Topo

Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Enzo erra, Felipe Neto defende. Por que homens brancos sempre se protegem?

Enzo Celulari - Reprodução/Instagram
Enzo Celulari Imagem: Reprodução/Instagram

Colunista de Universa

27/05/2021 12h53

Ontem, o empresário e influenciador Enzo Celulari fez uma pergunta no Twitter: "Consumo de carne no Brasil cai pra menor nível em 25 anos: é o preço que tá alto ou os consumidores que estão mais conscientes?" Claro que essa é uma dúvida sem noção e de quem vive em uma bolha, já que mais de 116,8 milhões de pessoas não se alimentam (em quantidade ou qualidade) como deveriam, segundo pesquisa da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Há 14,5 milhões de famílias brasileiras vivendo na pobreza extrema.

Depois de fazer essa pergunta, Enzo passou a ser criticado e foi alvo de piadas. Normal. Ele apagou o comentário no Twitter, então, deve ter se arrependido. Todo mundo tem direito a errar e as pessoas também podem criticar. Assim é a vida e, mais ainda, as redes sociais. Como disse uma amiga, Enzo levou um "sacode pedagógico". Aquelas críticas que fazem para que a gente acorde. O próximo passo seria ele pedir desculpa. E ficaria por isso mesmo. Com o tempo, todo mundo ia esquecer.

Esse seria mais um dia normal no Twitter se o mega influenciador e youtuber Felipe Neto não tivesse escrito: "O hater é de uma arrogância intelectual tão pedante. Sim, o cara é filho de 2 milionários. Óbvio que ele não tem noção da realidade econômica da pobreza no Brasil", saindo em defesa do Enzo e chamando quem o criticou de hater, o que não deixa de ser ofensivo, ninguém quer ser um "odiador de internet".

Assim que vi isso, lembrei, instantaneamente, de como os homens brancos se defendem. Pode reparar. É só um deles ser criticado que aparecem outros para falar que o coitado está sendo atacado, que isso não é justo etc. A pessoa, no caso de Enzo, um homem adulto, não tem nem tempo de se defender. Ele é tratado como um ser infantil, frágil, incapaz de enfrentar críticas sozinho, sofrer com elas e aprender.

No caso do Twitter, a treta cresceu porque Felipe passou a bloquear várias pessoas, grande parte delas mulheres negras, que foram criticar sua defesa instantânea e falar sobre o "pacto narcísico da branquitude" (uma espécie de aliança que perpetua o racismo).

Na internet (e na vida), mulheres e negros (e mulheres negras mais ainda) são as pessoas que mais sofrem ataques on-line. E, na maioria das vezes, temos que nos defender sozinhas. Fora da internet também, já que negros são alvos de racismo, nós, mulheres, de machismo, e os gays sofrem com a homofobia. Com a maioria dos héteros brancos costuma ser diferente. Apesar de menos atacados, ou de receberem ataques carregados de menos ódio, eles são os mais defendidos, inclusive por mulheres.

Já vi isso acontecer várias vezes. Em uma delas, um conhecido influente, muito gente boa e querido foi muito criticado e chamado de machista por causa de um texto. Logo, muitas amigas saíram em sua defesa, falando que ele estava sendo "atacado", que não merecia essa "violência" etc. Só que, no caso, assim como aconteceu com Enzo, nem tinha havido violência! O sujeito não tinha sido ameaçado ou xingado, apenas criticado. E, claro, ele conseguiria lidar com isso e poderia se defender sozinho.

Nós mesmas mimamos os caras e os tratamos como se eles não soubessem se defender. Claro que nada disso é consciente. Essa defesa acontece quase que por instinto. Nessas, acho que até os sujeitos que erram acabam perdendo. É igual acontece com crianças. Se toda vez que ele tiver um conflito na escola e a mãe for correndo se meter e defender, ele vai aprender a fazer isso sozinho?