Topo

Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Caso de Britney prova que nem uma popstar milionária escapa da violência

A vitória de Britney nos tribunais e sua liberdade devem, sim, ser celebradas. Mas é preciso também que a gente fique atento para que esse tipo de coisa pare de acontecer de uma vez por todas - Reprodução/ Instagram
A vitória de Britney nos tribunais e sua liberdade devem, sim, ser celebradas. Mas é preciso também que a gente fique atento para que esse tipo de coisa pare de acontecer de uma vez por todas Imagem: Reprodução/ Instagram

Colunista do UOL

14/11/2021 12h32

A cantora Britney Spears passou quase 14 anos de sua vida sem poder fazer coisas básicas, como encontrar os amigos que quisesse, viajar com o namorado, marcar um terapeuta ou comprar coisas para os filhos.

É assustador, mas passamos anos vendo uma popstar milionária sendo obrigada a trabalhar sem parar e sendo privada de qualquer liberdade por um grupo de homens, capitaneados por seu pai, Jamie Spears, que em 2008 usou um colapso mental sofrido por Britney para conseguir uma tutela sobre a vida da filha.

Desde então, ela não podia dar um telefonema que fosse sem autorização do pai e da equipe escalada por ele, formada por advogados e terapeutas que transformaram a vida dela em um inferno. Britney era obrigada a trabalhar, fazia shows para milhões. E não ficava com o dinheiro.

Parece filme de ficção. E é ainda mais assustador pensar que tudo isso aconteceu na frente de milhões, com uma cantora famosa no mundo todo.

Há anos fãs já gritavam pela liberdade da cantora através do movimento "Free Britney". Foram eles, junto com amigos de Britney e jornalistas, que ajudaram a cantora a ter uma vitória histórica essa semana: aos 39 anos, Britney foi considerada livre e responsável por si mesma na sexta-feira (12). Seu pai não tem mais nenhum direito sobre sua vida. Ela recuperou, finalmente, sua liberdade.

Qualquer um que goste de Britney ou preze pela liberdade das mulheres tem motivos para comemorar.

Mas é chocante que tudo isso tenha acontecido com Britney, uma mulher famosa no mundo todo, milionária. Isso prova que mesmo agora ainda é possível inventar que uma mulher é louca e sem condições de gerir a própria vida para escravizá-la.

Quantas mulheres perderam seus filhos e sua liberdade pela suposta "doença mental", ou por serem consideradas "incapazes" de gerir a própria vida? Esse é um tipo de história que lemos nos livros e em filmes sobre mulheres do século 19, quando era comum que elas fossem mandadas para sanatórios para curar suas "histerias".

Quantas outras mulheres ainda são vítimas desse tipo de prisão?

No caso de Britney, ela passou por quase um cardápio das formas mais comuns de violência contra mulher.

Em depoimento para a corte em junho, ela contou que não era levada a sério (toda mulher, em alguma medida, já passou por isso), que foi obrigada a usar um DIU (uma forma de controle do corpo da mulher), sofreu abuso emocional e moral do pai, que a chamava de louca, e foi dopada por seus terapeutas.

É uma história de horror. A vitória de Britney nos tribunais e sua liberdade devem, sim, ser celebradas. Mas é preciso também que a gente fique atento para que esse tipo de coisa pare de acontecer de uma vez por todas.