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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Dia do Orgulho Hétero: e macho precisa de data para passar vergonha?

Vereador Tenente Coronel Paccola aprova projeto de orgulho heterosexual  - Reprodução
Vereador Tenente Coronel Paccola aprova projeto de orgulho heterosexual Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

23/12/2021 13h06

Nos últimos anos, há um certo fetiche no Brasil pelo Dia do Orgulho Hétero, uma ideia bizarra que se prolifera pelos grupos de WhatsApp do país junto com a ideia da existência do kit gay (que nunca existiu) e o racismo reverso (que também não existe).

No caso do Dia do Orgulho Hétero, vez ou outra um vereador desconhecido em busca de atenção tenta aprovar o projeto em sua cidade.

No finalzinho de 2021 (como se não desse para o ano piorar), um deles conseguiu. Os vereadores de Cuiabá aprovaram quase que por unanimidade, em uma primeira votação, o projeto do vereador Tenente Coronel Paccola, do Cidadania. Só houve um voto contra, da vereadora Edna Sampaio, do PT. Sim, é chocante, mas 15 vereadores da cidade concordaram com a ideia. O projeto ainda precisa ser votado em segundo turno para ser implementado.

Mas por que essa obsessão em ter um dia para chamar de seu?

Vamos lá: os adeptos da ideia acham que merecem um dia para chamar de seu porque existe o Dia do Orgulho Gay. Para esses, temos que explicar pela décima vez que o Dia do Orgulho Gay existe porque marca a luta por direitos de pessoas que são perseguidas. Em alguns países, a homossexualidade é crime. E, em muitos lugares, como no Brasil, LGBTs são assassinados por causa de suas orientações sexuais. O Brasil, por exemplo, é o país que mais mata transexuais no mundo.

Já nós, héteros (tá, admito, eu sou também, apesar de não ter o menor orgulho disso) sempre fomos a "norma". Nunca fomos perseguidos por causa de nossa orientação sexual.

Mas não, no mundo paralelo onde os apoiadores do orgulho hétero vivem, eles estariam sendo oprimidos por LGBTs, que andam por aí fazendo o "absurdo" de exigir respeito. Essas pessoas devem sentir falta de quando a agressão era legalizada. Já hoje, a vida para elas anda difícil, já que nem podem fazer piadas de gays em paz. Tadinhas. Só que não.

Essas pessoas vivem também em um mundo fictício onde o Pabllo Vittar vai ser presidente (quem dera!) e uma "ditadura gay" será instalada.

O autor do projeto, o Tenente Coronel, explicou em suas redes sociais que decidiu criar o dia depois de conversar com os filhos e sobrinhos e perceber que "na escola, para participar de certos grupos, eles teriam que beijar meninos e meninas". Ai, a autoestima hétero. Quem disse que meninos e meninas iriam querer beijar os familiares do Coronel?

Ele disse ainda que o objetivo principal do projeto é que não "destruam o formato tradicional de família". Sim, eles insistem nessa ideia de que são ameaçados. Ou, continuam "se vitimizando", para usar uma das expressões que adoram.

A cidade de Cuiabá não vai passar vergonha sozinha. Existem projetos de Orgulho Hétero na Paraíba e no Rio de Janeiro. Essa é quase uma tendência.

O que essas pessoas parecem não entender é que hétero não precisa de dia para passar vergonha. Sim, como diria o meme, "todo dia tem um hétero passando vergonha".