mantém três sites na internet, inclusive o Nômades Digitais, projeto mais recente com informações sobre suas viagens e esse novo jeito de levar a vida. Abandonar o dia a dia no escritório traz diversas vantagens, porém não significa necessariamente ter mais tempo. “Não trabalhamos menos, apenas trabalhamos em cenários diferentes. E isso é bem inspirador para gente”, diz Jaque, que costuma trabalhar uma média de dez horas por dia.
 
Incluir na rotina um mergulho no mar, um passeio de bicicleta, uma visita a um lugar novo ou até um pulo de parapente são alguns dos benefícios de quem tem a liberdade de trabalhar a qualquer hora, em qualquer lugar. “Já fizemos reuniões com clientes na cachoeira por telefone, na praia, em cafés, na praça, no carro, no avião”, conta Jaque. 
 
Como no caso dos blogueiros, para executar as tarefas de muitas profissões e atividades da atualidade bastam o computador e a conexão com a internet. Entretanto, a maioria das pessoas ainda permanece presa a um mesmo ambiente de trabalho. “É realmente uma incoerência, pois temos os dispositivos e aplicativos móveis necessários para se trabalhar a distância”, afirma Alvaro Mello, coordenador do Cetel (Centro de Estudos de Teletrabalho e Alternativas de Trabalho Flexível) da Business School São Paulo. 


Mudança de mentalidade

Com a tecnologia existente hoje, a liberdade não precisa ficar restrita aos profissionais autônomos. Formas mais flexíveis de trabalho podem diminuir custos para as empresas, melhorar a qualidade de vida dos empregados, aumentar a produtividade e diminuir o trânsito nas grandes cidades, entre outros aspectos positivos. Porém, esse novo modelo exige também uma mudança de mentalidade.
 
Segundo Angélica Nogueira, gerente de RH (Recursos Humanos) da Catho, serviço online de empregos, no Brasil as pessoas estão acostumadas a trabalhar no mesmo ambiente, fazer várias reuniões ao dia e ainda têm essa necessidade de contatos presenciais. “Por esse motivo, mesmo que o profissional possa realizar o trabalho em casa, ainda existem empresas que apresentam mais resistência”, explica.
 
Alvaro Mello destaca que, para que o trabalho a distância seja bem implementado, é fundamental que as empresas e os funcionários preocupem-se com a infraestrutura adequada, do mobiliário aos softwares que serão usados. Além disso, o coordenador do Cetel chama atenção para outros fatores importantes. “Algumas precauções deverão ser tomadas, como evitar o enfraquecimento do espírito de grupo na empresa e as dificuldades de gestão”, ressalta.
 
Segundo projeção da Sobratt (Sociedade Brasileira de Trabalho e Teleatividades), da qual Alvaro Mello também é presidente, atualmente existem 12 milhões de brasileiros que trabalham a distância, com um aumento de 30% da quantidade de empresas que adotam esse sistema por ano. 


Disciplina e planejamento
Rafael Sette Câmara, em Hon Kong, na China - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Rafael Sette Câmara, em Hon Kong, na China
Imagem: Arquivo Pessoal
 

Manter a eficiência sem ter um controle constante, como as cobranças frequentes do chefe, não é para qualquer um. Para conseguir funcionar bem longe da rotina tradicional do escritório, o profissional deve ser autodisciplinado. “Se não tomar cuidado, você vai deixando pra depois”, avisa Rafael Sette Câmara, jornalista e um dos criadores do blog sobre viagens 360 Meridianos, seu principal ganha-pão.

Rafael Câmara, que desde o meio do ano passado resolveu investir de vez na vida de nômade digital, vê a liberdade de forma diferente. Para ele, estar em outro lugar, com tantas novidades para ver, estimula o profissional a não ficar enrolando. “Se você está em Berlim, por exemplo, quer acabar o trabalho logo para conhecer a cidade. Então você tem uma boa motivação para fazer as coisas rapidamente e sem distração”, conta.
 
O blogueiro e jornalista trocou São Paulo e dois empregos pela possibilidade de trabalhar e explorar o mundo ao mesmo tempo. Já passou pela Índia, China, Indonésia, visitou países da Europa e no segundo semestre pretende ficar por um tempo na Argentina. 
 
Dependendo do estilo de vida e do lugar escolhido, os custos de morar fora não são mais altos do que os daqui, o que permite aos nômades digitais trabalhar e viajar mesmo ganhando em reais. Entretanto, para que essa escolha seja sustentável no longo prazo é indispensável um bom planejamento.
 
Jaque e Eme demoraram quatro anos para conseguir transformar o sonho em realidade. Primeiramente, os dois juntaram dinheiro enquanto estavam empregados, na sequência pediram demissão, criaram sua própria empresa, deixaram-na rentável, aumentaram a equipe e só então saíram de São Paulo. “Depois fomos fazendo viagens esporádicas enquanto trabalhávamos ao mesmo tempo, até que finalmente demos o passo para um estilo de vida realmente nômade”, conta Jaque.
 
O home office é o primeiro passo em direção à mobilidade. Na teoria, se o trabalho pode ser feito em casa também tem como ser executado a partir de outros lugares. No Brasil, esse estilo de vida ainda é pouco conhecido. Porém, em suas andanças pelo mundo, Jaque diz que não é raro encontrar nômades digitais. Ela acredita que essa forma de trabalho faz parte de um futuro não muito distante e bem mais satisfatório. 
 
“Com uma dose extra de disciplina, as pessoas que trabalham em ambientes mais inspiradores do que no escritório com certeza são mais produtivas e felizes”, afirma.