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REPORTAGEM

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Advogada e mãe solo, ela cria conteúdo acessível sobre Direito de Família

Advogada e mãe solo, Pâmela Souza conquista seguidores publicando vídeos informativos e irreverentes sobre Direito de Família no Instagram (Imagem: Arquivo pessoal)  - arquivo pessoal
Advogada e mãe solo, Pâmela Souza conquista seguidores publicando vídeos informativos e irreverentes sobre Direito de Família no Instagram (Imagem: Arquivo pessoal) Imagem: arquivo pessoal

Colunista de Universa

23/03/2022 04h00

"Se a mãe sair pra se divertir, perde a guarda do filho" / "O homem que tiver mais condições financeiras que a mulher, fica com a guarda das crianças" / "Se a mulher trair o marido ou sair do lar, perderá a guarda"

É bem provável que ao longo da vida você já tenha escutado pelo menos uma dessas afirmações - e até acreditado. O que talvez não saiba é que esses são os três maiores mitos do Direito de Família, não são verdade. Quem explica, em uma série de vídeos irreverentes e informativos no Instagram, é a advogada Pâmela Sousa, especialista na área. A advogada, que inclusive é mãe solo, se formou em 2011, mas passou a se dedicar exclusivamente ao Direito de Família para defender os interesses do filho, Pedro Paulo, que nasceu em 2018.

"Quando meu filho nasceu, fiquei desesperada, como muitas mães. Não foi uma gestação planejada. Tive sérios problemas com a maternidade, e ainda tenho, só que, como mulher, não tive opção. Tive que internalizar que naquele momento eu era mãe e, diante das minhas obrigações, assumir as consequências das minhas escolhas. Por outro lado, embora a maternidade tenha me trazido várias limitações - porque eu não romantizo a maternidade -, nasceu meu desejo pelo Direito de Família", expõe.

Maternidade compulsória, paternidade opcional

Para a advogada, um dos maiores problemas do judiciário é que a maioria dos juízes, promotores, advogados e até das mulheres entende que a maternidade, na prática, é compulsória; já a paternidade, opcional.

"Senti na pele todas as dificuldades que uma mulher sente, mesmo sendo advogada. A gente começa a perceber que as crenças culturais e o mundo machista em que vive faz com que a gente tenha preconceitos consigo mesma. Depois de enfrentar tudo isso, passei a produzir conteúdo para as redes."

O trabalho no Instagram, que começou há nove meses, tem feito sucesso. De lá pra cá, o perfil com informações sobre Direito de Família conquistou quase 40 mil seguidores. A grande maioria, 97%, são mulheres.

"Você começa a se deparar com um público carente, que não tem acesso à informação. E aí começa a perceber a importância do seu trabalho, o quanto pode modificar a vida de uma pessoa. De algum modo, sinto que renovo as esperanças de ainda acreditarem na justiça", diz a advogada.

A exposição nas redes chamou a atenção não só de um público ávido por informações jurídicas, mas também do ex de Pâmela, que chegou a fazer ameaças à advogada e à mãe dela.

"Eu já tinha problemas com ele em relação ao exercício parental. Posto muito do que vivo porque sei que muitas mulheres sofrem pelas mesmas experiências. Essa é uma forma de mostrar pra elas que não estão sozinhas, que isso é um problema social. Ele mandou mensagens à minha mãe e a mim, e ameaçou me denunciar à OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). É uma forma de me retaliar. Eu nem ligo, é problema dele. Eu quero que ele exerça a paternidade e cuide do meu filho bem. Se ele fizer isso, o que ele acha de mim é problema dele", rebate.

Guarda compartilhada (e sobrecarga materna)

Pâmela esclarece que, perante a justiça, pais e mães têm os mesmos direitos e deveres. Quanto à guarda, visando o bem estar da criança, a regra é que seja compartilhada - ainda que na maioria dos casos haja sobrecarga materna.

"O objetivo da guarda compartilhada é fazer com que a criança tenha acesso e conviva com ambos os genitores. Geralmente essa convivência é feita esporadicamente, que seria a cada 15 dias, e também durante as férias e no Natal. Existem algumas regulamentações sobre isso. Porém, mesmo diante dessas regulamentações, eu entendo que há sobrecarga. A labuta maior fica com a mulher. Via de regra, a guarda compartilhada seria para poder partilhar responsabilidades como levar ao dentista, ao médico... Deveria ser isso. Que o pai pudesse exercer ativamente as responsabilidades cotidianas daquela criança, mas, na prática, a gente sabe que não é isso que acontece."

"Precisamos educar os meninos de uma maneira diferente para que, no futuro, essa paternidade seja de mais responsabilidade"
Para Pâmela, o fio condutor de uma paternidade mais efetiva e responsável é a educação.

"Hoje eu vejo a paternidade no Brasil errada, obviamente, mas ela é assim porque é o que as pessoas ensinam. Se aquela criança, aquele menino foi criado desde pequeno com aquela educação, dificilmente vai ter condutas diferentes daquilo que aprendeu. A gente precisa educar os homens de uma maneira diferente para que, no futuro, essa paternidade seja de mais responsabilidade. Claro que têm aqueles casos em que o homem se aproveita do sistema, o homem que sabe que está errado e não faz questão de mudar. Mas existem alguns casos em que eu percebo que há falta de consciência do exercício parental", conclui.