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Xan Ravelli

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Abuso infantil: veja 5 dicas para falar de sexo e consentimento com criança

Colunista trabalhou com vítimas de assédio sexual infantil e ensina algumas maneiras de conversar com os pequenos sobre abuso - iStock
Colunista trabalhou com vítimas de assédio sexual infantil e ensina algumas maneiras de conversar com os pequenos sobre abuso Imagem: iStock

Colunista de Universa

18/04/2021 04h00

Na última semana, a Agência Pública publicou uma reportagem em que revela acusações de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes contra Samuel Klein, fundador da rede Casas Bahia, falecido em 2014. Trata-se de um texto muito bem detalhado, que recomendo fortemente a leitura, caso tenha estômago e disposição — visto que os relatos ali têm potencial para estragar o seu domingo.

Trabalhei por muitos anos com crianças vítimas de abuso sexual. Ouvi suas histórias, vi seus traumas, acompanhei o crescimento e a transformação de meninas em adolescentes e mulheres. Ouvi os choros, as dores, as mágoas. Ainda me lembro do sentimento que me acompanhava na volta para casa, sozinha no carro, até chegar a um lar cheio de afeto, comida e segurança.

O sentimento era de profundo fracasso. Fracasso enquanto sociedade, sabe?! Onde estavam pais e mães dessas crianças? Onde estavam professores, vizinhos, parentes, adultos próximos?

Dados mostram que o Brasil não liga para a vida das mulheres e dos pequenos. E quando olhamos para os negros, a coisa fica pior. Na prática, pouco vale o artigo 227 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), presente na Constituição brasileira, em que se lê: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao lazer e à profissionalização, à liberdade, ao respeito, à dignidade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência crueldade e opressão."

A sociedade se isenta de vigiar o que acontece ao lado, sendo que é dever de todes prestar atenção nos sinais de violência nas casas vizinhas, nos adultos que abordam crianças em parques, praças e na internet

Tão urgente quanto isso, acredito, é a promoção da educação sexual em escolas e em casa. Nem vou entrar no mérito de que isso não quer dizer ensinar crianças e adolescentes a transar ou expor menores à pornografia. A base fundamental da educação sexual consiste em estabelecer quais limites devem ser respeitados em relação ao nosso próprio corpo e ao corpo de outra pessoa

Por essa definição, já dá para perceber a quem interessa que crianças e adolescentes não sejam educades, ou ainda quem se beneficia da manutenção da falta de credibilidade da palavra dos pequenos.

Só abusadores, preconceituosos e moralistas de fachada são contra a educação sexual

Por isso, separei algumas dicas que podem ajudar na prevenção e detecção de casos de abuso. Elas servem para todos que convivem com crianças, ainda que só de vez em quando:

Mostre exemplos e referências

Aproveite reportagens ou produtos da cultura pop para conversar sobre relacionamentos saudáveis com sexo consensual e seguro.

Seja didático e compreensivo


Evite usar ameaças, como "você vai para o inferno", "vai engravidar", "vai pegar doenças". Não sei se funcionou para vocês, mas para mim não funcionou e para maioria das pessoas que conheço também não. É preciso abrir espaço para diálogo sem julgamentos para que os adolescentes se sintam confortáveis ao compartilhar relatos, tirar dúvidas sobre gravidez e riscos do sexo sem maturidade.

Atenção em casa com parentes


Mantenha os olhos abertos e atentos dentro de casa, perto da família, lembrando que a maior parte dos crimes sexuais acontece no ambiente doméstico.

Os agressores são pais, padrastos, avôs, primos, padrinhos e outros. Para atenuar os efeitos do abuso, os algozes usam até soníferos, analgésicos e lubrificantes. Pergunte às crianças: 'O papai deu banho em você, meu amor? Me conta como ele te limpou' ou ainda 'Brincou com seu primo? Como vocês brincaram? Doeu?'

Dê nome às partes do corpo


Ensine os termos corretos às crianças. Apelidos são naturais, mas é importante que elas identifiquem e compreendam o que significa seio, pênis e vagina desde pequenas. Enfatize que NINGUÉM pode tocá-las, exceto os cuidadores responsáveis pela higiene. Para adolescentes que já se relacionam, reitere que os toques devem ser consensuais e prazerosos para ambos que participam da ação.

Cuidado com a internet

Observe em quais sites as crianças navegam na internet, com quem falam nos chats e que tipo de jogos que baixam. Com informação e responsabilidade, quem sabe não teremos uma geração mais preparada para se defender, mas também compreender a própria sexualidade com segurança?

Como denunciar a exploração sexual infantil

O Disque 100 registra ocorrências de crimes cometidos contra criança, adolescente, pessoa idosa ou pessoa com deficiência. Esse canal de denúncia também pode ser acionado pela internet, por meio do aplicativo Proteja Brasil, com download gratuito em celulares com sistemas operacionais iOS e Android.

Outros canais de denúncia, além do Disque 100, são o Disque 180, o app Direitos Humanos BR e as delegacia eletrônicas. Caso a pessoa esteja presenciando uma situação de violência contra criança ou adolescente, ela deve chamar a polícia militar pelo telefone 190.