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Depois do 'não pode', a choradeira: veja dicas para lidar com frustração e birra infantis

Criança choradno no supermercado - Getty Images
Criança choradno no supermercado Imagem: Getty Images

Paula Adamo Idoeta

Da BBC Brasil em São Paulo

25/07/2017 16h24

O que fazer quando as crianças querem mexer em coisas na casa dos outros? Ou quando abrem o berreiro em pleno supermercado? O debate sobre comportamento infantil foi intenso nas redes sociais na última semana, tudo por causa de um boneco colecionável.

A história começou quando uma mulher e seu filho de sete anos visitaram uma conhecida e sua sobrinha, dona de uma miniatura do Gavião Arqueiro, personagem dos Vingadores. O menino quis brincar com o boneco, e o pedido foi negado.

As duas mulheres depois discutiram via WhatsApp: a mãe se queixou de que o filho tinha voltado para casa chorando. A colecionadora respondeu que não se tratava de um brinquedo, e sim de um caro item colecionável. "E se ele ficar doente?", questionou a mãe. "Filho é que nem peido, só preciso aguentar o que sai de mim", acabou respondendo a outra.

Entre as milhares de curtidas e compartilhamentos do caso, houve muitas críticas à atitude da mãe, inclusive sugerindo palmadas para dar um "corretivo" na criança, e outras tantas à resposta da colecionadora, considerada "egoísta" por parte das pessoas. Mas será que há formas diferentes - e mais eficazes - de lidar com essas questões rotineiras envolvendo desejos infantis?

A BBC Brasil conversou a respeito com a escritora Elisama Santos, consultora em educação não violenta, método que prega comunicação empática nas relações pessoais e profissionais, e autora do livro "Tudo Eu! Confissões de uma Mãe Sincera".

"De um lado temos uma mãe que quer evitar a qualquer custo a frustração do filho", diz Santos. "(De outro), ainda há muitos pais que batem nas crianças. Quando você bate, é porque acabou sua capacidade de diálogo, e o resultado é que hoje temos uma geração que não sabe conversar."

Santos é advogada de formação, mas se interessou por comunicação não violenta depois do nascimento dos filhos, hoje com 5 e 2 anos de idade. Acabou se especializando em educação parental, que virou tema de livros e palestras.

Para quem acredita que a comunicação não violenta pode deixar a criança despreparada para lidar com uma sociedade geralmente pouco compreensiva, Santos defende que o efeito é o oposto.

"Ensinar meu filho a ter empatia com os demais não significa aceitar tudo passivamente", diz. "Pelo contrário, é entender que os incômodos fazem parte da vida e saber lidar com eles. Se ele apenas aprender a responder violência com mais violência, ele não mudará nada no mundo."

A seguir, ela dá ideias sobre como agir em momentos bem comuns no dia a dia de pais e crianças pequenas - sem se desesperar, mantendo o diálogo aberto e sem precisar recorrer a ameaças ou palmadas:

Quando é preciso dizer não...

Elisama Santos começou a se interessar por educação não violenta após o nascimento dos filhos - Ana Reis - Ana Reis
Elisama Santos começou a se interessar por educação não violenta após o nascimento dos filhos
Imagem: Ana Reis

"Temos uma nova leva de pais que decidiram que não vão usar a violência, mas também não sabem como ajudar a criança a lidar com suas frustrações. E daí, assumem um papel oposto ao que deveriam, de achar que têm que poupar o filho de todas as frustrações", diz Santos.

"É normal uma criança chorar porque quer um brinquedo. Ela tem vontades, desde comer chocolate antes do almoço a não ir para a escola. Entender a vontade é não julgar se esta deveria ou não existir, que é o que a maioria das pessoas faz. Convencer a criança a não querer mais aquilo geralmente não dá certo."

A recomendação da consultora é, ao dizer não, explicar o motivo sem invalidar o ponto de vista da criança. "É dizer 'eu sei que o brinquedinho é legal, e entendo você ter vontade de brincar com ele', entendendo a frustração que vai vir com o meu 'não'."

