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Nina Lemos

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

"Thelma e Louise" faz 30 anos e ainda seria transgressor se estreasse hoje

Susan Sarandon e Geena Davis em cena de "Thelma & Louise" (1991) - Divulgação
Susan Sarandon e Geena Davis em cena de "Thelma & Louise" (1991) Imagem: Divulgação

Colunista de Universa

25/05/2021 04h00

Cansadas de suas vidas chatas e seus parceiros machistas, duas amigas decidem sair de férias de carro. No meio da viagem, uma sofre uma tentativa de estupro. Sua amiga, dando uma lição radical de sororidade, literalmente mata o estuprador.. Esse é um resumo básico de "Thelma e Louise'', o icônico filme estrelado por Geena Davis (Thelma) e Susan Sarandon (Louise). É chocante, mas esse filme super atual faz 30 anos (!) nesta semana. "Thelma e Louise" estreou nos cinemas dos EUA e do Canadá, no dia 24 de maio de 1991.

Há 30 anos, o feminismo não estava na moda ou na boca de todas as garotas. Também não existiam termos como "empoderamento", "sororidade" e "masculinidade tóxica". Também não falávamos abertamente sobre cultura de estupro e como isso tinha que ser combatido. Deve ser em parte por isso "Thelma e Louise", dirigido por Ridley Scott em cima do roteiro de Callie Khouri, é um clássico, um daqueles filmes que vão ficar para sempre.

E, desde então, ninguém conseguiu fazer um filme tão bom sobre a parceria de duas mulheres e tão deliciosamente feminista.

Assisti ao filme de novo (uns 25 anos depois) e, sim, "Thelma e Louise" ainda é atual. Isso não deixa de ser péssimo, já que mostra que, apesar do feminismo e de todos os avanços, algumas coisas ainda não mudaram, principalmente a cultura do estupro, que na época não chamávamos disso, mas já era a mesma coisa.

No filme, depois de dançar com um sujeito em um bar de beira da estrada, Thelma sofre uma violentíssima tentativa de estupro.

Sua amiga usa uma arma que elas levaram na viagem para salvar a amiga. Mas, mesmo com uma arma apontada para a cabeça, o cara ainda a chama de vagabunda e outras coisas. Ela atira.

Na cena seguinte, quando elas pensam no que fazer, Thelma sugere que elas procurem a polícia e contem o que aconteceu. "Vamos falar a verdade, que ele estava me estuprando". "E quem ia acreditar na gente? Você dançou com ele!", responde a amiga.

E não é assim que acontece até hoje? Se uma mulher "dança", "conversa", ou "sobe no quarto" do fulano, vai ser fácil para ela provar que foi estuprada? Ou vão achar que ela "provocou"? Sim, trinta anos se passaram e pouca coisa mudou nesse aspecto.

Depois do crime, as duas saem de carro tentando chegar ao México, encontram a liberdade e se vingam de homens podres que encontram pelo caminho. Em uma das cenas mais clássicas, elas explodem o caminhão de um sujeito que as aborda falando: "Querem ver o meu p*?". "Você faria isso com a sua irmã, com a sua irmã, você não conhece a gente, por que você faz essas coisas nojentas, elas perguntam?"

Na época, o filme fez um grande sucesso. Mas foi também visto como algo perigoso, o início de uma espécie de era das "feminazis violentas" (e não, esse termo ainda não existia, mas mulheres livres e feministas sempre causaram pavor).

O fato do filme ser protagonizado por duas mulheres, ainda mais um "road movie" de aventura, também causou surpresa. Afinal, quem protagoniza filme matando gente e sendo herói são? os homens. Na época, Schwarzenegger fazia sucesso como o exterminador do futuro.

Trinta anos se passaram. E mulheres ainda precisam brigar para ter o mesmo espaço e respeito que os homens nos cinemas?

E, sim, Thelma e Louise ainda são atuais e ainda têm muito o que ensinar para as garotas que ainda não eram nascidas na época em que as personagens arrasaram nos cinemas.

É possível ver o filme (e vale a pena) no Telecine Play. Se é a sua primeira vez, um aviso. A cena de estupro é pesadíssima e pode, sim, provocar gatilhos. Hoje em dia, dificilmente uma cena daquelas estaria presente em um filme. Se achar melhor, pule essa parte.