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Afeto e limites claros podem manter seus filhos adolescentes longe das drogas

Relações familiares saudáveis são um componente decisivo na hora de o jovem decidir ou não usar drogas - Thinkstock
Relações familiares saudáveis são um componente decisivo na hora de o jovem decidir ou não usar drogas Imagem: Thinkstock

Adriana Nogueira e Ledy Valporto Leal

Do UOL, em São Paulo

04/10/2012 11h48

Faz parte da natureza do adolescente querer testar limites, confrontar, experimentar. Por isso, é crucial preparar o jovem para as oportunidades que, com certeza, virão para que ele prove drogas ilícitas nessa fase da vida. Não há como isolar seu filho diante da ampla oferta na sociedade atual, mas uma postura clara dos pais sobre o assunto –e o vínculo afetivo que foi construído– pode determinar como será a reação do jovem.

"A atenção da família é muito importante e se constrói ao longo da vida, não só na adolescência", afirma Ivone Ponczek, diretora do Nepad (Núcleo de Estudos e Pesquisa em Atenção ao Uso de Drogas) da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).

No artigo "Fatores de Risco e de Proteção para o Uso de Drogas na Adolescência", Miriam Schenker, do Nepad, e Maria Cecília de Souza Minayo, do Centro Latino-Americano de Estudos da Violência e Saúde Jorge Careli, também colocam que "relações familiares saudáveis desde o nascimento da criança servem como fator de proteção para toda a vida e, de forma muito particular, para o adolescente".

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Conversa, muita conversa

Mas, para estabelecer uma comunicação eficiente, os pais têm de buscar compreender o que leva o adolescente a usar drogas, o que passa, entre outros fatores, pela busca de prazer, não de sofrimento. O jovem quer experimentar sensações como extroversão, fazer parte de um grupo, sentir que tem autonomia em relação à família.

Nesse contexto, segundo Vera Lúcia Polverini, do CAPS AD 3 Luís Brant (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas), de Guarulhos (SP), unidade de saúde responsável por atender dependentes de álcool e de drogas, de nada adiantam os discursos sobre os malefícios das drogas feitos por pais que, raramente, conversam com os filhos. O resultado da fala é apenas um sermão desagradável ao qual os adolescentes não dão a menor atenção.

"O discurso do traficante é muito sedutor e a linguagem dele é parecida com a do adolescente. Por isso, a conversa dos pais precisa ser informativa sobre o mundo das drogas e agradável de escutar", diz a especialista.

O quê e como falar

A conversa com o jovem tem de abordar os riscos associados ao uso de substâncias químicas, como a possibilidade de se tornar dependente delas e de comprometer o desenvolvimento como pessoa.

Na construção de um diálogo franco e aberto, é importante que os pais saibam que é imprescindível ouvir muito o que o adolescente tem a dizer, pois ele vai trazer informações sobre o comportamento de sua geração, que os pais desconhecem –e que podem ser esclarecedoras sobre a forma como ela se relaciona com as drogas.

Em seu texto, as pesquisadoras Miriam e Maria Cecília colocam que, na sociedade atual, o uso de drogas tem o mesmo “significado social e psicológico” que a bebida alcoólica teve para gerações anteriores, muito calcado na construção de uma imagem de independência.

Ivone Ponczek diz que uma estratégia que os pais podem utilizar quando o filho se mostra arredio em conversar é buscar a ajuda de uma pessoa com quem o jovem tenha uma relação de proximidade. "Vale um tio, um amigo, namorado ou namorada. Mas tem de ser alguém, verdadeiramente, disposto a ajudar."

E não há regras estabelecidas sobre o que falar com o filho, já que cada família tem seus valores e crenças. Mas Ivone recomenda cautela para os pais que resolvem compartilhar experiências que tiveram com drogas na juventude. "Tem de tomar muito cuidado para a fala não soar como apologia", declara a especialista.

Limites claros

Segundo as especialistas, para "blindar" os filhos contra as drogas, os pais devem deixar clara sua postura em relação ao uso dessas substâncias e estabelecer limites. Permissividade e superproteção também podem influenciar negativamente, assim como rigidez em excesso.

"Atitudes extremas de controle e de policiamento não ajudam. O adolescente pode sentir prazer em driblar a vigilância", afirma Ivone. A especialista do Nepad diz acreditar que famílias muito invasivas –que investigam os pertences pessoais do jovem ou descobrem senhas das redes sociais das quais ele participa– também não ajudam a manter o adolescente longe das drogas.

"O importante é achar o equilíbrio para não ser negligente ou repressor. Há que se descobrir o caminho do meio. Esse é um processo de aprendizado para toda a família", afirma a psicóloga Marília Castello Branco, do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

No papel certo

Os pais não devem cair na tentação de se tornarem melhores amigos dos filhos, como diz o sociólogo e jornalista argentino Sergio Sinay em seu livro "A Sociedade dos Filhos Órfãos" (Editora BestSeller), lançado em maio no Brasil. "O amiguismo paterno é um fenômeno devastador", diz o escritor em um trecho da obra. Sinay afirma que os pais não podem deixar de lado seu papel principal na vida dos filhos, que é o de orientar.

Espelho

Vera Lúcia diz que a postura excessivamente crítica de alguns pais pode ser prejudicial na relação com o filho. "Antes de criticar o adolescente, é preciso corrigir os próprios hábitos, muitas vezes, nocivos."

Um menino que viu a vida inteira o pai tomar muita bebida alcoólica ou uma mãe fumando excessivamente, não consegue encarar com seriedade as palavras dos dois. "O velho ditado do ‘faça o que eu digo, não faça o que eu faço" não funciona mais. Os filhos necessitam de bons exemplos", afirma Vera Lúcia.

Sergio Sinay também destaca, em sua obra já citada, a importância dos pais como um espelho para o filho adolescente. "Não é possível conversar sobre alcoolismo com os jovens com um copo na mão (...). Nossos filhos não refletem apenas nossa imagem; imitam-na e a devolvem para nós", diz em outra passagem.

Monitoramento

Os pais também têm de estar atentos ao comportamento do filho e conhecer de perto o grupo de amigos –e os pais deles– do qual ele faz parte. Só a proximidade e a participação ativa na vida do adolescente vai permitir que notem se ele está deprimido, ansioso, eufórico, triste ou revoltado. Estados que podem ser, simplesmente, parte do turbilhão de emoções que envolvem o jovem nessa fase ou sinal de envolvimento com substâncias tóxicas.

Outra orientação é evitar críticas aos amigos do jovem, o que não quer dizer ignorar com quem o filho anda. Dizer "aquele fulano não presta" ou "aquela menina é drogada" pode soar como ofensa. Afinal, se são seus amigos, é porque ele nutre afeto por aquelas pessoas. O melhor é convidar os colegas para frequentar a sua casa, em reuniões de estudo, para ouvir música ou assistir a um filme. "Os pais podem ficar, discretamente, por perto e observar como se comportam", declara Vera Lúcia.

Uma forma de os pais prepararem o filho para fazer escolhas conscientes passa pelo entendimento de algumas circunstâncias que favorecem o uso de drogas. "O abuso de bebidas alcoólicas abre caminho para uma porção de coisas, inclusive drogas mais pesadas", diz a psicóloga Marília.

"Como o adolescente se acha um ser poderoso e que nada pode acontecer com ele, acaba caindo nessa combinação álcool e drogas, que é muito perigosa", fala Marília, acrescentando que, quando os pais não se sentirem capazes de decifrar o comportamento do filho, é hora de procurarem a ajuda de um profissional da psicologia ou da psiquiatria.