Topo

"Pressão do mundo da moda me levou a comer apenas 3 maçãs por dia"

Com 1,78m de altura, Victoire Dauxerre chegou a pesar 45kg e teve IMC 14,2 - Divulgação
Com 1,78m de altura, Victoire Dauxerre chegou a pesar 45kg e teve IMC 14,2 Imagem: Divulgação

08/06/2016 17h49

A francesa Victoire Maçon Dauxerre tinha apenas 18 anos e, como muitas jovens da sua idade, se preparava para entrar em uma universidade. Mas um dia, quando andava pelas ruas de Paris, acabou "descoberta".

"Um cara chegou em mim e disse: 'você é a próxima Claudia Schiffer'. Pensei que era piada, e ele falou então que me transformaria em uma estrela. E pediu: 'por favor, me procure e assine (um contrato)'", contou a jovem à BBC.

Aquele momento de 2011 marca não só o começo de sua carreira de modelo, mas também o início de um período de dietas severas que a levaram a se alimentar, durante meses, com apenas três maçãs por dia.

"Eles me disseram: se você quiser ser uma modelo, precisa estar abaixo dos 90 centímetros de quadril."

Longe das passarelas, Dauxerre lançou em janeiro deste ano o livro "Never Skinny Enough: The Diary of a Top Model" ("Nunca Magra o Bastante: Diário de uma Top Model", em tradução literal). Nele, descreve como abandonou tudo para recuperar sua saúde.

45 quilos
Em conversa com a agência de notícias AFP, a jovem contou que ninguém chegou a lhe dizer diretamente que precisava emagrecer.

Porém, ao anunciar que ela participaria da Semana de Moda de Paris, os agentes informaram também os tamanhos das roupas usadas nos desfiles - todos pequenos. E avisaram que Dauxerre teria de caber nas peças.

"Foi quando comecei a comer três maçãs por dia", afirmou a jovem à BBC.

Enquanto trabalhava como modelo, Victoire tinha o corpo muito magro - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Enquanto trabalhava como modelo, Victoire tinha o corpo muito magro
Imagem: Arquivo Pessoal

"Meu pai dizia: 'Victoire, você não pode fazer isso. Tem que comer verduras, peixe, frango'. Como não queria que ele se preocupasse, eu ingeria tudo", relatou. "Acabava tomando laxantes, pois não conseguia vomitar."

No auge de sua anorexia, Dauxerre, que tem 1,78 m de altura, chegou a pesar 45 quilos. Seu manequim diminuiu quatro números.

Abaixo do normal
Para o especialista em gasto de energia John Speakman, professor da Universidade de Aberdeen (Reino Unido), a modelo não estava apenas abaixo do peso: sua vida corria risco.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, qualquer pessoa com IMC (Índice de Massa Corporal) abaixo de 16 apresenta um quadro muito grave de magreza - naquele momento, o da jovem atingiu 14,2.

"Kate Moss, por exemplo, tem um IMC entre 16,5 e 17,5. Cara Delevigne, 17. Atrizes estão todas no mesmo índice: Cameron Diaz tem 17,4, Angelina Jolie, 18,7", afirmou Speakman, ao citar algumas mulheres famosas - e bastante magras.

"Pessoas que têm doenças psicológicas graves como a anorexia nervosa tendem a ter IMCs bem mais baixos que esses, abaixo de 16. Mas a verdade é que você não pode ter um índice abaixo de 13 e continuar vivo", explica o professor.

A BBC analisou fotos da época em que Dauxerre trabalhava como modelo - claramente ela não parecia estar bem de saúde.

Hoje, já recuperada, Dauxerre quer ser atriz - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Hoje, já recuperada, Dauxerre quer ser atriz
Imagem: Arquivo Pessoal

"É, eu era tão magra...", lembra ela. "Você tem que ser assim para que as pessoas vejam apenas um objeto, e não um corpo. Precisa parecer infantil, sem curvas, sem peitos, nada."

"Você acaba percebendo que, se emagrecer, consegue os melhores trabalhos. E aí você quer ser cada vez mais magra, fica feliz quando está magra. É insano, mas é como funciona na indústria da moda."

Dauxerre se afastou das passarelas. Hoje, pesa 56 quilos - e quer virar atriz.

Magreza e modernidade
Para Tony Glenville, diretor-criativo da escola de moda London College of Fashion, do Reino Unido, a atual obsessão pela magreza nas passarelas é uma forma de anular a personalidade das modelos.

"Elas não são modelos com personalidade, daquelas que você reconhece. Só estão lá para andar para cima e para baixo e ilustrar a atmosfera criada pelo designer", disse Glenville à BBC.

Ele conta que a indústria da moda adotou a magreza como um ideal na década de 1920. "Tudo era sem bumbum, sem quadril, sem busto, sem nada. Foram quando surgiram os carros de corrida, os aviões, tudo girava em torno de velocidade e modernidade."

Ser magro deixou de ser tão importante a partir da década de 1930, mas acabou voltando com tudo 30 anos depois.

"Quando chegamos a 1960, começamos a ir cada vez mais rápido. É aí que a magreza se transforma em look padrão", explica Glenville.

"Se você está correndo para todos os lados e fazendo tudo muito rápido, (fica subentendido que) você está em forma e é magro."