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Nina Lemos

Merkel, mulher mais poderosa do mundo, tem muito a ensinar a Bolsonaro

A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, durante anúncio de novas restrições para conter o coronavírus - Fabrizio Bensch/POOL/AFP
A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, durante anúncio de novas restrições para conter o coronavírus Imagem: Fabrizio Bensch/POOL/AFP

Colunista do UOL

10/12/2020 04h00

"Se a gente não diminuir os contatos e esse for o último Natal que passamos com nossos avós, a gente vai ter falhado. Não podemos deixar isso acontecer." Angela Merkel, chanceler da Alemanha, disse isso em um discurso emocionado ontem no parlamento alemão.

O discurso foi um apelo contundente para que a população e os governantes agirem com responsabilidade. E também um aviso de que um novo lockdown radical está sendo planejado no país para os próximos dias. A chanceler parecia estar emocionada e realmente muito preocupada.

Segundo jornalistas locais, raramente ela foi tão emocional em sua carreira. A chanceler é conhecida por ser uma mulher prática, quase fria. E não seria esse um um estereótipo usado para mulheres muito poderosas?

Nunca ouvir dizer que um presidente homem é frio, apesar de alguns deles, caso de Jair Bolsonaro ter reagido da seguinte maneira em abril ao comentar as mortes por Coronavírus no país. "E aí? Lamento. Quer que eu faça o que?"

Pois no mesmo dia em que mais um vídeo com Bolsonaro rindo com o Coronavírus viralizava na internet (no vídeo, de 27 de novembro, ele faz uma piada homofóbica sobre um "tratamento com ozônio para Coronavírus e gargalha), Angela Merkel apelava e dizia que "com a ciência não se negocia". Ela lamentava também, indignada, o fato de o maior número de mortes em um dia ter sido registrado no país, 590, ter sido registrado na quarta-feira. "Não podemos aceitar quase 600 mortes um dia e no outro dia, e de novo".

Ao fazer o discurso, olha só, ela pensava nos outros!

Sim, isso é possível vindo de um chefe de estado (não deveria ser a função de um líder? Pensar nos cidadãos?). A medida de um novo lockdown é impopular e complicada. Mas Merkel está pensando na vida das pessoas.

Angela Merkel não é uma "líder qualquer". Ela foi eleita essa semana a mulher mais poderosa do mundo pela revista Forbes. A eleição de mulheres mais poderosas existe há 17 anos. Angela Merkel, que completou mês passado quinze anos no poder, vence a lista há dez anos.

Segundo os editores da revista, esse ano as mulheres tiveram um papel fundamental na luta contra o Coronavírus e crise econômica. Caso de Merkel e Jacinda Ardern, a primeira ministra da Nova Zelândia.

Uma das coisas que torna essas mulheres especiais é não só o poder de gestão de crise, mas uma qualidade que faz muita diferença em épocas de pandemia: a empatia.

Pois é. Devia ser esperado que qualquer chefe de estado soubesse que pessoas não são números e que todas as mortes causadas pela pandemia são tragédias para suas famílias. Mas, de novo, o que estamos vendo é governante fazendo piada com a dor da população.

Por isso, até emociona ver uma chefe de estado falar: "eu sinto muito do fundo do meu coração. Mas se o preço que nós pagamos [por cidadãos estarem muito relaxados com a pandemia] são quase 600 mortes por dia, isso não é aceitável do meu ponto de vista".

Mandei o discurso de Merkel para amigas de preferências políticas variadas. A maioria deles chorou de emoção.

A chanceler quer convencer os governadores de estados a concordarem com um lockdown radical no país, uma decisão difícil. Não se sabe ainda se ela vai ter sucesso na empreitada. Mas ela enfrenta esse desafio pensando nos outros, respeitando a ciência e não gargalhando.

A mulher mais poderosa do mundo tem muito a ensinar a certos líderes. Muito.