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OPINIÃO

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"Nem novinha nem senhora": elas criam conteúdo para mulheres de 40

Projeto Quarentamos - Acervo Pessoal
Projeto Quarentamos Imagem: Acervo Pessoal

Colunista de Universa

07/07/2021 04h00

A publicitária carioca Raphaella Avena se diverte dizendo que "tudo era mato" quando chegou na internet. Hoje, aos 39 anos de idade, ela e a melhor amiga, a gaúcha Patrícia Lazzarotto, 42, comandam o Quarentamos, uma rede de conteúdo para mulheres com mais de 35 anos.
Entre site e Instagram, o "Quarentamos", recebe mensalmente quase 2 milhões de acessos.

"Antes do 'Quarentamos' havia um limbo. Ou víamos influenciadoras muito mais jovens, que não conversam com o nosso público e nem com a gente, ou as mais senhoras. Estávamos perdidas", conta Patrícia.

Amizade pelo Instagram

As duas se conheceram pelo Instagram, em 2018, e começaram a conversar esporadicamente até se tornarem sócias. "Eu sempre tive rede social, sempre foquei em ter influência na internet. Só que sentia falta de conteúdo para as mulheres que, como eu, não se sentiam representadas pelas pessoas que estavam ali no Instagram. Ou eram meninas muito novas, fazendo dancinhas, ou mulheres muito maduras, com uma família estruturada, filhos... E eu não me via em nenhum desses dois lugares", explica Raphaella.

Apesar da vontade de produzir conteúdo para mulheres com mais de 35 anos, ainda faltava um empurrão para tirar o desejo do papel. "Eu pensava: 'não posso fazer sozinha. porque eu sou só uma fatia, não represento todas as mulheres. Preciso de alguém que faça um contraponto'", explica. Então, a Pati entrou na jogada. "Pati e eu já tínhamos nos tornado amigas virtuais. Acompanhei toda a gravidez dela, achei a coisa mais linda! Admiro quem ela é", conta.

O 'Quarentamos'

A admiração mútua entre Pati e Rapha é um dos segredos de sucesso do "Quarentamos", elas acreditam. Com personalidades e trajetórias pessoais e profissionais bem distintas, uniram forças e expertises: Raphaella é publicitária, cuida de marcas de beleza, é solteira e sem filhos. Já Patrícia é farmacêutica, casada e teve a primeira filha, Dominique, aos 40 anos.

Juntas, elas escreveram o "Guia Diário de Autoestima", e-book gratuito disponível no Quarentamos.com, e administram o perfil do "Quarentamos" no Instagram, que tem mais de 50 mil seguidores (10% do público é masculino). Lá, se revezam entre dicas de saúde, beleza, espiritualidade, e falam do cotidiano com leveza e humor. Um podcast, um canal no YouTube e outro livro devem ser lançados em breve.

"A gente toca em assuntos sérios, como empregabilidade, mudança de área na carreira, questões sexuais... Mas também temos bom-humor. É como se fosse uma grande revista. Não tinha a 'Capricho', que era a revista da gatinha? O 'Quarentamos' é a revista da lobinha. Muitas mulheres de 40 estão com o melhor corpo, na melhor fase da vida, fazendo o segundo ou terceiro doutorado. Outras não estão nessa vibe. Muitas estão buscando a primeira graduação, muitas sofreram bastante na vida e não estão no auge da forma física. A gente tem muito cuidado para entender que, nesse universo, estamos na mesma tempestade, mas não no mesmo barco. Cada uma tem sua história", conta Patrícia.

Para Rapha, o 'Quarentamos' é um movimento. "Não são duas mulheres falando em primeira pessoa. Abrimos as nossas vulnerabilidades e também ouvimos muito sobre vulnerabilidades. É emocionante. Falamos dos assuntos bobos, memes, até temas profundos. É engrandecedor perceber que encontramos o nosso lugar no mundo", relata.

Problemas verdadeiros, conexão genuína

Poucos meses após dar à luz à primeira filha, Patrícia sentiu os reflexos da quarentena: não poderia receber familiares, nem sair de casa. "A Dominique estava na fase de querer caminhar, explorar o mundo. Foi muito complicado manter uma criança sem botar o pé pra fora. Meu marido fazia as compras de supermercado, e a gente fazendo conteúdo. Foi difícil nesse sentido, mas o 'Quarentamos' floresceu, porque a gente começou a perceber que o nosso diferencial era contar sobre a nossa vida real", reflete.

Raphaella, por sua vez, perdeu a mãe por Covid. "Minha mãe faleceu tem dois meses. Sou filha única e sempre fomos melhores amigas. Morávamos juntas aqui no Rio. Nunca imaginei que ela fosse falecer antes dos meus 40 anos. Sempre achei que ela estaria presente no meu casamento, conheceria os meus filhos... Nunca me senti mulher, mulherão, independente. Sempre me senti muito menina. Com a passagem da minha mãe, nesses dois meses eu tive um amadurecimento absurdo, até por conta de todas as burocracias que eu tive que cuidar. Tudo agora é comigo. Eu tenho uma espiritualidade muito trabalhada, então é como se a minha mãe dissesse pra mim: 'Filha, você teve a oportunidade de ser filha até os 39, agora é com você. Agora você tem que ser mulher'. É como se ela tivesse me dado a oportunidade de renascer aos 40. Faço 40 em janeiro. A quarentena, para mim, também se manifesta neste rito de passagem", finaliza.