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Apesar dos obstáculos, mulheres sauditas resistem no mercado de trabalho

Rodina Maamoun, que trabalha com joias - AFP / FAYEZ NURELDINE
Rodina Maamoun, que trabalha com joias Imagem: AFP / FAYEZ NURELDINE

28/04/2020 12h02

Nem o ultraconservadorismo social, nem o confinamento pela pandemia da covid-19. Nada pode com a vontade das mulheres da Arábia Saudita de entrarem no mercado de trabalho, um espaço ao qual tiveram acesso muito recentemente.

Por um longo tempo, o reino manteve as mulheres afastadas deste mercado, especialmente por estarem sob um sistema de "tutela" que dá a seus "guardiões" o direito de se oporem às suas aspirações profissionais. As poucas mulheres que tiveram acesso ao trabalho estavam nos setores de saúde e educação.

Em 2016, o príncipe herdeiro, Mohamed bin Salman, apresentou o plano "Visão 2030", com o objetivo de diversificar a economia do país, totalmente dependente do petróleo. Em seguida, abriu as portas do mercado de trabalho para milhões de mulheres.

Poucos meses após o lançamento do plano, as primeiras sauditas assumiram cargos de chefia, ou começaram a trabalhar no setor de serviços. Hoje, algumas delas administram bancos, são empresárias, guardas de fronteira, policiais, ou garçonetes.

Recém-formada, Fatima al Dakhil, de 25 anos, foi contratada em janeiro como gerente de compras de uma subsidiária de uma empresa francesa em Al Khobar, no leste do país petrolífero.

Sarah Al Dosari, de 23, procurou emprego por seis anos, até encontrar uma vaga de vendedora em uma loja de roupas em Riade, administrada por três mulheres.

"As pessoas não nos respeitavam, mas agora os clientes dizem que têm orgulho de nós", relata.

O flagelo da pandemia

Depois de quebrar tabus, as sauditas agora precisam enfrentar as consequências da pandemia da covid-19.

País do Golfo mais afetado pelo vírus, com quase 19.000 casos de contágio e 144 mortes declaradas oficialmente, a Arábia Saudita confinou sua população, e a maioria precisa trabalhar de casa.

"No início da crise, eu estava frustrada como nova funcionária e tinha medo de perder o emprego. Mas tento estar tão envolvida em casa quanto se estivesse no escritório", conta Fátima.

"A crise do coronavírus vai passar", espera a jovem, que viu a maioria de suas amigas entrar no mercado de trabalho.

Sua colega Malika Abdelhamid assumiu o cargo de diretora de Recursos Humanos apenas quatro dias antes de as autoridades bloquearem Qatif, no leste, onde ela reside. Desde então, Malika multiplicou suas reuniões virtuais, recorrendo ao aplicativo Zoom.

No terceiro trimestre de 2019, havia mais de um milhão de mulheres sauditas no mercado de trabalho, ou seja, 35% da população ativa. Elas também são maioria (84%) entre os desempregados do país, que tem um alto índice de desemprego.

A presença de mulheres no trabalho é uma coisa muito positiva, diz Rodina Maamoun, que foi, há três anos, contratada pelo dono de cinco lojas de acessórios femininos para "feminizar" a equipe.

"Os clientes, especialmente as mulheres, se sentem mais à vontade com as vendedoras. As vendas e os lucros aumentaram", celebra.

No total, foram contratadas 19 mulheres, para substituir algumas equipes antes formadas apenas por homens.

Hoje, além do acesso ao mundo do trabalho, as sauditas podem dirigir e obter um passaporte sem a autorização de um parente do sexo masculino.

Apesar dessas mudanças na sociedade, as ONGs denunciam o príncipe herdeiro, especialmente pela forte repressão sofrida por pessoas críticas ao reino, como as ativistas que lutaram para obter o direito de dirigir. De acordo com suas famílias, elas foram presas e torturadas.