Referência, ela criou uma rede de conexão para mulheres, o Surfistas Negras
"O que mais me inspira nesse momento atual, estando à frente do movimento Surfistas Negras e participando do podcast Na Praia Delas, é que hoje em dia as mulheres estão muito mais empoderadas e abertas ao diálogo. Estão estimulando mais umas às outras e lutando pelas causas umas das outras", analisa Érica Prado, uma das vozes mais potentes do esporte brasileiro hoje.
Baiana de Itacaré, cidade com apenas 20 mil habitantes, Érica começou a surfar na adolescência, incentivada pelo irmão. Hoje, aos 31, ela não se dedica mais ao surfe competitivo, mas, como jornalista, influenciadora digital e podcaster, impulsiona milhares de mulheres. "É sobre ocupar espaços, sobre olhar para o lado e se reconhecer", pontua.
Racismo no esporte
"Fiquei muito tempo, a minha carreira inteira, sem um patrocínio principal de uma marca de surfwear. Eu não associava isso ao fato de ser uma mulher negra. Com o passar dos anos, comecei a identificar que as meninas que tinham esse apoio eram meninas brancas, loiras e que representavam aquele estereótipo californiano que a todo tempo vem sendo reforçado pela mídia", analisa Érica.
E ela vai além: "Na época, achei que era só uma falta de sorte ou de indicação. Depois entendi que não. As grandes marcas, quando querem, encontram o atleta. Mesmo surfando bem e sendo uma profissional dedicada, não tive o meu trabalho reconhecido por puro racismo. É racismo, não tenho que ficar cheia de dedos pra falar", afirma.
Se você parar pra observar, o perfil das meninas que têm patrocínio hoje em dia e das meninas que tinham há dez anos é o mesmo. E as meninas que não têm patrocínio continuam sendo as meninas negras nordestinas. É um racismo escancarado agora. Era velado, mas tá escancarado.
Depois de muitos anos, Érica percebeu que essa escolha não era uma questão de identificação da marca com a esportista.
O pulo da gata
Érica se mudou para o Rio de Janeiro em 2007, por causa da faculdade. Nos três primeiros anos na capital, conciliava as aulas de surfe que dava com os estudos e as viagens para competir. "O dinheiro que eu ganhava em um campeonato era o dinheiro que eu investia para ir para outro", lembra ela, que em 2010 começou a trabalhar como jornalista especializada, no canal de esportes Woohoo.
"De um lado, passava muito perrengue pra competir: dormia em rodoviária, pegava ônibus e passava dois dias viajando pra chegar ao sul do Brasil ou ao Nordeste. Quando virei a jornalista especializada em surfe, tive privilégios. Passei a ser tratada de forma diferente", conta.
Ela diz que, ao cobrir eventos, viajava com tudo pago, de avião e ficava em hotéis à beira da praia. "Foi um contraponto muito sinistro. Mudei do surfe competição pro jornalismo em 2011 e tô nessa até hoje. O surfe abriu portas pra mim ao longo desses anos na TV, não só no jornalismo, e sou muito grata ao esporte em tudo o que eu vivi."
Surfistas Negras
"Muitas meninas nunca tinham surfado porque não que se identificavam com o esporte, não se viam representadas. A partir do momento em que criei o movimento Surfistas Negras, elas se sentiram mais encorajadas, viram que existem milhares de meninas que pegam ondas e que são negras no mundo todo, não só no Brasil", explica.
"As pessoas me escrevem para me parabenizar e contar que começaram a surfar porque me viram. Mulheres mais velhas, inclusive, que sempre quiseram surfar e nunca surfaram. Aí quando veem uma foto lá, de uma surfista de 40 e poucos anos, descobrem que também podem começar", celebra Érica, sobre o sucesso do Surfistas Negras, que só no Instagram já conecta diretamente quase 6.000 mulheres.
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