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Nina Lemos

"Ansiosa para conhecê-la": Por que Merkel celebra vitória de Kamala?

Jonathan Ernst/Reuters
Imagem: Jonathan Ernst/Reuters

Colunista do UOL

09/11/2020 17h41

"Kamala Harris, como primeira mulher e filha de imigrantes na posição, é uma inspiração para muitas pessoas. E também um exemplo das possibilidades americanas."

A frase foi dita nesta segunda-feira (9) pela chanceler alemã Angela Merkel em uma conferência para lembrar os 31 anos da queda do muro de Berlim. Na ocasião histórica, a chanceler aproveitou para mandar felicitações para os novos eleitos nos Estados Unidos e lembrar a longa amizade entre os dois países. No caso de Kamala, ela disse ainda que "estava ansiosa para conhecê-la".

Esse estilo quase emocional é raro em se tratando de Angela Merkel, conhecida por sua calma e neutralidade.

Os desentendimentos de Merkel com Donald Trump nunca foram segredo para ninguém e todos sabem que ela preferia que Joe Biden ganhasse as eleições. Mas no caso de Kamala Harris o cumprimento tem outra razão especial.

Harris é um caso raro de mulher a ocupar posição chave na política mundial, posição que Merkel, nos mais de 15 anos em que é chanceler, ocupa praticamente sozinha.

Isso porque mulheres na política ainda são uma exceção. E, no caso de chegar a uma posição como, por exemplo, líder de um país no G20, são raríssimas. Dilma Rousseff chegou lá e nos seis anos em que foi presidente, manteve relação de respeito mútuo com a chanceler alemã. Ela já contou que recebeu uma carta da alemã durante o processo de impeachment.

As histórias de Angela Merkel e Kamala Harris ainda guardam mais semelhanças. As duas são mulheres bem-sucedidas em suas profissões.

Kamala é advogada e promotora. Merkel, PHD em física, criada na antiga DDR (a Alemanha comunista). Pessoas do leste ainda são tratadas com preconceito na Alemanha. Ser mulher e do leste torna o seu feito ainda mais difícil. Kamala, filha de imigrantes e negra, teve que vencer ainda mais preconceitos.

Na vida pessoal, as duas são casadas com homens dedicados e discretos. Kamala, com o advogado Doug Enhoff. Angela Merkel, com o professor Joachim Sauer, professor de química quântica na Universidade de Humboldt. Ele raramente aparece, não costuma viajar com Merkel, mas já foi clicado em um encontro do G7 cercado pelas primeiras damas.

A outra líder de destaque do momento é a primeira ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern. Ela tem 40 anos e assumiu o cargo de primeira-ministra com 37. Além de ser conhecida por sua boa administração e postura humana (a Nova Zelândia é exemplo mundial no combate ao Coronavírus, por exemplo) Jacinda também quebrou tabus. Ela é conhecida por ser a primeira líder a tirar licença maternidade no Cargo (ela teve uma filha em 2018).

Infelizmente não são só essas listas de tabus quebrados e títulos que as mulheres em posição de poder no mundo têm em comum. Elas são também, ainda, vítimas de preconceitos. No início de sua carreira, Angela Merkel tinha que aguentar piadas relacionadas ao seu corte de cabelo e suas roupas. Mas o exemplo mais marcante é mesmo o do Brasil: Dilma Rousseff foi chamada, entre outras coisas, de "DilmAnta", "louca", além de ter sofrido ataques, inclusive, pornográficos.

Kamala Harris já deve estar preparada para enfrentar machismo e preconceito. Antes mesmo de ganhar a eleição, ela foi notícia no mundo todo depois de ser interrompida durante um debate político com o vice de Donald Trump, Mike Pence. Ela mostrou que sabe se defender muito bem ao dizer "desculpe, eu estou falando" várias vezes. Que assim continue. Não vai ser fácil.