...E lidar com a frustração

"Com meus filhos, eu os acolho (durante os momentos de frustração) e nomeio seus sentimentos - 'você está triste, você está frustrado' - para que eles os conheçam. A gente acha normal explicar o que é uma mesa e uma cadeira, mas não um sentimento", diz Santos.

"Sem conselhos, sem julgamentos, eu os escuto ativamente enquanto dizem 'mas mamãe, eu queria muito brincar com aquele brinquedo'. Minha recomendação, depois disso, é dizer que a tristeza dói, mas que agora a gente vai dar a volta por cima. E daí eu uso a imaginação. No caso do bonequinho, eu diria para meu filho desenhar o boneco que ele quisesse ou imaginar uma história com o boneco."

Quando as crianças choram em público

Santos é da opinião de que pais que tenham de lidar com crises de choro do filho deveriam aprender a ignorar a opinião alheia. "É triste que olhemos para quem ainda não sabe lidar com seus sentimentos desse modo ruim.

A primeira coisa que costumamos falar nessas circunstâncias é 'não chore'. Daí crescemos aprendendo que o choro por fome é válido e que o choro por medo, tristeza ou colo é 'manha' - um descontrole, algo que não deveria existir. Mas com isso as crianças se tornam analfabetas emocionais, sem ferramentas para lidar com sua raiva, sua angústia."

"Minha sugestão é que os pais foquem em lidar com o choro do seu filho, e não com o incômodo que ele traga aos outros. Se eu for me preocupar com quem está ao redor, me perco e começo a ficar nervosa."

Quando as crianças querem tudo na loja de brinquedos

A tentação das lojas de brinquedos costuma ser irresistível para muitas crianças. Para resistir aos pedidos dos pequenos, Santos sugere que os pais os anotem - apenas isso.

"Quando meu filho pede um presente, eu anoto: ele quer um capacete assim e assado. 'Quando vou te dar? Não sei, filho, agora não tenho dinheiro, mas está aqui, anotado'. A maioria das vezes a criança só quer saber que você validou o desejo dela, assim como nós queremos várias coisas que muitas vezes não podemos ter. Isso torna o processo mais leve e fácil de lidar", explica ela.

"Claro que tem as vezes em que as crianças querem as coisas 'para ontem', e nesses casos eu sugiro usar a imaginação: 'não podemos comprar o brinquedo, mas podemos desenhar e imaginar'. Mas, em geral, as listinhas funcionam bem aqui em casa."

Quando você está com pressa, mas a criança não

"Se você tem pressa para sair de casa, sugiro tentar ser divertido com a criança, ou ela provavelmente vai não colaborar", afirma Santos. "Coloque três pares de sapato no chão e deixe ela escolher qual quer usar; diga que ela é capitã de uma nave espacial e tem que completar diversas missões, que incluem se arrumar para sair."

Mas e se não tiver jeito - a criança não quer entrar no carro? Daí você não precisa negociar com a criança, mas pode retomar mais tarde a conversa. "Nesses casos eu digo ao meu filho 'sinto muito, a gente vai conversar sobre por que você está chateado, mas no momento a mamãe precisa sair."

Quando a ida ao supermercado se torna um estresse

Santos diz que uma das perguntas que mais ouve de pais e mães é: como tornar as idas ao supermercado e ao shopping mais tranquilas? "São lugares com excesso de informação, que causam estresse às crianças porque elas não sabem em que focar sua atenção", diz a consultora. "Uma ideia é dar uma tarefa à criança: 'pegue três maçãs' para as maiorzinhas; organizar as compras no carrinho para as mais novas."

Se o estresse já está em curso porque a criança quer levar o doce, Santos sugere dar um abraço, ouvir sua reclamação, dar nome ao seu sentimento e explicar: "Você queria muito o doce, eu entendo, é muito gostoso. Mas não temos dinheiro (ou não comemos esse doce em dias de semana). Vamos pensar em alguma brincadeira legal."